Com as questões judiciais na ordem do dia, o DIÁRIO esclarece algumas dúvidas sobre o estatuto de arguido. As informações foram retiradas do Código de Processo Penal, da página do Ministério Público e da Fundação Francisco Manuel dos Santos.
O que é ser arguido?
É uma pessoa que é formalmente constituída como sujeito processual e relativamente a quem corre processo penal como eventual responsável pela prática de um ou mais crimes que constituem o objecto desse mesmo processo. A constituição de arguido é realizada através da comunicação (oral ou escrita) feita ao visado por uma autoridade judiciária ou um órgão de polícia criminal.
Em que circunstâncias pode ou deve alguém ser constituído arguido?
A constituição de arguido pode ser realizada, conforme os casos, por um juiz, magistrado do Ministério Público ou órgão de polícia criminal (PSP, GNR, ARAE, Autoridade Tributária, etc). Pode acontecer a constituição quando: correndo inquérito contra uma pessoa e havendo suspeita fundada da prática de crime, ela prestar declarações perante qualquer autoridade judiciária ou órgão de polícia criminal; tenha de ser aplicada a alguém uma medida de coacção (por exemplo, a prisão preventiva ou a proibição de contactar certas pessoas) ou de garantia patrimonial (por exemplo, a caução económica); uma pessoa for detida para ser julgada ou para ser presente a autoridade judiciária; for comunicado a uma pessoa um auto de notícia que a dá como autora de um crime, salvo se a notícia for manifestamente infundada; durante a inquirição de uma pessoa como testemunha, surgir contra ela suspeita de que cometeu um crime. A constituição de arguido é obrigatória quando for deduzida acusação ou requerida a fase de instrução contra certa pessoa. Por outro lado, qualquer pessoa suspeita da prática de um crime tem direito a ser constituída arguida quando forem realizadas diligências de investigação que a visem pessoalmente.
Que documentos são entregues na constituição de arguido?
A constituição de arguido implica a entrega de documento onde conste a identificação do processo e do defensor (caso seja nomeado) e dos direitos e deveres processuais.
Quais os direitos de um arguido?
No momento da constituição como arguido, as autoridades devem informar o visado dos direitos que lhe assistem e, se necessário, explicar-lhe em que consistem. Entre eles, destacam-se os de: constituir defensor (advogado); estar presente nos actos processuais que lhe digam respeito; ser ouvido pelas autoridades; ser informado dos factos que lhe são imputados antes de prestar declarações perante qualquer entidade; ser presumido inocente; apresentar provas; apresentar recurso de decisões que lhe sejam desfavoráveis; e não prestar declarações sobre os factos, sem que tal silêncio possa prejudicar a sua defesa.
Quais os deveres do arguido?
O arguido tem os seguintes deveres: comparecer perante as autoridades sempre que a lei o exigir e para isso tenha sido devidamente convocado; responder com verdade às perguntas feitas pelas autoridades competentes sobre a sua identidade; prestar termo de identidade e residência logo que assuma a qualidade de arguido; e sujeitar-se a diligências de prova e a medidas de coacção e de garantia patrimonial especificadas na lei e ordenadas e efectuadas por entidade competente.
O arguido pode mentir?
O arguido apenas está obrigado a responder com verdade às perguntas que lhe forem colocadas quanto à sua identificação pessoal. Quanto ao resto, pode remeter-se ao silêncio e até faltar à verdade sem qualquer consequência legal.
Um menor pode ser constituído arguido?
Sim. Neste caso, tem o direito a ser acompanhado durante as diligências processuais pelos titulares das responsabilidades parentais, pelo representante legal ou por pessoa que tiver a sua guarda. Na impossibilidade de contactar estas pessoas, ou quando circunstâncias especiais fundadas no seu interesse ou as necessidades do processo o imponham, pode ser acompanhado por outra pessoa idónea por si indicada e aceite pela autoridade judiciária competente.
O arguido estrangeiro tem direitos especiais?
Sim. Nos actos processuais utiliza-se a língua portuguesa. Quando houver de intervir no processo pessoa que não conhecer ou não dominar a língua portuguesa, é nomeado, sem encargo para ela, intérprete idóneo, ainda que a entidade que preside ao acto ou qualquer dos participantes processuais conheçam a língua por aquela utilizada. A entidade responsável pelo acto processual provê ao arguido que não conheça ou não domine a língua portuguesa, num prazo razoável, a tradução escrita dos documentos relativos à acusação, decisão instrutória, contestação, designação de dia para julgamento e à sentença, bem como os relativos à aplicação de medidas de coacção e de garantia patrimonial e à dedução do pedido de indemnização civil, bem como de outros que a entidade julgue essenciais para o exercício da defesa. Excecionalmente, pode ser feita ao arguido uma tradução ou resumo oral dos documentos. O arguido pode escolher, sem encargo para ele, um intérprete.
Qual a diferença entre arguido e suspeito?
Um mero suspeito não é um sujeito processual e, por isso, não tem direitos nem deveres processuais específicos. Já a atribuição do estatuto de arguido a alguém (constituição de arguido) é um acto de elevada importância, pois significa que o Estado pretende investigar e, eventualmente, julgar um crime, com a inerente compressão de alguns direitos de uma determinada pessoa. Consequentemente, enquanto sujeito processual, essa pessoa fica sujeita a um conjunto de deveres que visam facilitar a administração da justiça e passa a beneficiar de um conjunto de direitos específicos que limitam os poderes das autoridades. Ou seja, um suspeito é constituído arguido para ser parte no processo e para que, por via dessa posição processual, lhe sejam aplicáveis direitos e deveres específicos.
Qual é a diferença entre arguido e réu?
O arguido é interveniente num processo penal, enquanto que o réu é alvo de um processo não criminal (não está em causa a prática de um crime), que pode ser um processo cível, família/menores e laboral.