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Entre a pessoa e a sua personagem

Esta vontade extrema, de em tudo agradar a todos, começa a dar sinais evidentes de cansaço

Vivemos um tempo onde as personagens substituem as pessoas tornando-as hospedeiras das suas criações e ambições. Na política, nos negócios, nas redes sociais, e nos lugares comuns o mais fácil é construir a pessoa que se quer apresentar. Existem estratégias, equipas, especialistas e, cada vez mais, uma enorme experiência na representação e na venda da imagem que se pretende promover. Do mais básico ao mais elaborado a personagem ganha lugar à pessoa e, no grande palco onde tudo acontece, a grande questão é o sentido da identidade. A verdade começa a ser questionável. Quem se apresenta ou nos apresentam é o produto de uma imagem trabalhada, construída e assumidamente orientada para um qualquer objetivo. Estamos perante um movimento de baixa criatividade que estimula a preguiça e o “fast food” das ideias e dos comportamentos.

Na política, da esquerda à direita, a tendência crescente deste movimento tem momentos hilariantes e até constrangedores. A maioria dos líderes, em situação de campanha, são caracterizados e dão origem a personagens simpáticas, alegres, divertidas, carinhosas, sensíveis, populares, emotivas e beijoqueiras. Ainda que alguns destes atributos possam ter alguma correspondência com a pessoa, é um facto que a atitude global, que no geral os torna extremamente parecidos é falsa e exagerada, assim como facilmente visível em alguns momentos da sua exposição mediática. Estamos perante personagens que nos pedem para confiar nas pessoas que as protagonizam.

Esta vontade extrema, de em tudo agradar a todos, começa a dar sinais evidentes de cansaço. Viver sobre imagens construídas falseando a identidade é um modelo sem carisma. Para além de levar ao descrédito de uns e à alienação de outros, o maior perigo é mesmo a perda de identidade coletiva.

As novas gerações cresceram neste modelo e se uns, são naturalmente seguidores desta tendência outros começam a demostrar vontade e atitude em colocar a pessoa no centro da personagem. Estão a ficar fartas de adultos de plástico que de tanto lhes quererem agradar, para uso e abuso dos seus interesses, tornam-se inúteis e até ridículos na sua função.

Precisamos de pessoas credíveis, seguras, verdadeiras, capazes de partilhar as ideias que defendem e verdadeiramente acreditam. Pessoas que gostem de pessoas e não se escondam, por vergonha ou descrédito no ser humano, nas personagens que qualquer inteligência artificial é capaz de construir.