Carta ao 25 de Abril

25 de Abril. Dentro de pouco tempo comemora-se o teu aniversário. Não sei se a título póstumo ou se ainda estás vivo, ligado às “máquinas,” como já estava o fascismo, falecido (?) à data do teu nascimento.

Seja como for, estejas onde estejas e como estejas, espero que leias esta carta, pois certamente há coisas que não deves saber, pois ninguém tem a coragem de te contar.

O dia que nasceste foi dos mais belos, esperançosos e felizes dias que aconteceu a um povo e a um País que, desde há muitos anos, provavelmente há décadas, o esperava.

Coisas bonitas foram ditas, promessas lindas foram feitas, e juntamente com a LIBERDADE que trouxeste, vinha o desejo de um País mais justo, mais próspero e risonho para o seu povo.

Foi anunciado para breve, o fim da pobreza, das desigualdades sociais, da exploração de um povo, da ganância, do capitalismo selvagem e, recordo-me, até o regresso dos nossos emigrantes fora prometido, pois vinham para um Portugal novo onde haveria trabalho e bem-estar para todos.

Só que, meu querido 25 de Abril, ainda poucos meses de vida tinhas, já eras traído nos teus propósitos, na tua linha de orientação, no Portugal democrático que querias construir, por alguns que, - ao que diziam - tinham-te ajudado a nascer, mas por ingenuidade ou ânsia de PODER, aliaram-se a grupos de cretinos, extremistas de esquerda que pretendiam atirar o País para uma nova ditadura, mais feroz e desumana, do que aquela que acabaras de nos livrar.

25 de Abril, tu não sabes, porque uns, por conveniência, outros, por medo ou cobardia, nunca te disseram, mas não tinhas ainda um ano de idade e os países, nossos vizinhos na Europa, e os EUA, olhavam desconfiados para ti, por não saberem ao certo qual era o rumo que querias dar ao País.

Foram tempos difíceis porque passaste (e todos nós passamos) quando estiveste às mãos daqueles que, - à sua maneira - queriam ser os novos donos deste Portugal.

Já toda a gente era anti-fascista – os que na realidade sofreram na pele a dureza do regime anterior, mais os que se julgavam ser, pelo facto de lerem o Avante, o Gaiola Aberta e ouvirem programas em rádios clandestinos - e (quase) todos se sentiam no direito de mandar neste País.

A eles, dava-lhes cobertura um governo tresloucado, irresponsável, que tudo permitia, incluindo as ocupações selvagens de propriedades e moradias, em nome de uma lunática reforma agrária, assim como, as intromissões nas empresas por indivíduos, alguns impreparados, que só falavam em reivindicações e se em alguns casos melhoraram os salários dos trabalhadores, noutros casos, despediram imensos, pelas falências das empresas que causaram.

Nada disto, tu, 25 de Abril, preconizaste, querias ou prometeste ao povo português.

Também não falaste em se eternizar no PODER ou em lugar de servir o País, servir-se dele.

E foram muitos os que o fizeram e por isso hoje, vivem alambazados em excelentes salários e mordomias, ou reformas, provenientes de descontos efetuados, é verdade, mas dos “tachos” políticos que ocuparam – muitos dos quais - sem competência e qualquer benefício para o País.

Entretanto, deu-se o 25 de Novembro liderado pelos militares fiéis e por políticos de bom senso que conseguiram evitar a queda do nosso País no abismo que se vislumbrava e mostrar, sobretudo, aos nossos vizinhos europeus – o que nos valeu mais tarde a nossa integração na Comunidade Europeia - que não era aquela política extremista que queríamos.

O que o 25 de Novembro não conseguiu fazer foi debelar todos os vícios e oportunismos instalados e que se têm arrastado até os dias de hoje, o que faz com que Portugal nunca tivesse sido, nem é, o País que tu, 25 de Abril, verdadeiramente querias que fosse.

Deram cabo dos teus ideais, de (quase) tudo o que havias planeado para o teu/nosso País.

Contudo, vão comemorar a tua data de nascimento, com pompa e circunstância. Até seria justo, mas se o País não tivesse passado por bancarrotas, não fosse um paraíso para corruptos, as famílias não estivessem encalacradas, não houvesse quatro milhões de pobres, os jovens não tivessem de procurar futuro no estrangeiro, a corrupção fosse combatida com vigor, as mordomias não existissem, as responsabilidades de quem governa mal fossem devidamente apuradas e outras milhentas situações constatadas e que nada têm a ver com os ideais de Abril.

Termino esta carta, lamentando não te poder dizer tudo o que havia para dizer e em pormenor, mas quero que saibas que também venero a tua data de nascimento, (25 de Abril) só que não te identifico ou alio-te, às poucas-vergonhas porque tem passado este País nos últimos 50 anos.

E porque entendo que, não idealizaste este Portugal, não quiseste este Portugal, de modo que, envolver o teu bom nome neste Portugal que temos, em nada te dignifica, te prestigia, porque não corresponde (salvo algumas exceções) àquele País que prometeste aos portugueses.

Juvenal Pereira