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Bem prega Frei Tomás...

Na azáfama em que a política está transformada, mais uma vez, em tão pouco tempo, importa olhar para as posições que ao longo deste ano foram sendo tomadas pelos partidos políticos, para que o trigo seja separado do joio.

A 26 de Maio do presente ano, os madeirenses e porto-santenses foram chamados às urnas para eleger uma nova configuração na ALRAM, e, convenhamos, praticamente nada mudou. Quase um mês depois da tomada de posse do Governo Regional da Madeira, o seu programa foi aprovado com 22 votos a favor (PSD, CDS e PAN), 21 votos contra (PS, JPP e a deputada Magna Costa do CH), e 4 abstenções (IL e 3 deputados do CH).

A responsabilidade da entrada em funções do atual Governo Regional é única e exclusivamente do Chega que, tomando o fracasso por virtude, permitiu a passagem da moção de confiança que estivera subjacente ao Programa de Governo – coisa que, outrora, disse jamais fazer. Ninguém condenaria a responsabilidade de um partido ao permitir, decentemente, a entrada em funções de um Governo que tivera saído vitorioso das eleições regionais.

Acontece que a estratégia política do Chega para as eleições regionais de 26 de Maio se baseou no ataque sorrateiro à figura política de Albuquerque. E a este propósito, recordemos as declarações, em campanha eleitoral, dos mais altos dirigentes do Chega Madeira, e, também, do líder nacional:

A 16 de Abril, Miguel Castro dizia o seguinte: “Somos os únicos que já dissemos que não queremos nada com o PSD – nem antes, nem depois das eleições. Já o dissemos várias vezes.”

A 28 de Abril, Miguel Castro dizia o seguinte: “Somos um partido que combate a corrupção, por isso não estamos abertos a entendimentos, coligações ou quaisquer acordos com o PSD. Nós, que não nos damos com corruptos, nunca poderíamos entrar em qualquer acordo com o PSD.” (…) “O único partido que não quer nada com o PSD é o CHEGA. Por isso, se as pessoas querem correr com o PSD do poder, o seu voto só pode ser no CHEGA.

A 12 de Maio, André Ventura dizia o seguinte: “O Chega seria absolutamente incoerente se, depois disto tudo, fizesse qualquer espécie de acordo com este PSD e com Miguel Albuquerque.”

A 22 de Maio, André Ventura dizia o seguinte: “O Chega quer tornar-se decisivo na governação da Madeira, deixando claro que não fará nenhum acordo com o PSD de Miguel Albuquerque.”

A 22 de Maio, Miguel Castro dizia o seguinte: “Não estabeleceremos acordos pós-eleitorais com o PSD de Miguel Albuquerque, nem com qualquer líder indicado quer por ele, quer por membros da sua lista candidata.”

A 10 de Junho, Francisco Gomes (deputado do CH à AR): “O Chega não se vende a ninguém. Durante a campanha disse, durante toda a campanha já disse, o líder nacional já disse, e o líder regional já disse. Com Albuquerque não. (…) Penso que a posição já foi bem esclarecida.”

A 21 de Junho, Miguel Castro dizia o seguinte: “Já assumimos a nossa posição várias vezes e não vamos alterá-la, doa a quem doer. O impasse que existe na política regional foi criado pelo PSD e cabe ao PSD resolvê-lo. Para tal, tem de substituir Miguel Albuquerque, pois, como já dissemos centenas de vezes, não iremos apoiar qualquer governo por ele liderado.”

A 2 de Julho, André Ventura dizia o seguinte: “Mantemos a condição de saída de Miguel Albuquerque. (…) Falei há minutos com Miguel Castro, a nossa posição mantém-se inalterável, o PSD sabe disso, o Governo Regional sabe disso.“

A 4 de Julho, Miguel Castro, Hugo Nunes e Celestino Sebastião – todos deputados do CH à ALRAM – abstiveram-se na moção de confiança do Governo Regional, o que permitiu que o Governo visse o seu programa aprovado e, consequentemente, entrasse em plenitude de funções. Os deputados do Chega exigiram quatro condições ao Governo Regional para que viabilizassem a moção de confiança: a criação de um gabinete autónomo de prevenção e combate à corrupção; uma auditoria externa das contas regionais dos últimos cinco anos; a criação de uma comissão parlamentar de inquérito regional aos apoios concedidos nos últimos anos pelo Governo Regional a empresas; e, ainda, a renúncia do presidente do executivo, Miguel Albuquerque, caso seja formalmente acusado no processo sobre alegada corrupção. Ora, se estas condições não fossem cumpridas, então o CH apresentaria uma moção de censura – e sejamos sérios, só a apresentaria se a última condição não fosse cumprida.

