Trump "prospera" com desinformação que propaga
O especialista em direito eleitoral Bertrall Ross defende que o candidato republicano à Casa Branca, Donald Trump, "chegou ao patamar onde está agora" devido à desinformação que propaga diariamente e com a qual continua a "prosperar".
Ross, que é professor de direito na Universidade da Virgínia e diretor do 'Karsh Center for Law and Democracy', identifica uma polarização política cada vez maior nos Estados Unidos, lamentando que predomine no país a retórica do "nós contra eles".
"Não só não gostam das pessoas do outro partido, como desconfiam das pessoas do outro partido. E a desinformação acaba por prosperar em condições de extrema desconfiança. Instalou-se uma desconfiança tão profunda entre cidadãos de diferentes partidos que estamos dispostos a acreditar nas coisas negativas que ouvimos ou que são ditas sobre o outro partido ou mesmo sobre o processo eleitoral", observou, em entrevista à Lusa.
"As pessoas estão dispostas a acreditar nisso, especialmente quando o líder de um dos partidos, o ex-presidente Donald Trump, atiça as chamas dessa desinformação. Trump prospera com a campanha de desinformação, ele usa a desinformação para obter apoio dos eleitores. Essas mentiras e essa desinformação são algo que realmente o ajudou a chegar onde ele está agora", frisou Bertrall Ross.
A lista de falsas informações difundidas por Trump e pelos seus aliados é longa e a maioria delas é desmentida diariamente pela imprensa norte-americana ou por entidades competentes.
De acordo com a organização não-governamental (ONG) Repórteres sem Fronteiras (RSF), "a carreira política de Donald Trump foi em parte definida pela sua propensão a espalhar falsidades", tendo feito, ao longo de seu primeiro mandato presidencial, "mais de 30.000 declarações falsas ou enganosas, um volume de imprecisão sem igual na história americana", incluindo a negação repetida dos resultados eleitorais de 2020.
Desde que perdeu a eleição, Trump vem atacando e descredibilizando recorrentemente a votação pelo correio e amplificado alegações infundadas de fraude eleitoral, situação que gera desconfiança junto do eleitorado.
Na segunda-feira, duas urnas eleitorais foram incendiadas nas cidades norte-americanas de Portland e Vancouver e alguns boletins de voto acabaram destruídos. As autoridades descreveram o ato como direcionado e intencional.
Para Bertrall Ross, estes ataques são um sinal de uma democracia "corroída" e "em declínio".
"É realmente assustador ver que os votos que estavam nessas caixas agora incendiadas poderão não contar, a menos que essas pessoas sejam informadas de que as suas cédulas foram queimadas e votem novamente. Percebemos o quão corroída e em declínio está a nossa democracia quando vemos esses esforços para destruir boletins de voto", lamentou o professor universitário.
Ross acredita na possibilidade de que outros ataques e ações semelhantes se desenrolem até ao dia do sufrágio com o objetivo de "semear novamente mais desconfiança" sobre os resultados eleitorais e para "inflamar ainda mais a animosidade que os americanos têm uns pelos outros".
De acordo com o especialista, poderá ser difícil convencer o povo norte-americano de que os resultados são justos e legitimamente derivados da contagem dos votos quando as próprias urnas estão a ser incendiadas.
Por todo o país, funcionários eleitorais têm tentado tornar o processo eleitoral o mais transparente possível de forma a ganhar a confiança de todo o eleitorado.
Na prática, esses trabalhadores têm tentado esclarecer a população sobre o funcionamento do processo de votação, sobre como é que as máquinas eleitorais trabalham, como é que os votos são contados em diferentes centros eleitorais de todo o país, mas têm também explicado que as alegações de violação de integridade eleitoral podem ser ouvidas pelos tribunais.
Contudo, apesar de considerar que estes esforços explicativos são bem-intencionados, o docente admite que possam ser ineficazes, "porque a voz mais importante na sala para alguns eleitores continua a ser a de Donald Trump", que, por sua vez, "continua a mentir sobre a eleição e a sugerir que elas não são confiáveis".
Independentemente do vencedor, o especialista em direito eleitoral e direito constitucional acredita que os resultados serão contestados, estando apenas em aberto "a intensidade e a forma da contestação".
Bertrall Ross vê como cenário mais provável "uma resposta violenta" do lado republicano, à imagem do que aconteceu em 06 de janeiro de 2021, quando apoiantes de Trump invadiram violentamente o Capitólio norte-americano para tentar travar a certificação da vitória do atual Presidente, Joe Biden.
"Acho que haverá muitos eleitores de Trump que não estão dispostos a aceitar esses resultados [eventual vitória democrata], e então voltaremos ao lugar em que estávamos em 06 de janeiro de 2021. (...) Acho que muita dessa resposta vai depender do que Trump disser", assinalou.
"Se Trump sugerir ou insinuar que essas instituições merecem ser atacadas, então eu acho que os seus seguidores ouvirão o chamamento e nós estaremos potencialmente naquele lugar em que estávamos há quatro anos. Espero que isso não aconteça. Espero que as mentes mais frias prevaleçam", defendeu, em entrevista à Lusa.
As eleições estão marcadas para 05 de novembro e a maioria dos estados já iniciou o processo de voto antecipado e por correspondência.