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Relâmpago (timenti lua ka subi)

De repente, o álbum “Stora Stora” (Morabeza Records), de Humberto, Waldemar e Marcelo, faz a minha alegria nesta manhã fria de novembro. De repente, o poema “Calendário Lagoon”, de Aimé Césaire, ambienta -me aos versos “Habito uma ferida sagrada, habito ancestrais imaginários, hábito um corredor escuro, habito um longo silêncio”. De repente, às vezes repentista (e por que rir ainda é o melhor remédio), incorporo a áurea do “Soneto da Separação”, de Vinícius de Moraes, para o quarteto “De repente do riso, fez-se o pranto/ Silencioso e branco, como a bruma/ E das bocas unidas, fez-se a espuma/ E das mãos espalmadas, fez-se o espanto”. Agora lembrei-me, neste longo silêncio que habito, do meu pai, que desenhou o envelope do vinil “Stora Stora” e do Humbertona em “Nho Jon S’oa Min Non”, assim como saudade do Mito, algures na Austrália. Timenti lua ka subi...

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Bela e ensolarada manhã, acontecendo em Portugal, mais precisamente em Cascais, o 10º Fórum Global da Aliança de Civilizações das Nações Unidas. Neste nosso mundo que, por vias sórdidas, anda cada vez mais estapafúrdio, assombroso e (deixemos a complacência) cada vez mais perigoso, à comunidade multipolar e multicultural impõe-se o reforço da boa-vontade, do diálogo, da cooperação e do apelo à paz.

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Sem falsa modéstia, nem humildade simulada, assumimos ter corrido bem, abrindo novas portas, o colóquio dedicado ao centenário do nascimento de Amílcar Cabral: “Libertação dos povos, da ressignificação e das realidades pós-coloniais”, que realizámos na Universidade Paris Sorbonne. Uma pequena, mas marcante reflexão científica e não só sobre esta figura histórica cujo legado ainda nos aporta “futuridade” (utilizando a expressão do jornalista/ filósofo guineense Filomeno Lopes).

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Acompanho, na posição perto/longe, encostado à quarta-parede do teatro político, as eleições autárquicas do dia 1º de dezembro em Cabo Verde. Praiense por inteiro, mas não estando recenseado para votar, posto agora, tranche de vie, residir em Lisboa, acompanho todo o espasmo ideológico e cada antonímia da esperança.

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O meu “sonho feliz de cidade” (metropolitana ela para a arte, ciência, educação, tecnologia e investigação, para o século XXI) não me parece ora contemplado, mas, por via das dúvidas, algo como o bufão político cansa-me. Uma Praia avessa à arrogância que é prepotência e à egolatria que é nonsense, está mais dada à minha circunstanciada utopia.

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Antes, ponho no toca-discos o álbum de vinil “Prestige de Paris”, com a Grande Orquestra de Paul Mauriat. Afinal, a arte faz-se presente no ouvir “La Mer” (Charles Trenet), as respostas fazem-se presentes...