Será que o preço da água não foi actualizado desde 2020?
Os aumentos das despesas fixas no final do mês mexem sempre os nervos e com a carteira do consumidor porque não gosta de pagar mais quando nota uma desproporcionalidade nos vencimentos que aufere anualmente baseado nos respectivos acordos de concertação social. Pois bem, esta semana soube-se que a empresa pública Águas e Resíduos da Madeira (ARM) propõe uma actualização da tabela de preços através de um aumento de água de 12% na factura em alta e igualmente em baixa.
E, ontem, confrontado com o tema, o presidente do Governo Regional relativizou a polémica porque nas contas de Miguel Albuquerque está em causa um acréscimo de apenas 3 cêntimos por metro cúbico (m3), ou seja, passar dos actuais 34 cêntimos por m3 para 37 cêntimos. Sustentou por isso que o aumento em causa é "irrelevante", justificado pelo facto do preço da água não ter sido actualizado desde 2020.
Será que assim foi?
Antes de verificarmos se a resposta corresponde ao que foi proferido, Albuquerque quis deitar água na ‘fervura’ justamente pelo motivo que o tema suscitou críticas de diferentes presidentes de Câmara, de vários quadrantes políticos, que discordam deste significativo aumento que será cobrado aos municípios pelo serviço em alta. Aliás a contestação não é nova sempre que existem intenções de aumentos do tarifário, inclusive com ameaças de diferendos na justiça e que leva os municípios e a gestão do sector a estar de costas voltadas.
Ora, ainda a propósito do aumento, Albuquerque minimizou a questão, sublinhando que o preço da água na Madeira "é dos mais baratos do país", concluindo que aquilo que importa reflectir nesta actualização são também os valores da inflação dos últimos anos. Mas as razões do aumento são outros ‘500’ que está associado a custos de energia e com os recursos humanos. O que se pretende clarificar neste fact-check é se houve actualizações imputadas aos consumidores no período de 2020 a 2024.
Numa pesquisa efectuada constata-se que, por exemplo, no final de 2022, a Câmara Municipal do Funchal (CMF) deliberou que os preços do abastecimento de água e também ao tratamento de resíduos sólidos, seriam actualizados para o ano seguinte, como de resto explicou nessa altura Pedro Calado, ainda presidente da autarquia.
Esse aumento corresponderia, complementou, a “4,04%, exactamente o mesmo valor que a ARM aumentou na água que fornece, em alta, à CMF”, justificava e, para o tratamento de resíduos sólidos, que depois seriam entregues, na Meia Serra, cujo aumento foi de “2,45%”, adiantou o presidente da autarquia na ocasião, aumento inferior à taxa de inflação que em 2022 foi de 8,1%, muito acima dos valores aprovados, concluindo que houve uma tentativa por parte destas duas entidades públicas de reduzir ao máximo os aumentos nestas tarifas.
Já em Janeiro deste ano foi anunciado que a CMF novos preços das taxas municipais, inclusive do “abastecimento de água, saneamento básico e tratamento de resíduos sólidos, em 5,79%, de acordo com a variação média da inflacção dos últimos 12 meses”, lê-se na informação divulgada pelo município no início deste ano.
A Oeste, na Ponta do Sol, o vice-presidente da edilidade saiu a terreiro para mostrar o seu desagrado pelo facto de assistir ao aumento da tarifa da água no concelho em alta. Em causa, Sidónio Pestana apontou um aumento de 10% da ARM. Nessa data o autarca contestou que em dois anos a Câmara teve um acréscimo de mais 65 mil euros pagos à ARM em aumentos de tarifa sendo “o terceiro aumento em menos de dois anos”.
O autarca socialista saiu em defesa dos consumidores considerando que o aumento proposto pela ARM para a tarifa de água em alta constituía uma “subida de 2%”, relativamente à actual tarifa, passando de 0,3294 euros para 0,3360 euros por m3.
Este aumento, queixava-se, surge na sequência de “aumentos consecutivos num espaço de tempo e que já vai em 12%”, contabilizando as percentagens de 6% em Janeiro de 2022, 4% em Janeiro de 2023, e agora mais 2% em Janeiro de 2024.
A empresa pública Águas, Resíduos da Madeira propõe aumentos generalizados a partir de 1 de Janeiro de 2025. Por imposição legal, a proposta está a ser conversada com os Municípios, que contestam a intenção. Empresa alega que, em 2025, há grandes gastos com recursos humanos e energia, o que obriga a um tarifário superior.
A autarquia lembra que a ARM pode recorrer ao mecanismo que consta do Decreto Legislativo Regional da concessão (nº 5 da Base III - Regime de concessão - do DLR 17/2O14/M), que prevê a possibilidade de compensação directa à concessionária por parte da concedente (Região).
Esta seria a forma de não imputar aos municípios os aumentos da venda da água em alta, o que, por sua vez, se iria repercutir na factura aos munícipes, defende como medida mitigadora. Seja como for na Ponta do Sol não existiram aumentos nas tarifas da água porque o concelho assim não quis, situação que a própria presidente já disse ao nosso jornal ser impossível aguentar face à escalada de preços imposta pela ARM.
Tal como já foi referido pelo DIÁRIO o estudo para a revisão tarifária observa que “o trabalho desenvolvido não constituiu um exame completo de auditoria conduzido de acordo com as Normas Internacionais de Auditoria, nem, excepto quando referido o contrário, submetemos a informação financeira ou não financeira contida neste relatório a procedimentos de verificação. Caso tivéssemos efectuado tais procedimentos, aspectos adicionais poderiam ter-se revelado, os quais teriam sido reportados no presente relatório. Assim, e excepto se referido em contrário, o nosso trabalho não incluiu procedimentos que visem confirmar a exactidão e totalidade da informação incluída neste relatório, pelo que não assumiremos qualquer responsabilidade a este respeito”.
E diz mais: “Não garantimos que o trabalho efectuado seja suficiente, quer para os fins para os quais este relatório foi preparado, quer para quaisquer outras finalidades. A responsabilidade por determinar em que medida o trabalho efectuado é suficiente é do cliente”.
Como se pode verificar pelo aqui exposto, não é verdade que a água não tivesse tido aumento no tarifário desde 2020.