Uma visão contra a corrente, uma oportunidade e um desafio
Há um livro de contos infantil de Sylvia Orthof com o título “Maria Vai com as Outras” que em termos gerais, conta:
...A ovelha Maria era mesmo uma Maria vai com as outras. Até o dia em que descobriu que cada um pode ter o seu próprio caminho e destino, basta querer!
Há alguns meses “en passant” fiz uma abordagem relativamente à Madeira ter ou não, excesso de Turismo ... Não gosto de abordar assuntos para os quais não estou preparado e que muito menos domino minimamente.
Então, prometi que me ia documentar e que voltava: - Cá estou, honrando a minha palavra!
Até eu, num momento ou noutro e falando com os meus botões, já pensei:
- Não são “camones” a mais...?
Debrucei-me sobre o assunto, informei-me e inquiri sobre o mesmo e cheguei à conclusão de que posso afirmar: - AINDA, NÃO SÃO!
Vejamos, não querendo ser demasiado exaustivo, o que me levou a esta conclusão:
Analisando os indicadores de pressão no território (definidos pela Organização Mundial de Turismo), que é calculado: - Intensidade turística = dormidas/ população residente, em 2022 (último ano para o qual existe disponibilidade de dados) e considerando dormidas por 1.000 habitantes a Madeira registou 29,5 mil dormidas.
Comparando com alguns destinos concorrentes e onde já aconteceram protestos, podemos ver diferenças significativas: - regiões espanholas das Baleares (52,9), Canárias (40,1), Menorca (58,8), Tenerife (33,8 mil), algumas com mais de 80% da nossa realidade.
Considerando outro dado que seria a Densidade turística = dormidas / Km2 podemos ver que a Madeira apresenta 10,1 mil dormidas por Km2, enquanto Malta registava o triplo (30,7), as Baleares (13,5 mil), Tenerife (16,8 mil) e Gran Canária (16,7).
Assinale-se, que os números actuais estão em linha com a tendência de valorização e crescimento do sector: - Dormidas a crescer 5% com o valor dos aposentos a crescer 10%.
Sempre mais valor e riqueza, do que quantidade, o que não deixa de ser muito positivo!
Do conjunto de indicadores observados retive e com satisfação, o excelente desempenho das Dormidas versus o Proveito dos aposentos. As dormidas de 2015 a 2023 cresceram 55% e os proveitos dos aposentos 117,6%, isto, com uma pandemia pelo meio e as incertezas das guerras que testemunhamos. Complementarmente, o RevPar, que é o rendimento por quarto disponível atingiu em agosto deste ano os 111,74 euros, que em relação ao ano de 2015 tinha sido de 39,28 euros; são praticamente mais duas vezes e meia.... É obra!
Vivemos uma época que tudo o que é notícia, comentário político, etc, tem de ser mau e negativo, o elogio tornou-se quase uma afronta, por isso e de forma disruptiva, tiro o meu chapéu a todo o sector do Turismo, desde o Secretário Regional e toda a sua equipa, Associação de Promoção, bem como a todo o sector privado associações, sindicatos, trabalhadores, patrões, etc., todas as actividades que directa ou indirectamente têm trabalhado e trabalham para esta realidade.
Mas, nas minhas buscas e recolha de elementos dei-me conta da dificuldade que é analisar o sector, começando por uma definição para TURISMO que seja geral e única, em suma universal. Não há. As análises da OMT (Organização Mundial de Turismo), são recolha de dados e estatísticas que comparam territórios, áreas do mesmo território, Regiões ou Países. Sentir-me-ia muito mais confortável se fosse definido um valor padrão, para poder saber e dizer se e quando, é demasiado ...!
Será necessário no futuro, muita sensibilidade e bom senso! Além de estratégia e planeamento ...!
Por exemplo, o número de quartos em alojamento local e o aumento exponencial de carros para Rent a Car está a ser monitorizado, acompanhado e estudado para ser devidamente regulado ...?
Mas,
A Madeira através dos nossos antepassados foi pioneira, daquilo que hoje se denomina “a indústria do Turismo”. Iniciou-se no século XV de modo incipiente, tendo a actividade ganho uma maior consistência a partir do século XVII; por outro lado com o desenvolvimento dos transportes e das novas tecnologias, o turismo transformou-se num dos mais importantes pilares e sustentáculos da economia global. Ele constitui, de facto, a força determinante e fundamental para o desenvolvimento de muitos países e regiões, sendo para nós madeirenses vital e o principal motor da actividade económica.
