A crónica desvalorização dos salários e os indicadores de empobrecimento
No último trimestre de cada ano, o país assiste à entrega formal da proposta de orçamento de estado para o ano seguinte, o documento constitui uma previsão de despesas e receitas com o objetivo de definir as prioridades do governo e outros procedimentos, tais como dar a conhecer aos cidadãos o uso que será dado ao dinheiro público na alocação de recursos, no investimento de infraestruturas, na melhoria dos serviços públicos para além dos mecanismos utilizados no controlo do défice e da dívida pública.
Para todos os trabalhadores independentemente do setor de atividade a discussão do orçamento de estado assume particular relevância pela oportunidade que cria em discutir e negociar entre outras matérias as retribuições fixas e variáveis a vigorar para o ano subsequente. É comum confundir estes dois termos, nas retribuições fixas temos o salário que corresponde ao montante fixo que a entidade patronal tem de pagar ao trabalhador pela prestação dos seus serviços, ou seja o valor base acordado no contrato de trabalho. Esta parcela é paga geralmente em dinheiro e mensalmente, enquanto os montantes variáveis incluem todas as outras prestações que o trabalhador recebe pelo seu trabalho, como é exemplo as horas suplementares, prémios e outras prestações.
Passados sete anos do descongelamento das carreiras do setor público e do justo aumento anual do salário mínimo nacional, a ausência de progressividade no aumento dos salários acelera o risco de sermos um país de salários mínimos, em 2024 o indicador pobreza sendo uma realidade complexa e preocupante revela a persistência de profundas desigualdades sociais e dificuldades para muitas famílias.
É evidente o progressivo empobrecimento de quem trabalha, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística no ano 2020, a pobreza andava nos 19,8% da população portuguesa, mais de dois milhões de pessoas viviam abaixo do limiar de pobreza, ou seja, o conjunto de medidas adotadas foram insuficientes para recuperar salários e equilibrar os impactos negativos que a escalada inflacionista tem nas condições de vida dos cidadãos.
Dados mais recentes demonstram que o risco de pobreza ou exclusão social não para de aumentar, a taxa de risco de pobreza ou exclusão social em Portugal em 2024 está nos 21,3 % da população residente, o que significa que muitas pessoas mantêm um alto risco de pobreza, uma intensidade laboral muito reduzida e uma severa privação material e social que se traduz pela incapacidade de suportar pelo menos 5 de 13 itens considerados essenciais, como seja o aquecimento adequado, uma refeição de carne ou peixe de dois em dois dias, e a possibilidade de pagar uma semana de férias fora de casa entre outros itens.
Dos vários fatores que contribuem para a pobreza, estão os baixos salários, a precariedade laboral, o desemprego, as baixas pensões a dificuldade de acesso à habitação, assim como a discriminação social, atingindo principalmente as mulheres, os jovens adultos e pessoas de baixo nível educacional.
Quando decorre o debate político para fixar medidas no orçamento de estado e simultaneamente ocorrem negociações com os vários representantes dos diferentes setores profissionais, exige-se a adoção de medidas estruturantes por parte do governo que combatam a pobreza e a exclusão social, sendo fundamental continuar a acompanhar os indicadores de pobreza e a debater este problema social, de forma a encontrar soluções efetivas e sustentáveis que garantam uma vida digna para todos os cidadãos.