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Espectáculo do Conservatório reflecte sobre legado de 'Orpheu' 100 anos depois

Apresentação decorrerá, amanhã, no Colégio dos Jesuítas

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Foto Aspress

O Conservatório – Escola das Artes da Madeira, Eng.º Luiz Peter Clode, estreia amanhã, dia 12 de Dezembro, pelas 21 horas, o espectáculo de teatro ‘Quando algumas pessoas têm a mesma desgraça, juntam-se’, promovido pelos alunos dos Cursos Profissionais de Artes do Espetáculo – Interpretação e Técnico de Animação 2D/3D. Com repetição a 14 de Dezembro, pelas 17 e 21 horas, este espectáculo decorrerá no Colégio dos Jesuítas, no Funchal.

Esta nova criação multidisciplinar, concebida pelos estudantes do 2.º ano do Curso Profissional de Artes do Espetáculo – Interpretação e do 3.º ano do Curso Profissional de Técnico de Animação 2D/3D, convida o público a revisitar a importância da criação artística em Portugal.

Inspirado na revista 'Orpheu', lançada em 1915 por jovens como Almada Negreiros, Fernando Pessoa, Mário de Sá Carneiro e Santa-Rita Pintor, o espetáculo faz um paralelo entre os desafios enfrentados por essa geração e as questões que ainda inquietam os artistas contemporâneos.

Orientado pelos docentes João Paiva, João Pedro Pereira e Telma Rodrigues, o espetáculo combina teatro, animação e linguagem televisiva para reflectir sobre temas como: "O que é arte?" e "Qual o papel da arte na sociedade?".  Relembra-se o contexto de um Portugal tradicionalista que condenou e ridicularizou os criadores de 'Orpheu', mas cuja visão futurista e progressista permanece relevante.

Entre referências à entrevista de Almada Negreiros no programa ZIPZIP, em 1969, e trechos emblemáticos como a conferência 'A Invenção do Dia Claro', de 1921, o espetáculo "desafia o público a pensar sobre o papel transformador da arte e a liberdade criativa, essenciais para construir uma nova geração de artistas portugueses".

A lotação da sala é limitada a 80 pessoas e a entrada livre. São aceites reservas no perfil de Instagram da turma de teatro (@babucs) ou através do e-mail do Núcleo de Produção do Conservatório ([email protected]).

Sinopse do espetáculo:

“Em 1915, um grupo de jovens artistas cria uma revista cultural numa clara tentativa de fazer subir a maré de uma Lisboa estagnada e muito distante da fruição cultural, que explodia um pouco por toda a Europa. Em 1969, um destes artistas, Almada Negreiros, dá uma rara entrevista a Raúl Solnado, Fialho Gouveia e Carlos Cruz para o programa ZIPZIP da RTP, onde falou um pouco sobre a sua vida e carreira abordando o período da geração de Orfeu e o surgimento do Futurismo em Portugal. Em 2024, uma nova geração de artistas portugueses debate-se com problemas idênticos aos que já se sentiam cem anos antes: Qual o valor da arte? O que é considerado arte? É a arte que constrói o artista ou é o artista que define o que é arte? Através da colaboração entre o 2º ano do Curso Profissional de Artes do Espetáculo – Interpretação e o 3º ano do Curso Profissional de Técnico de Animação 2D/3D, apresentamos um trabalho multidisciplinar, que cruza a linguagem da televisão, do cinema de animação e do teatro para provocar o público, desafiando-o a refletir sobre a importância da criação artística, independentemente do resultado, e do seu papel social na construção e no desenvolvimento de uma nova geração de artistas portugueses. Em 1915, estes sonhadores (hoje em dia, alguns dos mais conceituados artistas nacionais) eram ainda jovens, na descoberta do que podiam ou não ser e, principalmente, a tentar construir uma sociedade futurista, progressiva e jovem, num país passadista e conservador, que se geria pelos valores do tradicionalismo, dos costumes e da moral, que castrava os jovens e os enquadrava num perfil comportamental e sociológico. Foram absolutamente destruídos. Pela crítica, pelo povo, pelos seus pares. Foram ridicularizados, diminuídos, rejeitados. Foram cancelados. Mas aquilo que eles criaram talvez seja mais forte e importante do que se esperava inicialmente. A revista Orpheu, criada em 1915, por Mário de Sá Carneiro, Fernando Pessoa, Almada Negreiros e Santa-Rita Pintor, entre outros, teve um primeiro número publicado em Portugal e no Brasil, um segundo publicado apenas em Portugal, financiado pelo pai do Sá Carneiro, e um terceiro que nunca viu a luz do dia. Um misto de incompreensão e ridicularização condenou a revista e os seus autores, tendo a crítica do então Ministro da Instrução Pública, o Dr. Júlio Dantas, um papel fundamental em catalogar e rotular a revista, como a tentativa de um grupo de rapazes que, para se tornarem conhecidos, lançaram ao papel várias maluquices. Orfeu acabou, mas Orfeu continua; na altura, como uma revolta contra a tradição artística nacional ancorada na ideia de um espírito europeu e das típicas confluências culturais e intelectuais das primeiras décadas do século XX. Hoje em dia, Orfeu sobrevive como uma, quase, ténue lembrança da importância que é a existência de uma geração de artistas que consiga expressar a sua arte de uma forma livre, sem condicionalismos. Dizia Almada Negreiros na conferência “A Invenção do Dia Claro”, em março de 1921: “Eu pinto o que tenho em mim e por isso, sou imortal. Digo-o com muito cuidado porque eu pinto aquilo que eu vejo, aquilo que eu sinto e aquilo que eu gosto. Mas se pintar o gostar dos outros, então eu morro. Se a arte não for a do artista, então é mercado. É comércio. Não dura para sempre.” Mais de cem anos depois, talvez ainda valha a pena pensar sobre tudo isto".