Procissão das Cinzas: expressão de fé candidata a Património Cultural
A procissão é única na Madeira, na Quarta-feira de Cinzas, e das poucas em todo o País
A paróquia de Santa Cecília, em Câmara de Lobos, é a única na Região a celebrar a Procissão das Cinzas, na Quarta-feira de Cinzas. Este evento religioso, que marca o início do advento da Quaresma, ganha expressão, na Madeira, numa procissão em que são carregadas, pelos fiéis, várias imagens que só neste dia saem da casa dos seus “guardadores”.
Em Agosto de 2023 foi apresentada a candidatura da Procissão das Cinzas em Câmara de Lobos ao Inventário Nacional de Património Cultural Imaterial. A candidatura é promovida pela Secretaria Regional de Turismo e Cultura, com apoio da Direção Regional da Cultura, município de Câmara de Lobos, paróquia de Santa Cecília, Convento de São Bernardino e comunidade local.
Tradição centenária
Depois da euforia do Carnaval, o calendário da Quaresma prossegue com esta manifestação cultural e de fé, na Paróquia de Santa Cecília. A tradição remonta ao século XIX, e consiste num cortejo religioso que tem a particularidade de ser integrado por nove imagens de santos que se encontram à guarda dos paroquianos e saem à rua apenas neste momento religioso.
A peculiaridade surgiu da necessidade, quando, há décadas, os paroquianos acorreram ao Convento de São Bernardino, na tentativa de salvarem os ‘santos’ e as alfaias religiosas. Segundo os relatos, a necessidade de auxílio aos ‘santos’ surgiu ou do abandono do Convento, ou de um incêndio que lá terá deflagrado. Desde então que estes ‘santos’ ficaram à guarda das gentes da paróquia, na posse das mesmas famílias geração após geração.
Na Quarta-feira de Cinzas as imagens saem destas casas e são levadas ao Convento de São Bernardino, que foi alvo de obras de beneficiação, inauguradas em Março de 2015 e está, novamente, na administração dos frades franciscanos. Ano após ano, são centenas as pessoas que se reúnem para este momento único.
As imagens
São nove as imagens de espiritualidade franciscana que integram a procissão. São elas Francisco de Assis, Santa Margarida de Cortona, São Roque, Santa Rosa de Viterbo, São Benedito, Santo Ivo, Santa Isabel de Portugal e São Salvador (Jesus Cristo), que se juntam à imagem do Senhor dos Passos que está na igreja.
São os “guardadores” das imagens que colocam os ‘santos’ nos andores enfeitados com flores, com cada família a responsabilizar-se pela sua imagem.
Procissão das Cinzas em 2024
Este ano, a Quarta-feira de Cinzas calha no dia 14 de Fevereiro e a Paróquia de Santa Cecília já fez saber como decorrerá a Procissão das Cinzas, em 2024. Está previsto que as imagens cheguem ao Convento de São Bernardino até às 18 horas, com a adoração das imagens a prolongar-se entre as 17 e as 18 horas.
Às 18h30 parte a procissão, pelo percurso habitual, em direcção à igreja de Santa Cecília, onde às 19h30 será celebrada a Missa das Cinzas. É uma tradição que envolve a população, acompanhada de banda de música, num percurso com cerca de 40 minutos.
A Procissão das Cinzas foi interrompida entre 1977 e 2001, e retomada em 2002. Este é o terceiro ano em que o padre Paulo Sérgio vive este ato de fé, tendo chegado à paróquia em 2020, e tendo havido interrupção deste evento durante a pandemia de covid-19.
Candidata a Património Cultural Imaterial
A candidatura da Procissão das Cinzas em Câmara de Lobos ao Inventário Nacional de Património Cultural Imaterial foi apresentada a 22 de Agosto de 2023. A candidatura tem como entidade promotora a Secretaria Regional de Turismo e Cultura, através da Direção Regional da Cultura (Direcção de Serviços do Património/ Divisão de Estudos do Património), com o apoio do município de Câmara de Lobos, da paróquia de Santa Cecília, do Convento de São Bernardino/ Ordem dos Frades Menores e da comunidade detentora desta manifestação cultural.
Na apresentação da candidatura, o secretário regional de Turismo e Cultura, Eduardo Jesus, realçou a “riqueza extraordinária” desta manifestação cultural. Para formalizar esta candidatura foi necessário proceder a um trabalho com uma metodologia “muito específica”, segundo explicou Rita Rodrigues, da divisão de Estudos de Património, da Direção de Serviços de Património Cultural da Direção Regional da Cultura.
Temos contacto com parceiros da localidade: a Câmara Municipal de Câmara de Lobos, a paróquia de Santa Cecília, o Convento de São Bernardino, a Ordem dos Frades Menores, a Ordem Franciscana Secular e a comunidade ditadora desta manifestação, cada família que é guardiã de uma máscara. Só a partir deste trabalho conjunto é que podemos realizar quer o trabalho de campo, quer depois toda a estruturação que é exigida para que se possa concretizar a candidatura e depois mais tarde ser aceite a nível nacional a sua protecção.
Rita Rodrigues