As sete vidas de Albuquerque
Os eleitores estão fartos e cansados da trajectória errática da política regional do último ano
Sejamos pragmáticos e livres de qualquer preconceito partidário: para a Região e para os madeirenses é mais positivo que o Orçamento, que é discutido e votado nesta semana, seja aprovado do que chumbado. Basta ver algumas das medidas que o documento contempla para percebermos a mais-valia que representa para as famílias e empresas. Sendo um orçamento de um governo minoritário congrega um conjunto de propostas de outros partidos improváveis de serem observadas caso existisse uma maioria absoluta no parlamento. É factual que todos os partidos foram convidados a negociar este orçamento. Dois, PS e JPP, não o fizeram, mais por motivações táctico-partidárias do que por discordarem da descida de impostos e aumento de apoios sociais. É a política-espectáculo no seu melhor, onde o Chega, o autor da moção de censura que será votada a 17 de Dezembro, tenta ser actor principal de uma peça ridícula e atabalhoada, marcada por avanços, recuos, brigas internas e comunicados diários sem substância, para baralhar, confundir, lançar o caos, numa coreografia que só beneficia o líder do PSD, Miguel Albuquerque, que preserva, perante isto, mais uma das suas sete vidas.
É também factual que a Madeira atravessa um bom momento económico e que o desemprego é quase residual, mesmo que precário em muitas situações. Só que não tem estabilidade política e isso vai atrasar a concretização de políticas públicas determinantes para o próximo ano. O mundo não acaba caso o Orçamento venha a ser reprovado na sexta-feira. Aliás esse é o cenário mais expectável, tendo em conta o posicionamento dos partidos que contam na esfera parlamentar. É a melhor solução? Não é! Mas não vemos ninguém a ensaiar uma solução futura, alternativa. Vemos sim uma fragmentação preocupante no espectro partidário, o que beneficia o actual inquilino da Quinta Vigia, que se vitimiza até à eternidade.
A percepção pública é que ninguém deseja ir a votos novamente. Os eleitores estão fartos e cansados da trajectória errática da política regional do último ano. E não suportam o tacticismo que tem marcado os últimos meses. Não suportam nem percebem. Adiar a votação da moção de censura para 17 de Dezembro, após a data para apreciação do Orçamento da Região foi uma manobra inusitada e despicienda. Em toda esta tragicomédia Miguel Albuquerque é, também aqui, o único favorecido. E é o único a querer, de facto, eleições. Por motivos internos e externos. Não tem nada a perder. Antes pelo contrário. Se se cumprir a regra de que quem promover a queda do governo é penalizado, PS e Chega não lograrão um bom resultado no próximo acto eleitoral, o que obrigará de imediato a que as respectivas lideranças sejam questionadas. Com o JPP a querer passar por entre os pingos da chuva, mas com um foco de tensão bem aceso em Santa Cruz por causa da escolha do candidato autárquico é pouco provável que consiga aumentar o seu score eleitoral.
Se vencer as próximas eleições Albuquerque, arguido por suspeita de corrupção, que nunca foi ouvido pelo Ministério Público, vê renovada, em menos de um ano, a confiança dos eleitores. Quem se atreverá a desafiá-lo na liderança do partido? O presidente, que revela ter tantas vidas como a dos gatos, será o único a lucrar politicamente com quase todos os cenários, ficando livre para fazer uma profunda reformulação no futuro governo. A desejada estabilidade poderá acabar nas mãos do actual chefe do Governo. Basta conseguir eleger mais deputados para alcançar só ou com os eleitos do CDS uma maioria sólida. A oposição, com o PS à cabeça, perde nova oportunidade de ouro, no pior momento da democracia na Região. Quem lucra?
A pujança económica que a Madeira atravessa contrabalança com o aumento do custo de vida, das casas, dos bens, dos serviços e não consegue esconder as bolsas de pobreza. A Madeira é a região de país com o segundo maior risco de pobreza ou exclusão social do País. Apesar da taxa ter caído significativamente, isso não é sinónimo de sucesso absoluto. Ainda há muita gente com necessidades básicas.