Será (só) a economia?
O desafio para o sucesso da direita moderada, olhando em especial para 10 de março, está no reacender da esperança no que nos pode unir
Na primeira vitória presidencial de Bill Clinton, em 1992, ficou famosa a frase proferida por James Carville, seu conselheiro: “it´s the economy, stupid”, significando que bastaria a promessa que a economia prosperaria para ganhar eleições. Vivíamos a primavera da queda da URSS, mas o triunfo inequívoco e pacífico da disseminação da democracia liberal, da globalização, do progresso e da harmonia talvez tenha sido de um otimismo manifestamente exagerado.
Segundo estimativas recentes da revista The Economist, quase 80% da população da UE vive em países onde partidos populistas atraem pelo menos 20% do eleitorado e se na Espanha e na Polónia, o VOX e o Partido da Lei e da Justiça não tiveram os resultados esperados nas últimas eleições, a Eslováquia e os Países Baixos caminharam em sentido oposto, assim como a Finlândia e a Suécia. Em Itália, a “pragmática” Meloni subiu ao poder e na França a ameaça Le Pen há muito que paira, tal como a AfD na Alemanha, que cavalga fraturas sociais e as marcas que a reunificação deixou no leste do país. Mas como é óbvio, 20% da população não se tornou fascista nos últimos anos.
A globalização, os avanços tecnológicos e a deslocalização industrial trouxeram oportunidades na redução de custos das empresas, mas “desintegraram” a “identidade trabalhadora”. Nos últimos tempos, a pandemia, a guerra na Ucrânia, o aumento de custo de vida, a perceção de desigualdades e as consequências de uma transição verde demasiado rápida que a têm tornado impopular, têm feito avançar este processo de desencantamento com os políticos tradicionais do centro.
Por outro lado, a “velha” esquerda da classe trabalhadora desviou-se para preocupações pós-materiais como os direitos das minorias e o ambiente, os partidos socialistas tornaram-se cínicos e calculistas, sobrando espaço para a direita populista, que integrou esta oportunidade de mercado político e de descontentamento social, associando os desafios da imigração a uma amálgama de valores conservadores e de etnonacionalismo, que têm sido rastilho para o seu crescimento durante décadas. A mensagem é transmitida através da voracidade imediatista e emocionalidade algorítimica das redes sociais, tornando-a mais acessível e apelativa a uma faixa etária mais jovem. Traçar linhas vermelhas, recusar o diálogo, assim como a renitência dos media em dar-lhe voz, têm sido estratégias ineficientes ou contraproducentes, pois continua a subir nas votações e sondagens, e reforçam a retórica de vitimização.
O desafio para o sucesso da direita moderada, olhando em especial para 10 de março, está no reacender da esperança no que nos pode unir, e não separar, mobilizando os cidadãos e a construção de uma sociedade onde as pessoas se sintam conectadas uma com as outras, motivada, mais próspera e orgulhosa do país que deixarão como herança às gerações seguintes; em não excluir, nem continuar a fingir que não existem 20% dos eleitores, mas ouvir atentamente estas pessoas, perceber realmente as necessidades e áreas chave que as preocupam e procurar priorizar e integrar soluções razoáveis mas efetivas.
Os riscos estão plasmados no discurso de um jovem que na Argentina votou em Milei: “Não concordo com nenhuma das suas propostas e acho que será um mau governo, mas votei em Milei para dar uma bofetada no sistema político, para mostrar que estamos fartos e que isto assim já não é possível”.