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Fact Check Madeira

Terá Pedro Fino dito algo de novo sobre a terceira fase do novo Hospital da Madeira?

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O secretário Regional de Equipamentos e Infra-estruturas esteve, na terça-feira, nas obras de construção do novo Hospital Central da Madeira (HCM), numa visita que contou com a presença do reitor da Universidade da Madeira.

Na ocasião, Pedro Fino disse que o concurso para a terceira fase do novo hospital deverá ser lançado até ao final deste ano. O governante também admitiu que a infra-estrutura venha a custar mais do que o previsto.

Quase de imediato, a partir do momento em que as palavras de Pedro Fino foram notícia, muitos foram os comentários em redes sociais e em blogues que se dizem informativos, primeiro com reparos sobre o prazo escolhido para o lançamento do concurso para a terceira fase e, segundo, pelo facto de Pedro Fino admitir um aumento do custo, o que foi lido como favorecimento aos empresários.

Terão razão os leitores que fizeram tais afirmações, encarando as declarações do Governante como novas, no que respeita ao prazo, e como indo no sentido de favorecimento dos empresários e das empresas?

A análise à veracidade dos comentários vai assentar em dois aspectos, independentes. Primeiro se há novidade no anúncio do fim deste ano, como prazo para lançar o concurso, e, segundo, se o aumento do custo do novo hospital resulta de favorecimentos reais ou potenciais a empresários, ainda que indefinidos.

Para verificarmos se há ou não novidade no anúncio do prazo para lançamento do concurso público para a terceira fase da obra, recorremos a um levantamento de notícias publicadas na comunicação social da Madeira sobre o assunto.

A primeira a apontar um mês específico como prazo foi publicada a 20 de Julho de 2023. Dizia que a terceira fase do hospital seria lançada até Dezembro. A afirmação do secretário regional das Finanças, Rogério Gouveia, referia-se a Dezembro do ano passado. Por isso, o novo prazo, agora vincado, já significa a prorrogação em um ano.

Além disso, em Março deste ano (2024) foram publicadas notícias, em pelo menos quatro órgãos de comunicação, incluindo o DIÁRIO, a dar voz a Miguel Albuquerque, que afirmava que a terceira fase do novo hospital seria lançada até ao final de 2024.

A 8 de Julho de 2024, desta feita por Rogério Gouveia, o Governo Regional reafirmou o propósito de lançar o concurso até ao final deste ano.

Como se pode verificar, o objectivo de lançar o concurso para a terceira fase do novo hospital até ao final deste ano não é novo, nem mesmo o é o anúncio dessa meta.

Vejamos, agora, a questão do aumento do custo da obra. Este tema impõe uma abordagem multifacetada.

Desde logo há a questão legal. Por regra, para haver aumento do preço de obras tem de haver obras a mais. As regras desse expediente constam do artigo 370º do Código dos Contratos Públicos (CCP) e definem os termos em que pode acontecer. O artigo 4º estabelece que “o valor dos trabalhos complementares não pode exceder, de forma acumulada, 50 % do preço contratual inicial.” Uma percentagem que já foi de 25%.

Mas, neste caso não se trata de uma alteração de preços, no sentido comum. É um pagamento pelo facto de o dono da obra pedir mais trabalhos.

Para haver revisão de preços (artigo 300.º do CCP) é preciso que “o contrato o determine e fixe os respectivos termos, nomeadamente o método de cálculo e a periodicidade”. Por regra, está indexado à evolução dos preços no mercado. A esmagadora maioria dos contratos de grandes obras sofre revisão de preços mensal. Na maior parte dos casos, a revisão é para cima, isto é, o contraente público tem de pagar mais, mas há casos em que acontece ao contrário.

O artigo 382.º dispõe sobre a “Revisão ordinária de preços” e diz: “1 - Sem prejuízo do disposto nos artigos 282.º, 300.º e 341.º, o preço fixado no contrato para os trabalhos de execução da obra é obrigatoriamente revisto nos termos contratualmente estabelecidos e de acordo com o disposto em lei. 2 - Na falta de estipulação contratual quanto à fórmula de revisão de preços, é aplicável a fórmula tipo estabelecida para obras da mesma natureza constante de lei.”

Ora, a Secretaria das Infra-estruturas costuma colocar em contrato as condições de revisão de preços e até a fórmula a adopar. “A revisão de preços contratuais, como consequência de alteração dos custos de mão-de-obra, de materiais ou de equipamentos de apoio durante a execução da empreitada, é efetuada nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 6/2004, de 6 de janeiro e no Decreto Legislativo Regional n.º 13/2004/M de 14 de julho”, podemos ler, num dos casos. Segue-se uma fórmula concreto.

Mas o artigo referido (300.º do CCP) prevê outras situações em que pode haver alteração de preços. “O cocontratante tem direito à reposição do equilíbrio financeiro, nos termos do artigo 282.º, quando: a) A alteração anormal e imprevisível das circunstâncias (…) seja imputável a decisão do contraente público (…); ou b) O contrato seja modificado por razões de interesse público (…). 2 - Os demais casos de alteração anormal e imprevisível das circunstâncias conferem direito à modificação do contrato ou a uma compensação financeira, segundo critérios de equidade” – artigo 314.º.

Nas parcerias público-privadas igualmente pode haver alteração de preços para ‘partilha de benefícios’, não previstos e que não sejam da responsabilidade/acção do cocontratante – artigo 341.º.

Também pode haver alteração de preços por trabalhos a menos – artigo 379.º.

Vejamos, agora, o caso concreto do HCM, a segunda fase, que é o que existe de real.

Foi adjudicada a 6 de Outubro de 2022 por 74.698.447,25 euros (74,7 milhões de euros). Neste momento (Agosto de 2024) tem o preço de 73.831.561,4 (73,8 milhões de euros). São menos 867 mil euros. Isso deve-se a várias revisões do preço (incrementos) como prorrogação dos prazos, trabalhos a menos e trabalhos complementares. Foram oito mexidas.

Também fizemos um levantamento aos contratos com incrementos, da responsabilidade da SREI, publicados no Portal da Contratação. Encontrámos cinco e em três o preço era inferior ao original.

Quando Pedro Fino falou num aumento do valor referia-se à próxima fase, a terceira. Fácil é perceber que, quando há vários anos, foi feita uma estimativa de valores – 350 milhões no global, a realidade socio-económica era diferente e os preços dos bens e serviços também. Hoje não se finaliza uma construção, qualquer que seja, pelos mesmos preços de há seis anos, nem a equipamos pelos mesmos valores. Num hospital, os equipamentos médicos, em especial, os pesados, como Ressonâncias, SPECT, PET, entre muitos outros, mudaram substancialmente de preço.

Pelo exposto e no caso concreto se conclui que é falso que Pedro Fino tenha anunciado algo de inédito na terça-feira ou que a alteração do valor a investir na terceira fase seja para beneficiar este ou aquele empresário.

“Adjudicam por baixo, depois alteram a obra para pagar mais aos empresários (no caso do novo Hospital Central da Madeira)” – Comentários no facebook