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No caminho da verdade

A Constituição da República Portuguesa, na abordagem aos direitos e deveres fundamentais, assegura, a todos, o “acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos”, consagrando, ainda, para além do mais, e em termos de garantias de processo criminal, o tão falado princípio da presunção de inocência: “todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa”. A norma constitucional refere o “arguido”, sendo evidente que a presunção se reforça perante o mero “suspeito” que nem sequer assume o estatuto de sujeito no processo penal. E refere “sentença de condenação”, o que significa que a presunção se mantém até à última decisão da magistratura judicial. É um princípio sensato que se impõe de uma forma absolutamente natural, mas com o qual a sociedade lida ainda com alguma dificuldade, resistindo mesmo, nalguns momentos, ao respeito sagrado que impõe. É uma espécie de “eu sei que é bom, mas não é para mim”, assumido apenas numa perspetiva de linchamento voraz quando orientado para os outros. Sabemos que o ser humano é, por norma, muito “exigente” com os outros, mas bem mais tolerante consigo próprio. É uma natureza complexa que obriga a reflexões constantes que nem todos estão dispostos a fazer.

É evidente que a comunidade, perante todos os dados que vão sendo, em determinados momentos, lançados publicamente, tem sido muito rápida a reagir, quer em termos de condenação, quer em termos de absolvição, sumárias, entrando, muitas vezes, em contradição, em lapsos temporais muito curtos, em poucos dias, com uma superficialidade atroz e com uma incoerência alucinante, sem conhecer os elementos concretos do processo penal e quando este quase ainda nem começou. Confesso que tudo isto me assusta e aflige. Defendo a transparência e aceito a publicidade da informação verdadeira que não é confidencial ou sigilosa, mas não aceito a precipitação leviana, a falsidade, a deturpação e o julgamento sumário sem contraditório e sem factos concretos. Não me conformo e não aceito a condenação ou a absolvição, populares, levianas, até porque assentam normalmente em julgamentos viciados e vazios que ferem e matam apenas com base em insinuações falsas ou em dados deturpados, lançados, no anonimato covarde, em canais duvidosos de absoluta desinformação. E é curioso que os que lidam mal com a Justiça verdadeira são os que alimentam esses canais anónimos e clandestinos que deturpam, mentem e lançam um ruído absolutamente perturbador e injusto. Essa é a arma dos fracos. E todos temos a obrigação responsável de defender a liberdade e a verdade, censurando e ignorando a desinformação tóxica, anónima, escondida e covarde, oriunda de canais ilegítimos de piratas menores. Defendo sempre a transparência, o contraditório, a liberdade, a seriedade e a responsabilidade cívica. Defendo a “verdade verdadeira” numa sociedade serena que não se pode deixar intoxicar e viver em permanente tensão.

Defendo a nossa Constituição. Os princípios constitucionais não podem ser letra morta e têm mesmo de entrar na vida das pessoas, numa sociedade livre que deve manter elevados padrões de respeito e de responsabilidade. A Constituição da República Portuguesa deve entrar na formação humana desde cedo, desde o primeiro momento, já na escola, naturalmente que num discurso adaptado a cada pessoa e a cada circunstância. Defendo uma sociedade viva, atenta, exigente, informada, crítica, com princípios éticos bem definidos, com opinião esclarecida, firme e responsável. Defendo o jornalismo sério. Defendo uma sociedade que deixe para a Justiça o que é da Justiça, sempre para além das meras vicissitudes da investigação que até atravessa tempos muito conturbados, agravados agora com a notícia da recente decisão do Tribunal da Relação de Lisboa que, no âmbito da “Operação Influencer”, arrasa o Ministério Público que, assim, continua a perder força perante a magistratura judicial, esta sim, com o poder de decidir definitivamente os processos. Defendo uma sociedade que saiba encontrar a verdade, que não deixe de emitir juízos de censura ética para além do processo penal, mas sempre com base em factos concretos, seguros e verdadeiros. Defendo uma sociedade justa e solidária, baseada na dignidade da pessoa humana, que respire transparência, que promova o respeito, o mérito e a igualdade, sempre no caminho da verdade.