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O longo rio Dniepre | por Carlos Manuel Nogueira Fino

A Batalha do Dniepre, em 1943 - na Segunda Guerra Mundial, foi uma das maiores operações militares

Enquanto lia este livro, publicado em maio passado, imaginei as margens do rio Dniepre, na Ucrânia, com as pontes destruídas. Senti as suas cores e cheiros. Este rio é um dos maiores rios da Europa, com uma história estendida no tempo, que nasce na Rússia, atravessa a Bielorrússia e a Ucrânia, antes de desaguar no Mar Negro. Com cerca de 2.200 km de extensão, é o quarto maior rio da Europa e é agora, diz Carlos Manuel Nogueira Fino, um lugar de “pontes destruídas” num deserto “onde se contam cadáveres que vogam na corrente”.

A Batalha do Dniepre, em 1943 - na Segunda Guerra Mundial, foi uma das maiores operações militares, resultando na recaptura de Kiev pelos soviéticos. A história tende a se repetir: agora é a herança soviética que não dá tréguas e descanso aos ucranianos. Com o colapso da União Soviética em 1991, o longo Dniepre continuou a ser decisivo para a economia ucraniana e tem um significado ambiental importante. A relevância estratégica do rio é clara desde 2014, quando se deu a anexação da Crimeia pela Rússia. A cobiça intensificou-se em 2022 com a invasão em grande escala por parte da Rússia. Diz o autor do livro: “vi o Guterres na televisão ao lado do Lavrov| E percebi a essência da geopolítica. Não há esperança| E não há redenção”. “e agora diz-me o que farás da inocência| Estilhaçada pelas bombas| Tu que tinhas as armas descansadas e um lugar junto ao mar| Por onde vias entrar e sair os dias com a majestade dos navios”.

Teremos de aguardar pela paz, sabendo que qualquer “trégua de que nem se pode dizer que está podre| Porque só a paz apodrece”. “Se queres paz| (…) Este é o tempo decisivo| E tudo o que fizeres fá-lo-ás para sempre”. Pressupondo que se refere a mais do que a guerra, isto é, à possibilidade de se estar “em terra de ninguém”. Trata-se da coragem que responde à pergunta “ainda serei patriota?” e que sabe que só “quando saíres do abrigo estarás em terra de ninguém”. Apenas “se não assomares ao parapeito nunca saberás| De onde vem o tiro| Que te matará”. Das armas que chacinaram duas mil crianças, desde a invasão russa. O Inverno parece não acabar na Ucrânia.

Fico com a dúvida se o autor “repousa” sobre a glória dos guerreiros que assume na terceira pessoa. São eles e é ele que tem o “corpo retalhado| O sangue exposto e negro| Sob as pontes”. Numa introspeção de desentendimento, o autor encontra o “céu em convulsão” e direciona-se para aquilo que parece ser um sentimento de abandono: “tu já não és guerreiro”. É a sensação de esquecimento marcado pelo cansaço da desesperança.

O rio Dniepre é essa esperança “contra a solidão”| “não sei porque te digo isto| Mas às vezes os solilóquios terminam assim| Em coisas sem sentido| E o facto é que os meus segredos bem os pode sussurrar| o vento| Que não tem a menor importância”.

“afinal somos livres de fazer monstros e os deuses

À nossa semelhança”.

“E agora o quê Carlos (?)”

Obrigada, Professor.
Descobri o rio Dniepre em mim.