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Madeira

Livro também mostra a capacidade de resistência, insubordinação e revolta dos madeirenses

Cunha Rodrigues, ex-procurador-geral da República, na apresentação da obra ‘Presos Políticos do Estado Novo na Madeira’

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Foto Miguel Espada/ASPRESS

A obra ‘Presos Políticos do Estado Novo na Madeira “é de enorme oportunidade e importância” diz Cunha Rodrigues, o ex-procurador-geral da República a quem coube apresentar o livro.

“Revela um mosaico de valores e contravalores que coabitaram numa comunidade e a flagelaram por razões que não estavam no centro das políticas públicas, mas que podiam lesar, com a mesma intensidade, a individualidade, a sociabilidade e os direitos”. Considera que os autores “não foram ao baú da história” mas antes “trouxeram o mundo vivido até nós, com acontecimentos que têm um lugar, com pessoas que têm um nome e com figurantes que têm um guião”. Regista que “as revoltas só tocam levemente o poder, mas o poder emerge quando elas acontecem”. Conclui que na Madeira “as revoltas são mais sociais que políticas” e elogia os autores pela “obra exemplar” apresentada “com verdade, rigor e até sentido estético”, destaca.

Corrobora que este livro “pede o aprofundamento da investigação” para que se conseguida “conhecer outros aspectos da repressão exercida pelo Estado Novo na Madeira”.

No início da apresentação, Cunha Rodrigues confessou que foi o “notável prefácio” de Ireneu Barreto que fez-lhe despertar interesse pela obra e renovar a vontade de voltar à Madeira, com o encantamento em que, pela primeira vez, há mais de 60 anos. O antigo procurador-geral da República fez também questão de registar que “o prefácio é uma síntese que descreve e contextualiza os factos e nos fornece uma excelente chave de leitura para a obra”.

Nomeadamente o facto de Cabral Barreto prevenir que “as revoltas nunca se configuram verdadeiramente, como movimentos independentistas ou autonómicos”. Considera esta apreciação “importante para compreender a relação entre o Estado Novo e a Madeira, nomeadamente quanto a saber em que medida a repressão se refere estritamente aos acontecimentos ou denota um contexto político mais amplo”, salientou.

Para Cunha Rodrigues “o livro mostra um lado por vezes ignorado da bela e doce Ilha da Madeira: a sua capacidade de resistência, insubordinação e revolta”, disse.

Regista o cuidado dos autores “de não enveredar pelo tratamento gratuito de questões que a ciência política ainda não resolveu definitivamente” e a “deriva fascizante” do Estado Novo.

Na longa apresentação da obra, depois de resenha histórica sobre a noção de fascismo, concluiu que Élvio Passos e João Lizardo, co-autores da obra, “fizeram uma investigação séria e profunda, com o mapeamento de arquivos que eram desconhecidos. Destaca o quão significativo foram os dados estatísticos consultados, nomeadamente os “milhares de documentos reunidos em mais de 100.000 páginas” para concluírem que “no período até 1945, houve mais 1.800 prisões de pessoas que agiam de uma forma que excedia a manifestação ou o protesto”.

Destacou o terceiro capítulo do livro que “inclui um conjunto de testemunhos que são por assim dizer para memória futura”.

Entre os vários testemunhos, conclui que “a dificuldade de encontrar soluções credíveis para a vida quotidiana, a eclosão de guerras improváveis e os problemas alarmantes de escassez deram-nos um tempo cujas dominantes são a incerteza e o medo”. Regista ainda que “depois de termos realizado avanços substanciais no domínio dos direitos sociais, culturais e económicos, vemo-nos na necessidade de revisitar os direitos civis e políticos. E aqui, para além das contingências históricas, as sucessivas crises estão a abalar a coesão social”, apontou.

Na opinião de Cunha Rodrigues há três motivos para o ‘nosso’ descontentamento. A começar pela democracia liberal que diz estar “corroída pelos seus próprios defensores”. Acresce “os ataques ao multiculturalismo” e a forma “como a economia neoliberal está a alimentar sentimentos”.

Reparos ainda à liberdade e à democracia, que considera “enfraquecidos pela captura dos órgãos de comunicação social por grupos económicos e pela proletarização do jornalismo”.