O álcool é uma droga psicoactiva
O consumo de álcool entre os jovens madeirenses com 18 anos duplicou no espaço de um ano. O relatório anual de 2022, sobre a ‘Situação do País em Matéria de Álcool’ demonstra que a ingestão de bebidas alcoólicas naquela faixa etária disparou de 4,9% em 2021 para 12,9% em 2022.
Os dados do inquérito foram analisados pelo director da Unidade Operacional em Comportamentos Aditivos e Dependências (UCAD), Nelson Carvalho, que deixou diversos apelos em relação ao consumo de álcool. A notícia faz destaque de capa da edição do DIÁRIO, desta quarta-feira.
Marco Livramento , 21 Fevereiro 2024 - 07:00
Nelson Carvalho ressalva que “há uma cultura de desculpabilização e de aceitação do álcool assustadora e é preciso mudar esse paradigma”. Acima de tudo, vinca o facto de o álcool ser uma droga psicoactiva, que está presente em muitas doenças e na perda da qualidade de vida.
O que é o álcool
O álcool, etanol, pode ser produzido pela fermentação do açúcar existente em produtos de origem vegetal, frutos, caules e raízes – tal como a cevada, a uva, a cana-de-açúcar – ou produzido por destilação.
Assim, as bebidas alcoólicas podem ser fermentadas, obtidas por fermentação alcoólica dos sumos açucarados pela acção das leveduras; ou bebidas destiladas, que resultam da destilação do álcool produzido no decurso da fermentação. Através de um processo de evaporação (seguida de condensação pelo frio) das bebidas fermentadas, podem obter-se bebidas mais graduadas.
As propriedades euforizantes e intoxicantes do álcool são conhecidas desde a Pré-História e praticamente todas as culturas têm alguma experiência com a sua utilização. Até os primatas tentam, ou inclusivamente conseguem fermentar fruta, com que produzem leves intoxicações.
O álcool tem uma história, provavelmente, tão longa quanto a humanidade, mas só recentemente, na segunda metade do século XIX, é que se desenvolveu o conceito de alcoolismo como uma doença, e não apenas como um vício.
Efeitos do álcool
O álcool é considerado uma droga psicoactiva com efeitos depressores no sistema nervoso central, provocando alterações no comportamento de quem consome. Poucos minutos após a sua ingestão, o etanol passa para a corrente sanguínea, onde pode manter-se durante várias horas, exercendo a sua acção sobre diversos órgãos.
De forma imediata, o álcool no cérebro pode ter um carácter depressor ou estimulante, consoante a quantidade absorvida, bloqueando o funcionamento do sistema cerebral responsável pelo controlo das inibições. À sensação de euforia e desinibição segue-se um estado de sonolência, turvação de visão, descoordenação muscular, diminuição da capacidade de reacção, de atenção e de compreensão, entre outros efeitos.
O álcool está na base de variadas situações de doença do, sendo directamente responsável, ou predispondo, associando-se e agravando doenças como a tuberculose, doenças cardiovasculares, doenças digestivas e cancro.
Intoxicação alcoólica aguda
As manifestações de uma intoxicação aguda alcoólica dependem da quantidade e qualidade da bebida alcoólica ingerida, bem como da tolerância do indivíduo. A intoxicação está relacionada com a acção directa do álcool sobre o sistema nervoso central, com a embriaguez a poder manifestar-se das mais variadas formas, geralmente com comportamentos desadaptados.
O consumo excessivo produz acidez no estômago, vómitos, diarreia, baixa da temperatura corporal, sede, dor de cabeça, desidratação, falta de coordenação, lentidão dos reflexos, vertigens e mesmo visão dupla e perda do equilíbrio. Por vezes, aparecem fenómenos de amnésia durante a intoxicação.
O estado mais grave de alcoolémia, com valores elevados entre os 5-6 e mais gramas/litro, pode inclusive progredir para o coma ou mesmo morte, passando por hipoglicémia secundária e alterações neurovegetativas como depressão respiratória, cardiocirculatória, hipotermia.
Efeitos a longo prazo
O consumo de álcool crónico conduz a alterações em vários órgãos vitais, como a atrofia cerebral e deterioração do cérebro; anemia e diminuição das defesas imunitárias (sangue); hipertensão arterial, dilatação com insuficiências cardíaca, perturbações arteriais (coração); hepatopatia, hepatite e cirrose (fígado); gastrites e úlceras (estômago); inflamação e deterioração do pâncreas; e sintomas de carência no intestino.
A nível psíquico, o consumo frequente pode levar a irritabilidade, insónia, delírios por ciúmes, ideias de perseguição, e, ainda mais graves, as encefalopatias com deterioração psico-orgância (demência alcoólica).
O consumo habitual na mulher grávida pode dar lugar à síndrome alcoólica fetal, que surge com a ingestão de álcool nos primeiros meses de gravidez, e é caracterizado por malformações no feto, baixo coeficiente intelectual, etc.
Dependência
O álcool provoca tolerância e um alto grau de dependência, tanto física quanto psicológica, nos consumidores crónicos, manifestando-se na necessidade de quantidades progressivamente maiores da substância para produzir o efeito desejado de intoxicação.
A síndrome de abstinência ocorre com a redução ou com a interrupção súbita do consumo no paciente dependente, surgindo entre as 12 e as 16 horas seguintes à privação da bebida, manifestando-se em inquietação, nervosismo e ansiedade.
Várias horas depois, podem aparecer cãibras musculares, tremores, náuseas, vómitos e grande irritabilidade. A partir do segundo dia de abstinência, nos casos mais graves, surge o ‘delirium tremens’, caraterizado por confusão mental, desorientação no tempo e no espaço, em relação a si e aos outros, uma clara desintegração dos conceitos, aparecimento de delírios, alucinações e fortes tremores.
Fonte: Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências