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Irá o Estado recuperar o investimento feito no IRS Jovem?

Nesta altura ainda não sabemos qual a versão final do IRS Jovem que irá ser aprovada, assim como não sabemos mesmo se o Orçamento será aprovado, mas penso que é necessário não deixar de refletir sobre a medida e os problemas que a mesma levanta.

Muitos dos meus colegas economistas têm apresentado variadas razões para discordarem da medida, como sejam a discriminação pela idade, o carácter regressivo da medida, a possibilidade de os empregadores ajustarem os salários oferecidos, entre outras e com as quais concordo. No entanto, existem dois aspetos da medida não abordados que é importante considerar e que explico de seguida.

O primeiro aspeto é o facto de os jovens no primeiro ano de trabalho ficarem a receber um salário líquido que talvez nunca venham a voltar a receber na sua vida de trabalho. Se considerarmos a carreira de Docente Universitário que conheço bem, um jovem no princípio da carreira de Professor como Professor Auxiliar se não fizer descontos para o IRS (é provável que venha a fazer uma parte dado estar previsto um máximo ao rendimento anual não tributável) ficando só a fazer descontos para a Segurança Social terá um rendimento mensal líquido superior ao do Professor Catedrático (1º escalão) que desconta o IRS e a Segurança Social. Isto significa que no seu primeiro ano de trabalho vai viver melhor do que quase no final da carreira onde só menos de 10% dos Professores acedem durante a sua vida ativa (a título de exemplo, em 2023 o número de Catedráticos na Universidade da Madeira não chegava a 3% de todos os Professores).

Segundo aspeto é que as despesas de educação, como expliquei aos meus alunos durante muitos anos, devem ser vistas como um investimento que é suportado numa parte pelos estudantes e suas famílias e no restante pelo Estado. No caso do Ensino Superior as famílias pagam as propinas, os materiais escolares e as outras despesas pessoais do estudante e abdicam do rendimento que o estudante poderia ter se estivesse a trabalhar em vez de estudar, enquanto o Estado paga as transferências que faz para as Instituições funcionarem e para a Ação Social. A rendibilidade para as famílias vem dos salários mais elevados que os estudantes terão após terminarem os estudos (devido à sua maior produtividade) e a rendibilidade para o Estado vem dos impostos cobrados a mais sobre salários mais elevados. Ora, no caso de o estudante emigrar o Estado perde todo o investimento porque os impostos não serão cobrados por Portugal, por isso não compreendo a razão de o Estado, em vez de estar a tentar recuperar a parte do investimento que perde com os jovens que emigram, se satisfazer em diminuir a rendibilidade do investimento que fez nos que não emigram.

Só o futuro nos dirá qual o impacto do IRS Jovem na Economia. Até lá, os jovens que aproveitem bem esta benesse fiscal e não pensem muito de como será a vida quando tiverem que pagar IRS.