“Todos os dias 4 mil pessoas em Portugal oferecem-se para fazer um scan da íris em troca de dinheiro”, escrevia o Expresso, num artigo publicado on-line a 29 de Fevereiro, alertando para o fenómeno, que tem gerado controvérsia a nível mundial.
Todos os dias 4 mil pessoas em Portugal oferecem-se para fazer um scan da íris em troca de dinheiro. Comissão de dados abre averiguação
Empresa do criador do chat GPT distribui criptomoedas em troca de uma fotografia à íris, que é mais identificativa de uma pessoa do que a impressão digital. Em Portugal, a Worldcoin já recolheu os dados biométricos de 300 mil pessoas, que fazem fila para receber de forma rápida um valor que pode superar os 100 euros em apenas um dia. Jovens e carenciados são os mais tentados
Ainda esta semana, a Agência Espanhola de Protecção de Dados (AEPD) ordenou a suspensão da actividade da empresa cofundada pelo ‘pai’ da Open AI, empresa responsável pela criação do ChatGPT.
Entretanto, a Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) revelou que está a investigar a Worldcoin, desde o ano passado, no “sentido de concluir a sua análise quanto à conformidade deste tratamento de dados com o RGPD [Regulamento Geral sobre a Protecção de Dados], com vista a tomar uma decisão sobre a actuação a ter neste caso".
Comissão Nacional de Proteção de Dados está a investigar Worldcoin desde 2023
A Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) está a investigar, desde o ano passado, a Worldcoin, cuja atividade foi suspensa em Espanha, e que realizou 'scanners' da íris de milhares de pessoas em diversos países, incluindo Portugal.
A DECO PROteste já veio público exigir uma intervenção “mais célere da CNPD”, apelando a uma "suspensão temporária das actividades que permitem a recolha destes dados, pelo menos, até que haja uma clarificação do processo”.
A organização de defesa dos consumidores em Portugal alerta que “está já a ser usado um grande volume de dados sensíveis obtidos de maneira questionável e num público que deveria ser protegido pela lei”, bem como a “urgência da criação de legislação específica para as criptomoedas, de modo a proteger quem recorre a este tipo de produtos”.
Analista italiano comparou crytomoedas com bitcoins
Giacomo Zucco, italiano consultor, analista e CEO da ZuckKucks espera antes de comprar o bilhete para vir participar na Atlantis Bitcoin pesquisou no google e notou que havia quem questiona-se se a Madeira iria ser a nova “cripto ilha”. “Quando li o título depois de comprar os meus bilhetes a minha reacção não foi muito optimista porque espero muito, mas mesmo muito, que não ou cripto qualquer coisa”.
Mas em que consiste exactamente a Worldcoin?
A Worldcoin foi cofundada em 2019 por Alex Blania e Sam Altman, criador da OpenaAI e do chatbot Chat GPT. É gerida pela empresa Tools For Humanity, com sede nos Estados Unidos e na Alemanha.
O projecto baseia-se na recolha de dados biométricos a partir de imagens da íris, em troca de worldcoins (WLD), a moeda virtual lançada oficialmente em Julho do ano passado.
O processo começa com o download de uma aplicação – a WorldApp – que permite fazer pagamentos, compras e transferências com WLD e com outras criptomoedas.
Ao descarregar esta ‘app’, que está disponível para Android e iOS, e depois de aceites os termos e condições, a pessoa recebe na sua carteira digital seis worldcoins, a que se somam outras 10, no momento em que fizer a leitura da íris, num dos stands da empresa.
Em Portugal, a Worldcoin tem actualmente a funcionar 17 stands (em Matosinhos, Maia, Braga, Lisboa, Montijo, Loures, Seixal, Setúbal, Vila Nova de Gaia, Porto, Aveiro, Rio Tinto e Almada).
Estas moedas poderão depois ser armazenadas, trocadas por outras criptomoedas ou convertidas em euros e transferidas para a conta bancária do utilizador no dia seguinte.
