ONU diz que queda de regime sírio é "oportunidade para respeitar direitos humanos"
Os peritos da ONU que investigam as violações dos direitos humanos na Síria desde 2011 classificaram hoje a queda do regime de Bashar al-Assad como "uma oportunidade para inaugurar uma era mais respeitadora dos direitos humanos no país".
"Chegou o momento de conduzir o país a um futuro estável, próspero e justo, que garanta os direitos humanos e a dignidade há muito negados ao seu povo", declarou em comunicado a comissão presidida pelo jurista brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro.
Pinheiro espera que a tomada de Damasco pela coligação da oposição possa marcar "o fim de décadas de repressão estatal".
A nota oficial congratula-se especialmente com a libertação de prisioneiros que teve lugar na prisão de Sednaya, nos arredores de Damasco: "É um quadro que milhões de sírios não podiam imaginar há apenas alguns dias e é importante que as autoridades atuais garantam que as atrocidades ali cometidas não se repitam".
A missão, que além de Pinheiro inclui as especialistas Hanny Megally (Egito) e Lynn Welchman (Reino Unido), destacou ainda a libertação de milhares de prisioneiros em zonas recentemente tomadas pela Organização de Libertação do Levante (Hayat Tahrir al Sham, ou HTS, em árabe, uma antiga filial síria da Al-Qaeda).
"Esperamos que as autoridades garantam que todas as pessoas libertadas de detenções arbitrárias e ilegais recebam assistência para facilitar o reagrupamento familiar e que tenham apoio psicológico e médico adequado", afirmaram.
Os investigadores manifestaram também a esperança de que seja conhecido o paradeiro de dezenas de milhares de pessoas desaparecidas, muitas das quais podem ter estado presas nos centros de detenção do regime deposto sem que as suas famílias tenham qualquer informação sobre o seu paradeiro.
Os peritos pediram que as partes em conflito facilitassem a sua entrada na Síria para investigar os centros de detenção e apelaram ao acesso sem entraves dos vários atores humanitários.
Por último, apelaram às novas autoridades sírias para que protejam as casas e os bens das centenas de milhares de pessoas deslocadas na última ofensiva das forças da oposição, que começou há pouco mais de uma semana e terminou com a tomada de Damasco.
"Há uma oportunidade para quebrar o círculo vicioso destrutivo de pilhagem que a missão documentou em anteriores mudanças de poder territorial", disseram.
Os rebeldes declararam hoje Damasco 'livre' do Presidente Bashar al-Assad, após 12 dias de ofensiva de uma coligação liderada pelo grupo islâmico Organização de Libertação do Levante (Hayat Tahrir al Sham ou HTS, em árabe), juntamente com outras fações apoiadas pela Turquia, para derrotar o governo sírio.
O Presidente sírio, no poder há 24 anos, deixou o país perante a ofensiva rebelde, segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH), desconhecendo-se, para já, o seu paradeiro.
Rússia, China e Irão manifestaram preocupação pelo fim do regime, enquanto a maioria dos países ocidentais e árabes se mostrou satisfeita por Damasco deixar de estar nas mãos do clã Assad.
No poder há mais de meio século na Síria, o partido Baath foi, para muitos sírios, um símbolo de repressão, iniciada em 1970 com a chegada ao poder, através de um golpe de Estado, de Hafez al-Assad, pai de Bashar, que liderou o país até morrer, em 2000.