Brasil registou 2.203 conflitos no campo em 2023
A Comissão Pastoral da Terra (CPT) registou, em 2023, 2.203 conflitos no campo no Brasil, o maior número da série histórica de registo de denúncias iniciado em 1985, disse esta segunda-feira a organização.
"Em 2023, mesmo com o primeiro ano do Governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, este patamar persistiu com leve incremento frente ao ano anterior (8%), se consagrando como o maior número de ocorrências dos últimos 10 anos", destacou o relatório hoje divulgado.
O documento contabiliza conflitos que acontecem em diferentes contextos sociais no campo, envolvendo a luta pela terra, água, direitos e relações de trabalho ou produção.
Segundo a CPT, o Brasil registou 31 assassinatos em conflitos no campo, o menor número desde 2020, quando 21 pessoas foram mortas no país.
Desse total de pessoas assassinadas, 14 eram indígenas, nove trabalhadores sem terra, quatro pessoas que viviam em terras públicas, três descendentes de escravizados, chamados no Brasil de quilombolas, e um funcionário público.
"É percetível, desde o início da série histórica, que a categoria mais atingida por ações de violência foram os povos e comunidades tradicionais, mantendo um padrão que vem se consolidando desde meados da década de 2000 (...) Podemos observar seu crescimento constante a partir de 2018, com um pico em 2020, quando as ocorrências apresentam um crescimento de 116% face a 2017", avaliou a organização.
"Nos anos subsequentes, o número de ocorrências segue maior do que no período entre 2014 e 2019, com tendência de aumento em 2022 e manutenção em 2023", completou.
Os dados de 2023 mostram que 71% das ocorrências contabilizadas no ano passado foram causadas por conflitos ligados à terra, 11,4% por conflitos ligados à água, 10,4% em casos relacionados com o trabalho e 6,3% atos de resistência.
"Os conflitos por terra foram os que mais cresceram em valores absolutos. Regista-se que, apesar do caráter altamente 'conflitivo' dos últimos anos, estamos presenciando um declínio das ocorrências de conflitos por água e o aumento dos conflitos por terra, o que indica a relevância da questão fundiária na conjuntura atual e corrobora com nossa análise da contrarreforma agrária e do avanço do capital agropecuário, mineral e dos projetos energéticos no campo brasileiro", apontou a CPT.
O norte do Brasil, onde está localizada a floresta amazónica, é a região com mais casos de disputas, representando 35% das ocorrências, seguida do nordeste, com 32%.
A CPT acrescentou que 2.663 pessoas foram libertadas do trabalho escravo rural em 2023, em 251 casos fiscalizados e denunciados. Foi o maior número de ocorrências em 10 anos.
Atualmente uma organização ecuménica, a CPT foi criada em 1975, em plena ditadura militar, em Goiânia, no Encontro de Bispos e Prelados da Amazónia, convocado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), "como resposta à grave situação" vivida pelos trabalhadores e proprietários rurais, sobretudo na Amazónia, "submetidos a condições análogas ao trabalho escravo e expulsos das terras que ocupavam".