Eleições de 2024 incluíram fraude em regimes autocráticos e violência política
A maioria dos países democráticos realizaram eleições livres e justas em 2024, mas a violência política foi generalizada e nos regimes autocráticos houve votações "fraudulentas", avalia o centro de investigação Freedom House.
De acordo com o artigo "A Democracia Sobreviveu ao Ano Eleitoral, mas a Luta pela Liberdade Continua", o ano de 2024 foi marcado por um "cenário misto", com "eleições muito competitivas nas democracias, eleições fraudulentas nas autocracias e violência política generalizada".
Apesar de não se terem registado tentativas de impedir a transferência pacífica de poder, a "manipulação eleitoral foi generalizada" em países com instituições democráticas fracas ou inexistentes.
A Freedom House é um "think tank" baseado em Washington, D.C. que, há mais de 50 anos, monitoriza de forma sistemática as ameaças mais persistentes aos regimes democráticos e à liberdade em todo o mundo, promovendo políticas que reforçam a democracia e protegem os direitos humanos.
Nos países classificados pela organização como Parcialmente Livres e Não Livres, os incumbentes "tentaram reprimir a concorrência, excluindo os seus adversários em 22 das 35 eleições", recorrendo à violência contra candidatos políticos, contra os locais de voto e durante os protestos pós-eleitorais, o que afetou 26 eleições em todo o mundo.
Num quarto das 62 eleições acompanhadas pela Freedom House em 2024, os eleitores "não tiveram escolhas reais no boletim de voto" e, em pelo menos 16 momentos eleitorais, os "autocratas prenderam ou desqualificaram arbitrariamente os seus opositores antes da votação, a fim de eliminarem a mais pequena hipótese de perderem o controlo do poder".
"Na Argélia, no Azerbaijão e no Ruanda, por exemplo, a maior parte dos opositores políticos foram detidos ou desqualificados por razões débeis e politicamente motivadas, abrindo caminho para que os titulares do cargo saíssem vitoriosos com mais de 90% dos votos", afirmam as autoras na publicação.
Ainda assim, as restrições impostas aos candidatos não "garantiram eleições sem problemas para todos os autocratas".
O Supremo Tribunal venezuelano confirmou este ano a proibição da participação da líder da oposição, María Corina Machado, de participar em eleições durante 15 anos, mas tal não a impediu de apoiar o candidato da oposição, Edmundo González Urrutia, que disputou as eleições contra o Presidente Nicolás Maduro, em julho.
"Incapaz de excluir completamente a oposição, o regime de Nicolás Maduro recorreu a métodos de manipulação mais duros, incluindo a falsificação dos resultados e a detenção de milhares de apoiantes da oposição após o anúncio dos resultados fraudulentos", afirma a Freedom House.
Ao longo do ano, "em busca da legitimidade que as eleições conferem aos seus vencedores", os autocratas encorajaram ativamente, pressionando em alguns casos, os eleitores a comparecerem às urnas.
"O Kremlin (presidência russa) esforçou-se por conseguir uma afluência às urnas e uma percentagem de votos recorde para [o Presidente] Vladimir Putin, obrigando as universidades e as escolas a ameaçar os estudantes com sanções académicas se não votassem nas eleições presidenciais", refere o relatório.
A violência, adianta, "degradou os direitos e a segurança dos candidatos e dos eleitores em 2024", com casos de "grupos criminosos" que visaram candidatos políticos, com o intuito de "influenciar os resultados eleitorais", citando o exemplo do México, onde "pelo menos 38 pessoas, a maioria das quais candidatas a cargos locais, foram mortas durante as eleições gerais".
Nos regimes democráticos, "o descontentamento político, canalizado para a violência, prejudicou as eleições nas democracias estabelecidas", com França a ser palco de agressões físicas a 51 candidatos, apoiantes e activistas, e o Presidente eleito norte-americano, Donald Trump, a ser alvo de duas tentativas de assassinato durante a campanha eleitoral.
Por outro lado, e segundo a rádio pública norte-americana National Public Radio (NPR), Donald Trump fez mais de 100 ameaças de processar os seus opositores políticos durante a campanha, e "se forem levados a cabo esforços para proibir, prender ou encarcerar arbitrariamente opositores políticos, [estes] serão um dos sinais mais claros da deterioração da democracia".
A responsabilização dos líderes políticos depois das eleições significa então "confiar noutros componentes integrais da democracia", como tribunais independentes que possam "defender o Estado de Direito e controlar os excessos do executivo", meios de comunicação social independentes capazes de "denunciar a corrupção" e organizações da sociedade civil que possam "monitorizar as violações dos direitos, ajudar as comunidades marginalizadas e mobilizar o público".
Além diso, os vários órgãos e instituições que compõem a vida política são aspectos da democracia que "não podem ser facilmente destruídos, mesmo por líderes ambiciosos e pouco liberais", tal "como demonstra a resistência contínua dos dissidentes" em regimes autoritários.
"O ano das eleições mundiais terminou, mas a luta para expandir e proteger as liberdades continua", concluem as autoras.