Ora, tudo isto traz-nos deveres e dá-nos uma responsabilidade na abordagem deste assunto e temática, obrigando-nos a ser muito cuidadosos e perspicazes na sua interpretação e gestão, sob pena de “matarmos a galinha dos ovos de ouro” ...
Por outro lado, isso, não impede que criemos um modelo de negócio interessante e lucrativo, que acrescente valor e riqueza, mas, que coexista bem com a nossa identidade e modelo de vida, continuando a permitir que nos sintamos na “nossa casa”, recebendo e convivendo com quem nos visita da melhor forma possível, obtendo todos, “eles” e “nós”, os maiores dividendos e ganhos da vivência e da experiência.
Paralelamente nos últimos meses, assistimos a um movimento que tem vindo a crescer de protestos contra o excesso de turismo, um pouco por toda a Europa; em cidades como Barcelona, Málaga, Atenas, Amesterdão e Veneza e em Regiões como nas Ilhas Canárias, tanto em Gran Canária, como em Tenerife. Já chegou a Lisboa.
Estamos a falar de “gente” que são directa ou indirectamente nossos concorrentes e que vivem, também, da actividade.
Movimentos como o Greenpeace, WWF, Ecologists in Action, Friends of the Earth, SEO/Birdlife, com cartazes por exemplo, a dizer: - “Turistas, respeitem a minha terra” ou “Fora” e “Voltem para casa”. Os principais motivos: - o efeito do Turismo no preço da habitação, as consequências negativas para o comércio local e para o ambiente, etc.
Infeliz e tristemente, não aparece ninguém, a indicar e a explicar quais as alternativas que pode haver sem o turismo, mesmo que baixe o preço das casas, como é que a maioria das pessoas as vai pagar e de que vai viver? Pergunto-me, donde virá o dinheiro?
Estes movimentos funcionam sempre da mesma forma, críticas, mais críticas e também “lutas” - mas, quanto a soluções? NADA, pagar as contas parece que deixa de ser necessário e importante, nunca apresentam a mínima saída. Pois, é sempre o Governo ... ou senão, os ricos que paguem a crise ...! Parece que acreditam que o dinheiro cai do céu!
Lembram-me um Tio meu, quando eu era pequeno e ainda acreditava no Pai Natal e pedia indiscriminadamente o possível e o impossível, e ele respondia-me, para eu atinar: - VAIS TERES ...!
Entretanto, cresci ...!
Aqui chegados e ao contrário desta gente, que funciona no modelo da ovelha Maria, no registo da “Maria vai com as outras”, proponho que sigamos o nosso próprio caminho, pois, para isso basta querer ...! Esta a minha VISÃO!
A OPORTUNIDADE, fantástica, do meu ponto de vista e ao contrário destes ingénuos e que andam ao sabor da maré, que não o querem, assumamos e contra a corrente, que queremos mais que nunca Turismo e turistas, mas, de qualidade, não de massas e com regras.
O DESAFIO transformemos a nossa Região e como conceito, no destino mais “FRIENDLY” para o Turismo do mundo, onde, são muito bem recebidos e reconhecidos. Já somos a melhor Ilha ...! Já recebemos bem, temos de saber “vender” o conceito e a nova imagem de marca. Aproveitemos para fazer este upgrade!
Vejam o resultado da Visão e planeamento durante a pandemia e a resposta que tivemos... Ao contrário do que por vezes parece e tem acontecido, o Governo, também tem feito coisas muito boas. Foi o caso e não custa reconhecê-lo!
Na Gestão, a oportunidade é: - crítica e determinante. O Comboio só passa 1 vez ...! O quarto de Hotel que não é ocupado hoje, lá se foi, não dá nem para colocar no frigorífico, muito menos para armazenar. Tomorrow is another day ...!
O DESAFIO, também, é a forma de lá chegar!
E aqui, temos de ser inteligentes, competentes e determinados.
Temos um destino com belezas soberbas, uma natureza luxuriante, um mar único, paisagens de cortar a respiração, com segurança e agora com o novo desígnio - “friendly” como nenhum outro... Um produto verdadeiramente de excelência e GOURMET!
