UE precisa gastar mais na defesa após falhanço "vergonhoso" de munições
O gabinete da Presidência ucraniano considera insuficientes as sanções da União Europeia (UE) contra a Rússia e desafia os estados-membros a aumentar os gastos em defesa, após o "vergonhoso" incumprimento na entrega de um milhão de munições a Kiev.
Em entrevista à Lusa, o chefe de gabinete adjunto da Presidência ucraniana, Ihor Zhovkva, defendeu que, "para todos os que fazem parte da União Europeia, incluindo Portugal, esta agressão russa é um enorme teste de segurança" e, verificado o seu potencial global", "não é suficiente".
O responsável de política externa do gabinete do Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, assinalou que, mesmo após uma vitória da Ucrânia na resposta à invasão das forças de Moscovo, em 24 de fevereiro de 2022, "a Rússia será sempre agressiva", observando que o seu "potencial industrial militar é enorme" e continua a produzir mais mísseis.
"Incluindo, aliás, componentes provenientes dos países da UE", alertou. "Intercetamos os mísseis balísticos e de cruzeiro russos que, nalgumas partes [dos componentes], provêm dos estados-membros da UE, pelo que não são bons nos pacotes de sanções".
O político ucraniano advertiu que os países europeus não estão suficientemente ativos em relação a este tópico e expressou o seu desapontamento se for confirmado que próximo pacote não terá sanções setoriais.
"Precisamos de mais. Não apenas nós, mas toda a gente precisa de mais", afirmou, desafiando todos os estados-membros a investir igualmente na sua defesa: "Se existirem indústrias relevantes no seu país [Portugal], e espero que existam, elas devem unir os seus esforços com as empresas ucranianas e realizar esta produção conjunta, a fim de reforçar o nosso potencial militar".
Este é um assunto que "a União Europeia deveria refletir seriamente", assinalando que a Ucrânia ainda não faz parte da UE, mas já está a cumprir a sua parte das obrigações na defesa desta parte do continente europeu e estará sempre".
A propósito, o responsável da Presidência ucraniana recorda que o seu país já está a proteger o flanco leste europeu face à agressão russa, descrevendo as forças ucranianas como "as melhores para proteger esta parte do globo, não contra o segundo exército mais forte do mundo - este mito evaporou-se na Ucrânia -, mas que também não é o exército mais fraco do mundo".
Para Ihor Zhovkva, o despertar da Europa para o investimento m defesa é tardia -- "antes tarde do que nunca" - e lembrou a promessa há cerca de um ano de entrega de um milhão de munições de artilharia de calibre 155 milímetros à Ucrânia, que ficou muito aquém do pretendido.
"Quantas é que conseguiu entregar? Trezentas mil. É uma vergonha para toda a União Europeia, para uma grande instituição, não ser possível entregar um milhão de peças de artilharia ao meu país", sustentou, congratulando-se por o chancele alemão, Olaf Sholz, ter levantado esta questão durante a última reunião extraordinária do Conselho Europeu.
O que está em causa, destacou o político ucraniano, é a segurança da Ucrânia neste momento e de toda a UE: "É para a vossa própria segurança em Portugal e noutro países amanhã. Porque se pensa que a guerra está algures longe, hoje [quarta-feira] acordámos com bombardeamentos em explosões em Kiev. É o habitual para nós", comentou.
Zhovkva adicionou ser positivo que o chefe da diplomacia europeia, Josep Borrel, estivesse nessa manhã em Kiev para testemunhar por ele próprio esta realidade, que o líder do executivo eslovaco, Robert Fico, defensor do corte de ajudas à Ucrânia, disse não existir quando visitou recentemente a capital ucraniana. "Nós enviámos imagens e provas para ele", lembrou o responsável do gabinete de Zelensky, reforçando: "Isto é muito sério, infelizmente, para um período de tempo longo e temos de conjugar todos os esforços".
"A Ucrânia ainda não faz parte da UE, mas já está a cumprir a sua parte das obrigações na defesa desta parte do continente europeu, e estará sempre", afirmou, e o mesmo se aplica à NATO e à partilha dos valores euro-atlânticos, esperando avanços na cimeira da organização a decorrer este ano em Washington.
"Compreendemos que, antes da vitória, não nos aceitarão como membro de pleno direito da NATO. Somos realistas, não somos loucos. Mas o que a NATO pode fazer agora é iniciar o processo, emitir um convite e, depois, quando estiverem reunidas as condições de segurança, a Ucrânia tem todos os direitos, se cumprir todos os critérios, para se tornar parte da NATO", indicou.
Do lado de Kiev, fica a promessa de "fazer a sua parte doméstica até 150%" e o país estará pronto para a decisão da Aliança Atlântica: "queremos fazer parte desta aliança porque a verdadeira segurança de que estamos a falar é o acordo de garantias de segurança entre os países", declarou.
"O 75.º aniversário da Cimeira será celebrado em Washington. Penso que, para a liderança dos Estados, será muito importante que seja um êxito.
Porque não foram tomadas decisões sérias sobre a Ucrânia durante a Cimeira, será enviado um sinal muito negativo da parte dos aliados, e este sinal será tratado como muito positivo num país agressor", alertou, preferindo que, de Washigton, saia "um presente".
Noutra frente, Ihor Zhovkva prefere não especular sobre as escolhas dos norte-americanos nas eleições presidenciais norte-americanas, a decorrer em novembro, em que o provável candidato republicano à Casa Branca será Donald Trump, cujo regresso à Casa Branca poderá significar cortes no apoio à Ucrânia e eventualmente à própria NATO: "Será certamente muito importante para a Ucrânia e para o mundo inteiro", limitou-se a comentar.