OMS afirma que o seu acesso à Faixa de Gaza está "a diminuir"
A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou hoje que a sua capacidade para ajudar os habitantes de Gaza está "a diminuir", enquanto decorre uma "catástrofe humanitária" naquele território devastado pela guerra de Israel contra o movimento islamita palestiniano Hamas.
"Estamos a ver esta catástrofe humanitária desenrolar-se diante dos nossos olhos. Estamos a assistir ao colapso muito rápido do sistema de saúde", afirmou Sean Casey, um coordenador das equipas de emergência da OMS, por videoconferência a partir de Rafah, no sul da Faixa de Gaza.
O Exército israelita anunciou uma nova fase da sua intervenção em Gaza - lançada após o ataque de proporções sem precedentes do Hamas ao seu território, a 07 de outubro - com menos tropas e operações com alvos cirúrgicos.
Mas, segundo Casey, a OMS "não viu qualquer redução de intensidade" no terreno.
"O que nós continuamos a ver é um número enorme de vítimas dos combates, bem como ferimentos provocados por estilhaços, por balas, por esmagamento em edifícios que desabaram: isso continua a acontecer todos os dias", descreveu.
Apesar de uma resolução do Conselho de Segurança da ONU ter apelado, no mês passado, para o fornecimento de mais ajuda a Gaza, segundo a OMS, a situação só tem piorado.
"Assistimos a uma redução do acesso humanitário", sublinhou Casey, referindo que a OMS e outras agências especializadas das Nações Unidas "estão sempre a tentar chegar às zonas mais necessitadas".
"Todos os dias, formamos as nossas colunas, esperamos pela autorização e não a obtemos", lamentou.
"Então, regressamos e começamos de novo no dia seguinte", acrescentou.
A OMS não pôde visitar o norte da Faixa de Gaza nas últimas duas semanas e teve de cancelar seis missões planeadas.
A ajuda humanitária que consegue chegar ao território palestiniano é "pouquíssima" e "chega muito tarde", especialmente no norte, alertou o representante da OMS para os territórios palestinianos, Richard Peeperkorn.
O responsável afirmou que mesmo que não haja um cessar-fogo, "é esperado que os corredores humanitários funcionem de uma forma muito mais estável" do que o que atualmente se verifica.
Segundo Sean Casey, a assistência humanitária, e em particular a alimentar, "é extremamente necessária em toda a Faixa de Gaza", mas "a situação alimentar no norte é absolutamente terrível, quase não há alimentos disponíveis" e as pessoas suplicam às equipas da OMS por comida.
De acordo com a organização, só 15 dos 36 hospitais de Gaza estão a funcionar pelo menos parcialmente, a maioria dos quais no sul do enclave palestiniano sobrepovoado, pobre e agora destruído, 85% de cuja população (1,9 milhões de pessoas) se viu obrigada a deslocar-se devido à ofensiva israelita.
A OMS descreveu cenas de desespero nos poucos hospitais ainda em serviço no norte, onde faltam comida, água, medicamentos e combustível, e indicou que a situação está cada vez mais difícil também no centro e no sul do território.
"Os combates e as ordens de evacuação de bairros da zona central e de Khan Yunis (...) estão a impedir o acesso dos doentes e das ambulâncias aos hospitais e a tornar incrivelmente difícil para a OMS chegar a esses hospitais para os abastecer de víveres e combustível", declarou Richard Peeperkorn.
Falando a partir de Jerusalém, Peeperkorn alertou para o facto de a situação poder conduzir a uma "catástrofe" e ao encerramento de mais hospitais.
O Hospital Europeu de Gaza, o Centro Médico Nasser e o Hospital Al-Aqsa, no centro do território, que foram durante muito tempo os estabelecimentos que melhor funcionaram, estão agora perto das zonas de evacuação, sublinhou Casey.
"Não podemos perder estabelecimentos de saúde; eles têm absolutamente de ser preservados", defendeu.
O coordenador das equipas de emergência da OMS visitou no domingo o Hospital Al-Aqsa e verificou que centenas de doentes e cerca de 70% do pessoal tinham fugido enquanto os combates aumentavam na zona circundante.
Os restantes funcionários tentavam socorrer os doentes que se encontravam no chão manchado de sangue.
"Eram, na maioria, crianças com ferimentos de bala ou estilhaços, crianças que estavam a brincar na rua quando um prédio vizinho foi atingido", explicou Casey.
A 07 de outubro, combatentes do Movimento de Resistência Islâmica (Hamas) -- desde 2007 no poder na Faixa de Gaza e classificado como organização terrorista pelos Estados Unidos, a União Europeia e Israel -- realizaram em território israelita um ataque de proporções sem precedentes desde a criação do Estado de Israel, em 1948, fazendo 1.139 mortos, na maioria civis, segundo o mais recente balanço das autoridades israelitas, e cerca de 250 reféns, 127 dos quais permanecem em cativeiro.
Em retaliação, Israel declarou uma guerra para "erradicar" o Hamas, que começou por cortes ao abastecimento de comida, água, eletricidade e combustível na Faixa de Gaza e bombardeamentos diários, seguidos de uma ofensiva terrestre ao norte do território, que entretanto se estendeu ao sul.
A guerra entre Israel e o Hamas, que hoje entrou no 95.º dia e continua a ameaçar alastrar a toda a região do Médio Oriente, fez até agora na Faixa de Gaza pelo menos 23.084 mortos e quase 59.000 feridos, na maioria civis, de acordo com o último balanço das autoridades locais.