À justiça o que é da justiça, ao jornalismo o que é do jornalismo
Qual é a intenção da nossa comunicação? Influenciar? Manipular? Julgar? Informar? À justiça o que é da justiça. Ao jornalismo o que é do jornalismo. Não é o que se diz, é a tonalidade, a forma e a intenção com que se diz! E há crianças a ouvir.
“E se os meus filhos ouvissem isto sobre mim?” é esta a principal pergunta que me coloco sempre que tenho de fazer diretos e reportagens, sobretudo sobre alguém que passou a ser suspeito, que foi detido ou que foi constituído arguido. Nos momentos mais desafiantes, pessoais e profissionais, costumo ser salva pelas minhas intenções bem definidas - até porque as intenções postas em palavras têm um poder mágico. Segue-se a prática de uma comunicação não violenta, ou consciente. É essencial percebermos todos, que a forma como comunicamos tem um impacto emocional inquestionável, no próximo. Nas crianças, tem mesmo um impacto significativo no seu desenvolvimento, isto de acordo com os estudos partilhados na obra “Meta-emotion: How families communicate emotionally”. Sabe-se, por exemplo, que a comunicação emocional empática e positiva, entre pais e filhos, está diretamente ligada ao crescimento emocional e social saudável das crianças. Mas isto é válido para adultos, também, ainda que noutras proporções.
O filósofo J. Krishnamurti disse um dia que “observar sem avaliar é a forma mais elevada de inteligência humana.” Parece-me que nós, jornalistas, temos uma responsabilidade acrescida neste caminho. Temos mesmo de ser exemplo de uma comunicação não violenta e consciente. Isso pressupõe escutar, ler e informar sem condicionar a informação com julgamentos pessoais, ainda que subtis. É que, ainda que inconscientemente, podemos estar a julgar intenções sem conhecer as reais intenções de quem criticamos. E depois, as nossas emoções podem estar a interferir com a critica e claro, a distorcer a razão.
Reconheço a dificuldade que existe, tantas vezes, em fazer observações isentas de julgamento, críticas ou outras formas de análise sobre pessoas e os seus comportamentos. Só que o comportamento não é a pessoa. E a pessoa, tem família. Se nos focarmos apenas no comportamento deixamos de ver a pessoa. Deixamos de lado a nossa humanidade. Portanto, aceder a um lugar de empatia e compaixão antes de informar ajuda-nos a ligarmo-nos aos outros e a nós mesmos, cria pontes e esclarece sobre os temas. É da responsabilidade individual de cada jornalista estabelecer conexão e demonstrar empatia e compreensão nas interações com os demais, sejam ou não suspeitos, estejam livres ou detidos, sejam ou não arguidos. É assim que construímos ambientes seguros para que todos possam expressar as suas opiniões, necessidades, desejos e emoções e desenvolvam competências sociais essenciais, naquele momento. A comunicação emocional adequada fortalece os laços. Sejam eles quais forem. Melhora o ambiente em geral, porque promove um desenvolvimento emocional mais saudável. Algo que precisamos mesmo no nosso mundo atual, acho eu.
Considero ser mesmo essencial estar atento às condições, às circunstâncias em que ocorrem certas trocas de palavras. Isso e a tonalidade com que as empregamos. Praticar a compaixão implica afastar-se de juízos de carácter moral. Marshal Rosenberg, o pai da comunicação não violenta, explica muito bem este processo.
A observação é entendida como um momento em que colocamos em prática a suspensão do julgamento, permitindo uma atenção ao contexto da situação ou da pessoa. Como é que se observa sem julgar? Uma observação com avaliação é dizer “tu és demasiado generoso”. Já uma observação sem avaliação passa por dizer: “Quando te vejo a dar o teu dinheiro para pagar o almoço a outras pessoas, eu penso que estás a ser demasiado generoso.”
Não leve os seus pensamentos tão a sério.
Depois de observar, sem avaliar, vem o sentimento. O que sentimos quando observamos aquela ação? É algo que nos assusta? Algo que nos irrita? Algo que nos deixa felizes? Como é que nos relacionamos com isso?
É que quando falamos de alguém, ainda que na pele de um jornalista, estamos quase sempre a falar muito mais sobre nós do que sobre o outro.