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O Inverno do nosso descontentamento

No PSD-M, quem de direito tem de abdicar do egoísmo pessoal e pensar no bem comum

Inspirei-me no livro homónimo de John Steinbeck para dar título ao meu artigo de dezembro. Por sua vez, o mencionado escritor já tinha se baseado numa frase da peça de Shakespeare, “Ricardo III”, que retrata a ascensão e queda do Rei Ricardo III de Inglaterra. Qualquer semelhança com a nossa atual realidade política (não) é mera coincidência.

O inverno está quase a chegar e, olhando para as previsões da meteorologia política, avizinha-se o agravamento da tempestade que assola a Madeira e que dá sinais de não dar tréguas nos próximos tempos.

Claro que, face ao nosso passado e presente políticos, há uma grande possibilidade de, entre as nuvens, o sol brilhar numa tonalidade laranja. Mas, se tudo continuar na mesma, não será um sol duradouro.

Falando claro, e sem metáforas, não podemos continuar neste cenário político feito de instabilidade e incerteza, com tomadas de posição e de decisão tão estranhas, que até parece que se vive num universo paralelo.

A vida das pessoas e das empresas, e da própria Região, não se compadece com este vaivém de eleições, de orçamentos chumbados ou de medidas de curto prazo. Igualmente, não é benéfico assistirmos a posturas e decisões atabalhoadas, insensatas, de autênticos tiros no pé por parte da Oposição. É tudo tão risível, ao nível de um “vamilhá” boçal, que chega a ser confrangedor e faz até duvidar da vontade de ser poder por parte de alguns atores políticos da nossa Região.

Penso que a maioria dos madeirenses e porto-santenses começa a apresentar sintomas de fadiga eleitoral, pelo que os medicamentos têm de estar à disposição: bom senso e decência por parte dos políticos à frente dos destinos dos partidos e do Governo.

No PSD-M, quem de direito tem de abdicar do egoísmo pessoal e pensar no bem comum. A chave para abrir um novo ciclo, com celeridade e em prol dos madeirenses e porto-santenses, está nas mãos do atual líder social-democrata que, para não prejudicar mais a Madeira e os seus concidadãos, deveria afastar-se da liderança do Partido e do Governo para clarificar a sua situação judicial. É mais do que tempo de ultrapassar este impasse político, acabar com narrativas e dramas, e com dignidade, sentido de Estado e de missão, serenar a vida política. Caso não o faça, os órgãos do partido e a sua entourage têm de o fazer sair da narrativa artificialmente criada, e adotarem, de forma firme e convicta, a melhor estratégia para construir uma realidade política que privilegie a defesa dos cidadãos, que querem e merecem estabilidade e certeza para viver o seu quotidiano.

Partilho da opinião de que as eleições são o meio ideal de legitimação de qualquer poder partidário ou político. Infelizmente, não acredito que, neste momento, haja condições justas e transparentes, nem muito menos tempo, para irmos a novas eleições internas. Havendo eleições legislativas regionais antecipadas no timing que se fala, até finais de fevereiro/inícios de março de 2025, sem que haja mudanças na liderança partidária social-democrata, julgo que o resultado vai ser muito semelhante ao atual.

E isso significa que vai continuar a instabilidade, a incerteza, e vamos andar de moção de censura em moção de censura, com orçamentos em duodécimos sucessivos, e a vida dos cidadãos, famílias e empresas, que é o mais importante, continuará em compasso de espera.

Acredito convictamente que a solução governativa tem de ser liderada pelo PSD-M, mas tem de ser composta por pessoas que garantam estabilidade, capazes de fazer pontes e estabelecer consensos internos e com os demais partidos.

O que se passa atualmente no cenário político regional vai muito além do que se passa em termos de Justiça, com processos que terão o seu tempo para sentenças, nunca esquecendo a presunção de inocência que todo o cidadão beneficia até decisão em contrário. Evidentemente que os casos em tribunal, com a constituição de arguidos, tiveram influência significativa no atual panorama político, mas, na minha opinião, foram só o gatilho que espoletou o descontentamento que, de forma camuflada ou mais evidente, já se fazia sentir quer nos militantes sociais-democratas quer na população em geral. Só quem viva ou queira viver alienado da realidade é que não sente o crescente mal-estar e desagrado que grassa na população e no partido do poder. E não nos podemos contentar com a pouca clarividência, diria mesmo completa aselhice de grande parte da oposição, naquela velha tese de que “eles ainda estão piores do que nós”. Até pode ser verdade que grande parte da oposição não saiba a quantas anda, mas o PSD-M tem de se distinguir, como no passado, por ser o partido mais bem preparado para liderar o destino da nossa Região e não só continuar a vencer, cada vez com menor expressão, por demérito da oposição.

Não obstante pareça evidente que, na atual crispação política, os entendimentos sejam difíceis de alcançar, exige-se serenidade, bom senso, altruísmo e diálogo, para evitar que fique tudo na mesma. Ficar tudo na mesma é começar o próximo ano com a certeza que será uma repetição de 2024, e penso que este ano não deixará saudades a ninguém.

Embora saiba que muitos dos protagonistas políticos já vieram dizer que preferem eleições, sou da opinião que o PSD-M deveria dar um sinal de maturidade e lucidez e, sem tabus, sem ressentimentos, mas com o espírito de união que sempre foi apanágio do maior partido da Região, apresentar ao Representante da República uma solução estratégica de governação, sob a égide da Autonomia, liderada por quem já provou recentemente ter quase metade do partido consigo (e com os constrangimentos que bem sabemos), e composta por representantes das várias sensibilidades do partido, e até com pessoas da sociedade civil, que tenham boa aceitação na população, e com reconhecido mérito pessoal, profissional e político. Pessoas capazes de agarrar o leme deste barco à deriva, e conseguirem, para lá da espuma das ondas do dia a dia, pô-lo a navegar em direção a um futuro com esperança.

Tempos conturbados exigem o melhor de nós, e o melhor de nós não pode ser defender o indefensável só por comodismo, ou pior, por oportunismo político. União não é unanimismo, todos temos direito a ter opiniões diversas e oportunidade de exprimir os nossos pensamentos e ideias sem sermos acusados de traidores ou ressabiados. Muito mau será quando um partido que se quer democrático silencie vozes discordantes. O PSD não é de um só homem, é sim fruto da dedicação de muitos homens e mulheres que construíram um partido sob o lema de “paz, pão, povo e liberdade”. Perder essa matriz é perder a alma do partido.

Tempos revoltosos exigem que não se desista, que se insista em criar soluções vencedoras e estáveis. Não podemos ter medo de lutar pela nossa Terra e pelas nossas Gentes.

Acredito que ainda vamos a tempo de construir um amanhã melhor.

P.S.: Um Feliz natal para todos e que 2025 seja o ano do nosso contentamento.