Portugal está preparado para adotar uma jornada de 4 dias?

Como se estivesse a seguir o espírito crítico de nossos ancestrais, surge a pergunta: estará Portugal realmente preparado para uma jornada de trabalho de quatro dias, com descanso de três? No plano das ideias, a proposta seduz e promete benefícios em várias frentes: uma melhor qualidade de vida, o alívio do stress laboral, e um equilíbrio que permitiria ao trabalhador português mais tempo para a vida pessoal. Experiências internacionais, como na Islândia e no Reino Unido, reforçam a ideia de que a redução da carga semanal pode, em alguns setores, manter ou até aumentar a produtividade. Mas, Portugal — este país com uma economia dependente de pequenas e médias empresas, e onde o tecido económico é, em grande parte, sustentado pelo comércio local e pela indústria — está pronto para um impacto deste calibre?

Primeiro, analisemos os custos. Muitos empresários portugueses já enfrentam uma elevada carga fiscal e custos trabalhistas que tornam complexa qualquer mudança estrutural sem um impacto financeiro profundo. A implementação de uma semana de quatro dias exigiria que as empresas contratassem mais pessoal para compensar a redução de horas trabalhadas, ou então que sobrecarregassem os trabalhadores com metas difíceis de cumprir em menos dias. Sem uma análise cuidadosa dos custos, há o risco real de muitas empresas, especialmente as de pequena dimensão, verem-se forçadas a recorrer à informalidade ou, pior, a fechar portas. E, nesse cenário, ao invés de um avanço, viveríamos um retrocesso — um fenómeno de “despedimentos involuntários” no exato momento em que Portugal se esforça para melhorar a taxa de empregabilidade e a competitividade no mercado europeu.

A experiência de trabalho reduzido pode funcionar em setores específicos, onde as operações se baseiam em trabalho criativo ou onde a produtividade é medida pela eficiência e não pela presença constante. Mas, para indústrias como a agricultura, o turismo e o comércio, em que a presença física e o atendimento constante ao cliente são cruciais, a transição para uma jornada reduzida não é apenas desafiadora, mas talvez inviável sem um apoio governamental robusto.

Os trabalhadores brasileiros sonham com isto. Mas lá, vivem como se fosse festa todos os dias dos anos. Talvez seja uma das nações com maior número de feriados e folgas no ano. Mas, o Brasil lá, Portugal, cá!

Sejamos claros: a ideia é louvável e merece ser explorada. No entanto, a mudança exige não apenas uma adaptação estrutural e fiscal, mas também uma transformação cultural sobre o valor do trabalho e as expectativas de produtividade. Em última análise, Portugal deve perguntar-se se está a tomar esta decisão com base em análises e estudos sólidos, ou se está simplesmente a seguir uma tendência europeia sem ter em conta a realidade e especificidade do seu mercado.

Gregório José