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Crónicas

“A vida é maravilhosa.” Não a desperdices…

Só quem vive uma situação destas, em que é confrontado com a finitude da vida sem ter algo que possa fazer para o combater, poderá dizer o que se sente nesse momento

A primeira frase é do ex-treinador de futebol Sven-Göran Eriksson que fez as delícias de adeptos do Benfica (como eu) em dois momentos (na primeira passagem eu era ainda muito novo para saber sequer as regras do jogo) e que ficará para sempre eternizado como um dos melhores que por cá passaram mas sobretudo como um senhor, na maneira de estar e de ser. Pese embora o preâmbulo, esta crónica é muito pouco sobre futebol. O sueco que para além das águias comandou também a seleção nacional de Inglaterra, comunicou ao Mundo, recentemente, sofrer de um cancro em fase terminal, que já não é operável e que lhe resta por isso e segundo os médicos, no máximo, um ano de vida. O Liverpool, histórico clube inglês, sabendo que sempre foi um sonho seu treinar a mítica equipa dos “Reds” proporcionou-lhe uma experiência incrível, a de voltar ao banco por um dia e de a comandar num jogo de beneficência. No final, visivelmente emocionado fez questão, entre outras coisas de dizer às pessoas o incrível que é viver.

De facto, só quem vive uma situação destas, em que é confrontado com a finitude da vida sem ter algo que possa fazer para o combater, poderá dizer o que se sente nesse momento. Só podemos imaginar o impacto que é ter essa noção de impotência e o que será reviver a fita do tempo numa reflexão permanente do que fizemos, do que deixámos por fazer e do que queríamos ter feito diferente. A parte do “não a desperdices” serve para todos nós, a começar por mim. Tantas vezes passamos o tempo chateados, tristes e revoltados com coisas que não têm importância absolutamente nenhuma. Deixamos de falar com este ou aquele muitas vezes por orgulho ou não fazemos o que nos faz bem só porque achamos que ainda teremos tempo para o fazer. Passamos parte da nossa estrada preocupados com o “nada”, o supérfluo, o instantâneo, atrás de pessoas que não nos acrescentam, a perder tempo como superficialidades e sem a capacidade de sermos profundos mas acima de tudo de arriscarmos ir até onde sonhámos sem medo de chegar ao que lá no fundo, muitas vezes secretamente ambicionamos.

Palavras que não dizemos e que ficam por dizer, gente de quem não nos aproximamos com medo de sofrer e amores que ficam pelo caminho por não conseguirmos sair da nossa zona de conforto e de procurar mais. Quantas vezes não temos tudo à nossa frente e deixamos passar o comboio a pensar no sortudo que o irá apanhar quando ele estava ali à nossa espera e nós tínhamos o bilhete na mão. O que fica por dizer de bonito aos nossos pais, a expressão do nosso amor para com eles mas também com os nossos amigos e com os que nos querem bem. A organização do nosso tempo para darmos mais atenção a quem nos dá mais e menos a quem não quer saber de nós mas que teimamos em não querer entender. Sobra sempre pouco da vida para o tanto e que haveria para fazer. Talvez fossem mesmo preciso várias, mas a nossa realidade é esta e é nesta que nos temos que envolver.

A vida pode de facto ser maravilhosa como disse Eriksson mas não a devemos desperdiçar esgotando o nosso precioso tempo sem fazer o que tem de ser feito. Não nos contentarmos com poucochinho, com o assim assim e com a amargura de ver os outros conseguir o que nós gostávamos de ter conseguido sem um pingo de suor, sem darmos a mínima luta, sem nos esgotarmos até ao limite das nossas forças para que não fique a mínima réstia de dúvida de que demos tudo e sobretudo sem a amargura de ficarmos sentados no sofá com inveja e arrependimento. A linha entre o amor e o sofrimento é muito ténue e a que separa o dar do receber pode muitas vezes entrelaçar-se. Mas é na procura dessa intensidade e na bravura de não desistirmos do que queremos para nós e para os nossos que se encontra a magia da nossa história. E é nesse ponto que nos damos ao direito de viver momentos perfeitos que afinal de contas é o melhor que podemos colecionar. Não deixem de tentar ser felizes nas mais pequenas coisas. Da minha parte, obrigado Sven!