Está a vereda da Praia da Cana Vieira registada como tal?
Tem sido tópico de conversa nos últimos tempos, sobretudo entre as gentes de Santa Cruz, e mais ainda entre aqueles que usaram e ainda usam aquela vereda para aceder à praia localizada na freguesia do Caniço. Falamos da Vereda da Praia da Cana Vieira e da discussão suscitada pelo facto de o seu acesso, sempre tido como público, estar a ser, como o DIÁRIO deu conta em edições passadas, alvo de obras por parte de um privado.
Mas terá o burburinho razão de ser? Vejamos o que dizem as entidades competentes do município de Santa Cruz.
Em Junho de 2024, como se lê na acta da Assembleia de Freguesia do Caniço, o presidente desta entidade, Milton Teixeira, explicou que “a Vereda da Praia da Cana Vieira, a mesma tem toponímia, mas infelizmente não está registada como Vereda, muito embora reconheça sempre ter sido usada como acesso à praia e ao miradouro”.
Reunião na qual lamentou ainda que os anteriores governantes “não a tivessem registado como Vereda, referindo que, actualmente, este espaço serve de serventia privada entre duas casas contíguas, e que os proprietários das mesmas acordaram fazer obras naquele espaço”.
Na ocasião, o autarca comunicou aos presentes que a Direcção Regional do Ordenamento do Território (DROTe) e a Câmara Municipal de Santa Cruz estavam a averiguar a situação, “no sentido de encontrar uma solução para este caso e para outras veredas que se encontram, também, por registar”.
Mais recentemente, no passado dia 11 de Novembro, e em virtude da crescente insatisfação por parte da população, que entende que aquele acesso deveria continuar a ser de uso público, Milton Teixeira lembrou que há muito que o acesso se encontra interdito por não oferecer condições de segurança aos utilizadores.
“Foi encerrado [a 27 de Julho de 2018] após uma acção inspectiva das condições de segurança levada a cabo pela Junta de Freguesia do Caniço e pela Protecção Civil Municipal. Nesta visita foi notória a falta de segurança do acesso, colocando em risco todos aqueles que ali passavam para a praia. Estruturas de segurança (incluindo varandins) abandonadas há diversos anos e já sem possibilidade de sustentação da base das mesmas, piso escorregadio, quedas de pedras e diversas fendas de grande dimensão que, no entender dos especialistas da protecção civil, poderiam provocar a queda de pedras maiores, com todos os riscos de segurança que esta queda poderia acarretar. Acesso abandonado há anos”, informou, recorrendo à mesma página onde se fazem ‘ouvir’ estes reparos.
A 19 de Setembro de 2024, em reunião de câmara, coube ao vereador do PSD, Brício Araújo, dar voz à preocupação dos munícipes que queriam saber o que a autarquia de Santa Cruz pretendia para aquele espaço, mas as respostas não foram conclusivas, porque o município liderado por Filipe Sousa lembrou que ainda aguardavam, à data, os pareceres solicitados à DROTe e à Capitania.
“Na cadastral do Município, nem na Junta de Freguesia têm qualquer referência sobre a cedência ou não daquela área do domínio público. Não há nenhum registo em nenhuma das autarquias que ateste que aquele espaço é via pública”. Vereador Dúlio Freitas, na referida reunião
Depois, coube ao presidente do município de Santa Cruz lembrar que a questão ligada à vereda é da responsabilidade da Junta de Freguesia do Caniço, havendo, no entanto, a possibilidade de esta última vir a pedir uma expropriação. Mas também alertou que as decisões “não são tão lineares como possa parecer”.
Sobre esta possibilidade, referir que a servidão predial constitui a faculdade que o titular de um direito real sobre um determinado prédio (denominado prédio dominante) tem de utilizar um prédio alheio (denominado prédio serviente) para melhor aproveitamento do seu prédio. Os proprietários de prédios encravados podem exigir a constituição de uma servidão de passagem.
Existe ainda mais uma forma de criação da servidão de passagem, na falta de acordo entre as partes, que é a usucapião: de acordo com o art. 1.379 do Código Civil, “O exercício incontestado e contínuo de uma servidão aparente, por dez anos, nos termos do art. 1.242, autoriza o interessado a registá-la em seu nome no Registo de Imóveis, valendo-lhe como título a sentença que julgar consumado a usucapião”. Parágrafo único. Se o possuidor não tiver título, o prazo da usucapião será de vinte anos.
Ainda sobre a actual interdição, e até que se possa voltar a usufruir daquela vereda em segurança, são inúmeros comentários. Uns contra que se vede o espaço, desde sempre 'público', mas pedindo obras que o dotem de condições. Outros a favor, porque o proprietário, a se confirmar a legítima propriedade, “é livre” de fazer o que entender com o seu terreno.