Ser, parecer…
Ora bem, lá vamos nós a elheições outra vez (assim, com “lh”, que é como se deve dizer com a pronúncia de cá do sítio que se vai perdendo cada vez mais com tanto “puxar” ao falar continental. Nós, os cá do sítio, com mais frequência do que seria desejável, não dizemos duas vezes batata muitas vezes, mas sabemos bem o que é uma semilha, estepilha! E sabemos bem o que queremos mesmo quando nos dizem que o que queremos não é o que alguns outros querem, estepilha! (há que se conter nos impropérios, não vá alguém se indispor e…)).
É que já estamos um pedacinho (mais uma que os de lá não conseguem dizer – dizem sempre “um bocadinho” e acham uma delícia quando nós dizemos “um pedacinho”), um pedacinho, dizia, fartos de tanta eleição, estepilha!
E nós até que não temos nada a ver com esses assuntos, que o que queremos é andar com a nossa vidinha para a frente, sem ter que pensar politiquês que é aquela língua que falam os políticos quando nos querem convencer que as suas propostas são melhores do que as dos outros, que até são mais capazes e honestos que os outros, e isso até que é um facto, são todos mais honestos e capazes do que os outros quando dirimem os seus argumentos, mas depois, enfim…
Lá vamos fazendo por crer nisso e lá vamos votando porque é sempre melhor poder votar do que ter alguém a mandar sem ter sido escolhido numa eleição. Por isso vamos lá, que venham mais “elheições”, c’a gente aguanta, ai aguanta, aguanta… lá terá de ser.
Mas, por outro lado, ficamos presos ao que eles decidem depois de ser eleitos e dos arranjos que irão fazendo para se manterem nos cargos que tanto almejam.
Estamos presos nestas ilhas no meio do Atlântico, e presos também àquele rectângulo situado entre duas franjas de Oceano Atlântico a Oeste e Sul e duas franjas de terra espanhola (e bem sabemos que daí nem bom vento nem bom casamento) a Leste e Norte, presos a séculos de atraso, crónico nas mentalidades dos decisores, para quem o continuar do estado da coisa mantem-nos reclusos das suas incúrias.
Estamos presos às políticas de adversidade que são impostas precisamente por aqueles a quem compete regular com justiça, Justiça à qual recorremos em momento de necessidade e que não a deixam funcionar dizendo em casos pontuais que funciona às mil maravilhas.
Estamos presos a nós próprios quando declinamos a nossa (e sabemos que a temos) capacidade de revolta quando nos sentimos espezinhados.
Estamos presos a um País que exporta a sabedoria que não utiliza em proveito próprio e de todos os que nele acreditam.
Estamos presos, não preventivamente, mas definitivamente, ao País onde livremente escolhemos viver e lutar por um futuro risonho para nós e para os nossos filhos.
Estamos presos mas não agrilhoados, sabendo que a nossa opinião conta, nem que seja só na ocasião do voto, mas conta!
E temos de votar, mesmo se a nossa opinião sobre a classe política não seja muitas vezes a mais favorável. A este respeito, não resisto a contar um pequeno episódio que assisti há alguns, não muitos, anos, quando por via das circunstâncias, estando por ali perto, fui assistir a um jogo do Campeonato de Portugal de juniores em futebol, no Cristiano Ronaldo Campus, ali para os lados da Choupana.
O futebol não é bem a minha praia, mas gosto de ver um ou outro jogo quando a oportunidade aparece. E este foi o caso. Era um jogo entre o C D Nacional e um adversário proveniente do continente português, cujo nome não retive, e que tem pouca relevância para o que vou passar a relatar.
Estava sentado junto a um aguerrido grupo de senhoras, adeptas do Nacional, que entre piropos, agitar de bandeiras e tocar buzinas tudo faziam para incentivar os jovens jogadores nacionalistas.
Era um grupo de Mães de alguns dos jogadores da equipa, e não se coibiam de resondar tanto o árbitro como os elementos da equipa adversária com os mais diversos impropérios que fariam corar de vergonha até algum menos púdico que por ali andasse. E por serem impropérios impróprios para jovens ouvidos, um agente da autoridade que estava ali perto chegou-se ao pé das Senhoras e polidamente advertiu que não era correcta forma como estavam a tratar o Sr. árbitro, a sua mãe e demais familiares até umas quantas gerações anteriores. As Senhoras entenderam, pediram desculpas e refrearam um pouco a salutar agressividade. Mas como não eram de ferro, lá houve uma jogada em que um dos adversários pregou uma rasteira a um jovem atacante que corria com a bola, bem posicionado para conseguir uma boa jogada de ataque, falta evidente mas que o árbitro não assinalou!
“Ah seu p” começou por gritar a mãe do jovem rasteirado (percebia-se que o que viria a seguir seria uma equiparação do árbitro ao profissional que tem por ofício remendar aqueles objectos onde se põe a sopa a cozer, vulgo panelas…) mas, lembrando-se a tempo do agente da autoridade que a tinha admoestado, gritou a plenos pulmões:
- Ah seu… político!!
olhando com um sorriso de orelha a orelha para o dito agente que lhe respondeu com um outro sorriso e um leve encolher de ombros.
Pois mesmo que apeteça gritar assim, coloquemos um sorriso, encolhamos os ombros e vamos votar nas próximas “elheições”, para que possamos depois exigir que todos cumpram os seus deveres sem temor de ouvir epítetos menos próprios nem que haja necessidade de qualquer advertência por qualquer agente de uma qualquer autoridade, porque como é bem sabido, para além de ser, é preciso também parecer!