O utilizador pode ainda receber até 25 moedas, caso convide outras pessoas a aderir. De duas em duas semanas, caso mantenha a aplicação activa, receberá ainda outras três.
O valor em euros depende da cotação a que estiver nesse momento a WLD, que varia todos os dias e ao longo do dia. Actualmente está a ser negociado a cerca de 7.53 dólares (6,88 euros).
Para que serve a leitura da íris?
A íris é um dos dados biométricos que melhor permitem a distinção de uma pessoa. Trata-se de um elemento distintivo com uma fiabilidade de 100%, superior à da impressão digital. Não há duas íris iguais, mesmo no caso de gémeos verdadeiros.
No caso específico da Worldcoin, a leitura da íris é feita, nos balcões da empresa, através do ‘orb’, uma esfera metálica do tamanho de uma bola de futebol, que recolhe as imagens e gera um código encriptado – um ‘World ID’ – que é guardado numa base de dados.
Através deste código, único e irrepetível – que constitui uma espécie de passaporte digital – é possível comprovar que o utilizador é um ser humano e não um bot (robot a fazer-se passar por humano).
Quais são os riscos?
A Comissão Nacional de Protecção de Dados já veio manifestar reservas a este propósito, chamando a atenção para os riscos da venda de dados pessoais, entre os quais o da usurpação de identidade.
A empresa garante que os dados biométricos recolhidos nunca serão vendidos e que as imagens da íris são imediatamente destruídas após a formação do código, a menos que a pessoa consinta que fiquem armazenadas num servidor seguro.
O Orb verifica se és uma pessoa real que não se inscreveu anteriormente. Faz isto ao captar e processar imagens suas e do padrão da íris único. Uma vez que não existem duas pessoas com o mesmo padrão da íris e estes padrões são muito difíceis de falsificar, o Orb consegue distinguir-te com precisão de todas as outras pessoas sem ter de recolher quaisquer outras informações sobre ti, nem sequer o nome https://pt-pt.worldcoin.org/privacy
Não existe, porém, qualquer entidade independente a comprovar a destruição ou a segurança dos dados.
Embora a lei não proíba expressamente a venda de dados biométricos (que já são usados, por exemplo, para desbloqueio do telefone ou para acesso a determinadas aplicações com impressão digital), a DECO PROteste salienta que, sempre que dados pessoais (biométricos ou outros) sejam objecto de tratamento para comercialização, “o titular deve ter o direito a se opor, a qualquer momento e de forma gratuita”.
Não obstante, ressalva que, “no caso da venda de dados para a Worldcoin, o direito de oposição à venda de dados não é fácil de exercer, uma vez que se desconhece qual o encarregado da protecção de dados que está por trás desta entidade”.
Segundo a DECO PROteste o maior risco que existe é a perda do controlo sobre os dados concedidos. “Como a Worldcoin não revela se e de que maneira apaga os dados após a sua recolha, os titulares dos dados pessoais ficam à mercê de tudo o que a mesma possa fazer com eles. Se as imagens da íris e o respectivo código gerado efectivamente fossem apagados e disso houvesse provas, poucos riscos existiriam, mas o facto é que não se sabe”, refere a organização de defesa dos consumidores.
“Se as imagens da íris forem vendidas a terceiros, podem mesmo ir parar às mãos criminosas, permitindo, por exemplo, o acesso a dados bancários ou a serviços de saúde”, acrescenta.
A Worldcoin já recolheu os dados biométricos de quantas pessoas?
De acordo com a MIT Technology Review, a Wordlcoin já recolheu dados em mais de 20 países, a maioria em desenvolvimento. Neste momento, a Worldcoin opera em 10 países: Alemanha, Argentina, Chile, Espanha, Estados Unidos, Japão, México, Portugal, Coreia do Sul e Singapura. No total, já foram recolhidos os dados biométricos de mais de 3,7 milhões de pessoas.
Segundo a empresa, mais de 300 mil pessoas – o equivalente a 3% da população do país – já fizeram o scan da íris.