Há ou não mais emigração?
Os recentes números da população residente na Madeira permitiram saber que o saldo migratório, ou seja a proporção de pessoas a viver na Região Autónoma e a sair por tempo indeterminado face às que entram na Região e passam a residir cá, continua a ser positivo, foi até reforçado em 2023 e vai em seis anos a crescer. Também as estatísticas dos transportes aéreos permitem saber quantas pessoas desembarcaram nos aeroportos da Madeira e embarcaram nos aviões.
Mas será que isso é suficiente para sabermos, sem ter outra fonte fidedigna disponível, se há mais madeirenses e porto-santenses a sair da Região do que no passado recente?
Os números conhecidos a 4 de Outubro e divulgados tanto no online como no papel, referentes a 2023, mostram que não fosse o saldo migratório ser positivo e cada vez mais reforçado, a Madeira teria uma população residente em queda. Pelo contrário, praticamente desde 2018 está a crescer o saldo migratório (apenas uma quebra em 2021, quiçá muito por culpa da crise pandémica de covid-19 que influenciou as viagens), influenciando logo no ano seguinte a população residente, que cresce consecutivamente nos últimos cinco anos (2019-2023), também muito influenciado pelo bom desempenho da economia regional, embora também com peso negativo da inflação generalizada.
Assim, até ao ano passado, “a população residente na Região Autónoma da Madeira (RAM) foi estimada em 256.622 pessoas (120 996 homens e 135 626 mulheres), representando um acréscimo da população residente de 2.552 pessoas face a 2022”, referia a Direcção Regional de Estatística da Madeira. Em 2018, a população residente na Madeira ascendia a 250.397 pessoas, o número mais baixo desde 2001 (248.012), sendo certo que desde 2019 encetamos uma recuperação que resultou em apenas +2,4%, coincidindo esse período com o referido saldo migratório, cuja expressão maior deu-se em 2023 (+3.592 pessoas). É o saldo migratório mais alto de que há registo (desde 1981), sendo que o anterior máximo do saldo migratório positivo tinha sido em 2001 (+3.378 pessoas).
Assim, face a 2022 a taxa de crescimento efectivo em 2023 foi positiva em 10 pontos percentuais (+5,4‰ no ano anterior), quase duplicando o valor, “resultado de uma taxa de crescimento migratório positiva (14,1‰) que se sobrepôs à taxa de crescimento natural negativa (-4,1‰)”, recordamos o noticiado. Para piorar, e porque os jovens são os que mais emigram (e migram dentro do território português, nomeadamente para estudos, mas numa idade mais avançada), recordar que “a proporção de jovens (menos de 15 anos) voltou a diminuir, representando 12,2% da população total (12,5% em 2022)” e “a proporção de idosos (65 anos ou mais) manteve a tendência crescente dos últimos anos, atingindo 20,9% da população residente (20,5% em 2022)”, o que acaba por contribuir, de certa forma, para amenizar os índices migratórios.
Outro indicador que contribui para amenizar o número de madeirenses que possa eventualmente sair da Região para procurar uma vida melhor lá fora, é o número de estrangeiros. Como também já noticiámos, essa população tem crescido significativamente nos últimos nove anos, tendo crescido 147% em menos de uma década.
Estes dados ‘casam’ com o saldo migratório, mas apenas como complemento, não chegam a nos dar uma percepção de os madeirenses estão a emigrar mais recentemente.
Olhemos então para os números deste ano em termos de transportes aéreos, juntando a informação histórica de embarques e desembarques, fazendo daí a diferença para se saber se há algum indicador que ressalte à vista.
Curiosamente, sim, tem havido mais embarques para fora da Região do que desembarques nos aeroportos da Madeira e Porto Santo. Embora na ilha menor seja ainda mais difícil calcular, porque neste momento, além dos voos internos da Binter, há duas companhias a ligar a Lisboa e Porto, portanto podem muito bem ser porta de entrada e saída do Porto Santo sem passar pela ilha maior), foquemo-nos nos números gerais.
Além de extrair a possibilidade de alguns destes números se referirem a turistas, bem como muitos madeirenses (trabalhadores e estudantes) que entraram nos dias finais de 2023 e saíram da Madeira nos primeiros dias de 2024, é de realçar o saldo positivo de saídas (embarques) face a entradas (desembarques) para território continental e para o Reino Unido, em detrimento dos saldos negativos para o território alemão e francês, sendo estes os quatro destinos principais do turismo na Madeira. Ainda assim, podemos acreditar que muitos desses lugares eram de pessoas que saíam da Madeira para ir viver, trabalhar ou estudar.
Nos anos anteriores, o saldo geral é amplamente positivo para as saídas face às entradas, sendo que nos últimos 15 anos, apenas dois anos (2021 e 2022) foi registado um saldo negativo das entradas face às saídas. O maior registo acontecera em 2015 e o segundo maior registo ocorreu já este ano e ainda só temos dados até Agosto. Ou seja, este ano já houve mais embarques nos aviões do que desembarques ocorridos em 2023, por exemplo.
Olhemos então à emissão de passaportes, socorrendo-nos dos dados já noticiados, na qual só no ano passado a Região emitiu mais de 20 mil documentos essenciais para viajar para fora do espaço europeu. Um “forte crescimento” que “tem sido registado nos últimos anos”, é “justificado por factores ligados a fenómenos migratórios e ao turismo, bem como às dificuldades sentidas pelos emigrantes madeirenses na realização destes actos noutros postos emissores”. E ainda acrescentamos que “em 2022, ano em que se registou o valor mais elevado de sempre (22.089 passaportes emitidos), nos últimos anos”, um aumento que ocorre, sobretudo, a partir de 2020.
Contudo, com toda esta informação não é seguro afirmar que há um aumento da emigração madeirense. Simplesmente porque não há, efectivamente, um controlo de entradas e saídas, nomeadamente para o espaço Schengen.