Defesa de iraquianos condenados por terrorismo criticam postura do Ministério Público
A defesa dos iraquianos condenados na quinta-feira a 16 e 10 anos de prisão criticaram hoje o Ministério Público (MP) por recorrer da sentença e por estar a utilizar estes arguidos como "bodes expiatórios do terrorismo internacional".
"Estes arguidos acabaram por servir de bodes expiatórios do terrorismo internacional (DAESH) e as suas acusações/pronuncias/condenações de um exemplo - objectivo e preocupante - de vassalagem das entidades judiciárias portuguesas (PJ, MP, tribunal) às congéneres europeias, norte-americanas e ONU", refere um comunicado da defesa dos arguidos Ammar e Yaser Ameen enviado à agência Lusa pelo advogado Lopes Guerreiro.
Confrontados com a pretensão do MP de interpor recurso da decisão proferida pelo Juízo Central Criminal de Lisboa, a defesa de Ammar e Yaser alega que estes arguidos foram, "à revelia da verdade, da prova e das suas existências, usados de forma que as entidades judiciárias portuguesas - PJ, MP, tribunal - possam também elas dizer às congéneres internacionais que de facto sofreram e sofrem com essa problemática, que reprimem de modo sério e pesado o terrorismo internacional, que nunca vivenciaram".
Tudo isto - acrescentam - "quando, todavia, a história recente de Portugal ensina e relembra que o terrorismo interno - aquele que verdadeiramente flagelou Portugal até ao presente, FP-25 de Abril - foi, em certa medida, tolerado, abafado, levemente sancionado e até amnistiado sem que essas mesmas entidades houvessem refutado o que quer que fosse".
Para os advogados de Ammar e Yaser, as entidades judiciárias portuguesas, "sobretudo o MP português, preocupam-se mais com o 'quintal do vizinho' do que, verdadeiramente, com o seu (quintal)".
"Este é um processo de íntimas convicções em que a condenação dos arguidos Ammar e Yasser Ameen serviu, exclusivamente, os propósitos persecutórios do MP. Razão pela qual se irá - até que a lei o permita e o Direito consinta - recorrer destas injustas condenações" de Ammar e Yaser, concluem os causídicos.
O MP anunciou já que vai recorrer do acórdão que condenou na quinta-feira os iraquianos Ammar e Yaser a 16 e 10 anos de prisão, respetivamente, por adesão a organização terrorista, sendo que o primeiro foi ainda condenado por um crime de guerra (no Iraque) e por um crime de ameaça (em Portugal).
O MP assinala que o tribunal considerou provado que os dois irmãos eram "membros do Estado Islâmico, mais precisamente da Polícia Religiosa Al Hisbah e do Serviço de Informações Al Amniyah", mas não se conforma com as penas aplicadas, depois de ter pedido em alegações finais condenações próximas da pena máxima de 25 anos de prisão.
"O MP vai interpor recurso do acórdão", refere um comunicado do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), que destaca a "primeira condenação em Portugal" pela prática de crime de guerra (no Iraque).
Os dois irmãos foram ainda condenados à pena acessória de expulsão de Portugal.
Cabe agora aos advogados contestar a sua execução, uma vez que Portugal não extradita arguidos para países em que se aplica a pena de morte, como é o caso do Iraque.
Os arguidos alegaram estar inocentes e os seus advogados vão recorrer da condenação para o Tribunal da Relação de Lisboa.
Em causa esteve a ligação dos arguidos ao grupo extremista do Estado Islâmico e os atos praticados por estes dois muçulmanos sunitas quando ambos viveram em Mossul, uma das muitas cidades do Iraque que chegou a estar ocupada pelo movimento radical.
Tendo chegado a Portugal em março de 2017, vindos da Grécia, ao abrigo do programa de recolocação refugiados da União Europeia (UE), Ammar e Yaser estão em prisão preventiva desde setembro de 2021, quando foram detidos pela Polícia Judiciária.
No inquérito do DCIAP foi investigada a atividade dos arguidos enquanto membros do autoproclamado Estado Islâmico durante a ocupação do Iraque por essa organização terrorista, designadamente entre 2014 e 2016.