Francisco Gomes, no dia 11 de Novembro, na RTP-M, disse que: “Nós pusemos a Madeira à frente do partido, e fomos criticados por isso”. Errado. O CH delineou uma estratégia política para levar avante na campanha eleitoral, e definiu o seu discurso que aqui está retratado. Foi o CH que escolheu seguir esse caminho político de combate à figura de Miguel Albuquerque. O CH foi criticado porque não honrou a palavra nem os princípios sobre os quais, os seus deputados, foram eleitos. Simples.

Pelo meio Miguel Castro disse, a propósito da incineração da sua própria posição quanto ao Governo de Albuquerque, que “as pessoas têm que compreender como é que se faz política”. A política faz-se com verdade, com lealdade às posições tomadas e sobre a qual foram eleitos. A política não se faz num rame-rame à procura do melhor contexto político para se locupletar (politicamente). A política faz-se com caráter e dignidade, para servir as pessoas e honrar cada voto que o povo deposita. É assim que a política se faz, não é revertendo tudo aquilo que se disse ao longo de meses a fio, tomando o povo como um bando de raquíticos acéfalos – ainda que algumas criaturas se assemelhem a tal descrição.

Passado pouco mais de 4 meses, a tentação de ceder às vontades de Lisboa e, novamente, rasgar cada condição imposta, para renová-las e ajustá-las ao contexto atual e que melhor serve não o discurso do CH-M, mas o discurso do CH a nível nacional, vingou, sem que o niilismo da (inexistente) figura política do líder regional seja motivo de preocupação para o líder nacional. Em última análise, Ventura permanece e Castro cai.

Já no dia 11 deste mês, Francisco Gomes – deputado do CH na AR –, no Programa “Ordem do Dia”, na RTP Madeira, entrou em modo de campanha eleitoral, seja interna ou externa – só o próprio confirmará –, e atirou, desenfreadamente, em todos os sentidos. Disse: “repete-se a corrupção, repete-se o compadrio, repete-se o amiguismo” – referindo-se, naturalmente, ao Governo Regional, e usando isso como um dos argumentos para a apresentação da moção de censura. Por momentos, Francisco Gomes, envaidecido provincianamente na autoproclamada idoneidade política, critica-se a ele próprio. Porque repare, caro leitor, que antes de assumir o cargo de Deputado à AR, foi Chefe de Gabinete do Grupo Parlamentar do CH na ALRAM, cargo esse que é hoje ocupado pela sua esposa. Os factos falam por si, mas não haverá exemplo mais claro de amiguismo e compadrio do que este.

O populismo brega e a demagogia simplória são próprios dos homúnculos que procuram a ebulição política a todo o custo, e fazem parelha com os monos de pedra que desesperam por submissos esbugalhados que se rendem, inquestionável e silenciosamente, às ordens ditatoriais e maniqueístas, que mais não são senão um mero instrumento para atingir o fito de dilacerar o capital político que as instituições democráticas detêm.

Quanto ao mais, tais basbaquices servirão, no mínimo, de exemplo para todos aqueles que se pavonearam pela cidade a exibir capacidades de entendimento com fanáticos apóstolos que vicejam no ruído e na confusão; pode ser que tenha ficado explícito que não há pactos possíveis com indigentes que reagem com gaita de beiços a qualquer deserção ideológica, política, moral ou civilizacional – e que se tenha esta condição como secundária para não perscrutar o horizonte ao lado de estorvos sem decência, humanismo, respeito e decoro.

Não é possível aos partidos que partilham a sua idade com a celebração da democracia vergarem-se às proclamações e exigências de um conjunto de bonzos que se mutilam pela exibição do pior de si próprio, e em que a mediocridade é sua condição e irreparável destino aliada à verborreia própria do mais frívolo proletariado.