Depressão, o lado negro da força
Este ano começou pesado. Mais do que uma pessoa que conhecia decidiu tirar a própria vida, aliviando assim uma pressão que muito provavelmente se tornava a cada dia mais pesada e insustentável. Quando me ligaram a contar, a pergunta saiu-me de forma natural:” foi o bicho não foi?”. Em nenhum dos casos o terrível cancro que vai varrendo a nossa sociedade fez das suas. Tendemos a associar todas as mortes de forma prematura a essa doença, esquecendo-nos de que existe por aí outro bicho malvado que vai invadindo os nossos círculos e a que se dá o nome de depressão. Já por aqui falei dele mas com estes acontecimentos que marcam o principio de 2024 não havia como não voltar a esse lado negro a que todos estamos sujeitos e que é mais próximo e mais concreto do que por vezes imaginamos. As estatísticas dizem-nos que ocorrem cerca de 800 mil suicídios por ano. É uma das principais causas de morte em todo o mundo e estima-se que tentativas serão 25 vezes mais.
É absolutamente assustador o caos emocional em que vivemos. A pressão avassaladora que nos retira a respiração e o discernimento. Todos ou quase todos nós já tivemos em algum momento, situações que pensávamos não ter resolução, que pareciam becos sem saída, autênticos buracos de lucidez para onde somos remetidos pelas circunstancias da vida. À nossa volta, ao nosso lado, amigos, família, pessoas com quem trabalhamos, debatem-se com essa luta, assustadora e silenciosa, às vezes escondida por entre sorrisos falsos ou por uma aparente tranquilidade. No final do dia, quando a luz se apaga e pensamos no que temos pela frente, tantas vezes nos apetece desistir. Não os condeno nem os culpo. Não sabemos o que vai na cabeça dos outros nem a capacidade de cada um para enfrentar determinadas situações. Nem penso que seja egoísmo da parte de quem comete suicídio, é apenas a única alternativa perante um quadro de sofrimento solitário que acaba por se tornar num fardo com peso a mais.
Existem muitas e diferentes razões para que isso aconteça. Frustrações pessoais, sonhos desfeitos, traições, problemas financeiros ou algumas substancias como as drogas sintéticas podem levar a um estado de desequilíbrio mental que nos levam para atitudes desesperadas. No caso das drogas basta ver os vídeos nas ruas dos Estados Unidos em que o consumo de Fetanil transforma os consumidores em autênticos zombies, para se perceber o que determinadas substancias podem fazer a quem as consome. Mas é sobretudo uma sociedade que pouco espaço dá a falhanços, que tem pouca ou nenhuma sensibilidade para perdoar ou reabilitar, que não sabe desculpar e que aponta o dedo ao mínimo percalço, a grande culpada do estado das coisas. Uma sociedade que julga sem factos, que ofende só por gozo e inveja e que não pára de exigir mais e mais e mais…
Não auguro nada de bom para o que aí vem. Gerações de crianças que aprendem a dar mais valor ao dinheiro do que ao amor, que são ensinadas em casa na base do que é material ao invés do respeito e dos valores e na escola de que as casas de banho são iguais para todos e que têm o direito de se sentir num dia menino no outro menina ou até um pónei no dia a seguir que está tudo bem. Mentes baralhadas e confundidas. Basta olhar para as pessoas que se aplicam em mostrar nas redes sociais que praticam yoga, coaching e que valorizam a natureza e ver depois o seu comportamento no dia a dia. Não são só as noticias que podem ser “fake”, são muitas das vidas que vemos por aí. É esse vazio que enquanto sociedade teremos que resolver. Comunicar mais, falarmos dos nossos problemas mas acima de tudo construirmos uma sociedade que os saiba ouvir e que os aceite. Será esse o desafio.