Human Rights Watch diz que lei de amnistia no Senegal abre porta à impunidade
A Human Rights Watch criticou hoje, em comunicado, o projeto de lei de amnistia apresentado segunda-feira pelo Presidente do Senegal, Macky Sall, aos deputados, considerando que abre a porta à impunidade de crimes graves.
Em 26 de fevereiro, em plena crise política causada pelo adiamento das eleições presidenciais, e como forma de reconciliar o país, Macky Sall anunciou uma lei de amnistia geral para atos relacionados com os protestos políticos realizados entre 2021 e 2024.
Dois dias depois, o conselho de ministros aprovou o projeto de lei, que há de ser votado pelo parlamento nos próximos dias.
"Caso seja aprovado, o projeto de lei pode efetivamente conceder impunidade a funcionários responsáveis por graves abusos dos direitos humanos", disse Ilaria Allegrozzi, investigadora sénior para o Sahel da organização não-governamental Human Rights Watch.
"Qualquer amnistia que reforce a impunidade, absolvendo a responsabilidade dos funcionários do Governo e das forças de segurança por graves violações dos direitos humanos, é incompatível com as obrigações nacionais e internacionais do Senegal", vincou Allegrozzi.
O projeto refere que a amnistia diz respeito a "todos os atos que possam ser classificados como infrações penais ou correcionais cometidos entre 01 de fevereiro de 2021 e 25 de fevereiro de 2024, tanto no Senegal como no estrangeiro, relacionados com manifestações ou com motivações políticas, incluindo os feitos por qualquer meio de comunicação, quer os autores tenham ou não sido julgados".
A Human Rights Watch documentou anteriormente o uso excessivo da força por parte das forças de segurança senegalesas, incluindo munições reais e uso indevido de gás lacrimogéneo, para dispersar manifestantes em março de 2021, junho de 2023 e fevereiro de 2024.
Pelo menos 40 pessoas foram mortas durante confrontos violentos desde março de 2021, sem qualquer responsabilização.
De acordo com a oposição e grupos da sociedade civil, cerca de mil membros da oposição, incluindo líderes partidários e candidatos presidenciais, jornalistas e ativistas foram detidos em todo o país entre março de 2021 e janeiro de 2023.
Desde o anúncio do adiamento das eleições, pelo menos 344 deles foram libertados, de acordo com Aïssata Tall Sall, ministra da Justiça do Senegal.
A Human Rights Watch também documentou a falta de respeito pelos direitos processuais das pessoas detidas no âmbito de manifestações lideradas pela oposição desde 2021, incluindo acusações forjadas, falta de provas para fundamentar as acusações, prisão preventiva prolongada e maus-tratos e tortura na detenção ou após a prisão.
O diploma foi recebido com críticas tanto da oposição como de grupos da sociedade civil e várias vítimas da violência desde 2021 também expressaram sérias preocupações à Human Rights Watch de que a lei possa dificultar as suas hipóteses de estabelecer a responsabilidade pela violência que sofreram, salienta a organização não-governamental.
O projeto de lei de amnistia surge no momento em que o Senegal enfrenta uma grave crise política, na sequência do anúncio pelo Presidente Sall do adiamento das eleições presidenciais previstas para 25 de fevereiro.
A medida, que foi denunciada como um "golpe de Estado constitucional" pela oposição e por grupos da sociedade civil, desencadeou atos de violência de que resultaram mortos.
"O Presidente Sall disse que a amnistia será concedida no espírito da reconciliação nacional", disse Allegrozzi, frisando que "as tentativas de reconciliação geral não devem ser um meio de fugir à responsabilização".