A parábola do pêro podre
Caros leitores, certamente, alguns de vós devem lembrar-se quando éramos crianças as curas para as nossas dores eram, maioritariamente, naturais. Por exemplo, quando eu tinha uma dor no ouvido os meus avós espremiam um pêro estragado e o líquido resultante era aplicado no local para suavizar a dor, e funcionava! Hoje em dia essas práticas já não se aplicam ou são raramente utilizadas, pois cremos no avanço da medicina e da tecnologia e, de certa forma, estamos subordinados à evolução. Como tudo é progresso, nós também evoluímos e envelhecemos. Há uns dias, ao olhar para o espelho, apercebi-me que já não sou um jovem de vinte anos e que a vida está a passar por mim com uma celeridade aterradora. Os cabelos brancos sobrepõem-se aos escuros, a face tem as bochechas a descair, os olhos ostentam um ar cansado, a boca já me trai quando quero proferir palavras sem que seja emitido qualquer som, e não sei como, mas parece que até o nariz está diferente… Esta minha visão aterradora levou-me a questionar a minha existência, deve ser uma crise de meia-idade, sei lá…, mas dei por mim a pensar nos meus feitos enquanto homem de família, enquanto cidadão de uma sociedade disfuncional e enquanto profissional mal pago. Confesso que não sou uma pessoa paciente, mas sou prudente, pelo que, sempre considerei que uma grande qualidade complementa a falta de outra. Quando paro e apercebo-me que este mundo está ao contrário, com guerras no médio oriente e nas extremidades da Europa, políticas de desgovernação em todo o mundo, religiões que se sobrepõem, violência descomunal, intempéries e para rematar a desgraça junto a minha visão no espelho, questiono o que será deste mundo desgovernado? Esta semana um jovem deu-me uma lição valiosa de esperança e percebi que, afinal, a humanidade ainda tem salvação. Embora alguns sejam mais dignos do que outros, todas as vidas são importantes, ainda que uns disponham de uma insensatez abismal e uma prepotência inigualável para fazer disparates. Quando se olhar ao espelho, mesmo com rugas, cabelos brancos e os olhos esbugalhados que parecem ter cem anos, seja como o pêro podre. Sinta-se útil, veja um leão no espelho, com toda a vitalidade do Universo. Lembre-se que ser maduro traz a vantagem do conhecimento e da experiência. Até um pero podre no fim de vida tem utilidade. Resumindo, seja um pêro podre!
N. Nunes