Não será para todos e há que o assumir e informar, quem vem com a tenda para acampar nas serras, não nos serve, quem dorme no carro, não serve, quem não obedece às regras estabelecidas, não serve, nem interessa. E aqui, feito o benchmarking temos de ser, inflexíveis, na defesa do nosso produto. É um negócio para ganhar dinheiro e quem quer ou quiser usufruir do destino, tem de pagar ao nível do que estamos entregando e estão a receber; não há que ter medo ou vergonha disso. A “fair deal”!
Há que envolver todos os actores do sector, incluindo a população na criação do novo modelo e conceito, organizando-o e estabelecendo REGRAS, que terão de ser aplicadas e respeitadas de forma firme, com multas severas e a doer, para quem não as acatar e que poderão ir no limite à expulsão da Ilha, para os casos de incumprimento extremo.
Então, no Pico do Arieiro, Ponta de S. Lourenço e noutros locais, onde a pressão é excessiva, não há quem consiga organizar e ter mão no problema. Brincamos?
Metem-se barreiras de interdição a um determinado percurso por falta de segurança, há quem conscientemente não respeite, como temos visto na cascata dos Anjos, coloca-se a si e aos outros em situações de insegurança e risco (se morre alguém esmagado pelas pedras para “tirar uma selfie”, já pensaram nas consequências para o destino e para o negócio de que dependemos…?), e não acontece nada...
Temos sinais de proibição para idas ao mar, voluntária e de forma inconsciente vamos fazer snorkeling ignorando deliberadamente as determinações, grande alvoroço e aflição, colocação de vidas de outros em risco, empenhamento do helicóptero para o salvamento. Quais as consequências? Custos? Quem paga?
Alguns turistas têm uma actuação e comportamento, como se fossem “bananas” a mandar nisto. Não é a ideia que tenho das pessoas que estão à frente dos destinos do IFCN e muito menos da SRARN...
Mas, convenhamos que começa a ser tempo para de forma rápida, determinada e firme se começarem a organizar e a se fazerem respeitar. De momento, infelizmente, não é o que se vê, bem pelo contrário ...
Não temos um Parlamento Regional onde por proposta do Governo se podem aprovar leis que demonstrem o vigor e plenitude da nossa Autonomia? Esta apatia e demora, incomoda-me e envergonha-me muito como cidadão, provoca sentimentos de saturação e rejeição contra os visitantes e é péssimo para a imagem do destino. Não tenhamos dúvidas!
Alguém que na Suíça resolva atravessar onde não deve, passear meio nu na rua, ou cuspir no chão, não cumprindo com as REGRAS, verá, se apanhado, quanto custa ser incivilizado. E alguém deixa de ir à Suíça por causa disso? Respeita as regras, cumpre-as e publicita-as ...!
O Governo simultaneamente, tem de criar ainda mais condições para “proteger” os mais desfavorecidos e jovens na aquisição ou arrendamento de casa. É decisivo.
A criação de mais riqueza, permitirá, o retorno do investimento a ser feito e bem, na área social.
A população tem de sentir as vantagens e ganhos do “nosso” negócio. Tem de ser justo, equitativo e para todos, como prometem quando vamos votar...
Termino com um exemplo muito simples e que mostra que as ferramentas de gestão, bem aplicadas e de forma oportuna são determinantes para o sucesso ou o seu contrário.
Há muitos anos estive ligado a uma Cervejaria que no seu início e aos fins de semana, alguma “clientela” (???) partia e roubava, uma média de 250 canecas de cerveja, estamos a falar de 1000/mês. A sobrevivência do negócio, postos de trabalho, investimento, etc., passou a estar ameaçada e em risco ...
Detectado e analisado o problema, de forma célere, decidiu-se:
• Mudar o conceito para: - mais Restauração menos Bar
• Muito mais firmeza e atenção à segurança
• Subir substancialmente os preços
Limpou-se “aquela” clientela (?) e na época, salvou-se o negócio, transformando-o num grande sucesso!
Estou a falar da BEERHOUSE, que passados 30 anos ainda lá está, de há uns anos a esta parte, com nova Gerência e Gestão e que se transformou num ícone da Cidade! Continuem e bem hajam!