Sociólogo diz que região vive cenário de "prosperidade ambivalente"
A Madeira está a viver um clima de "prosperidade ambivalente", marcado pelo dinamismo dos setores do turismo e do imobiliário, mas também problemas demográficos e falta de habitação, segundo o sociólogo Ricardo Fabrício Rodrigues.
O professor da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade da Madeira, doutorado em Sociologia Económica e das Organizações, falou à Lusa numa análise ao estado da região no final de mais uma legislatura, com eleições no arquipélago marcadas para o dia 24.
"Neste final de ciclo, em termos muito gerais, vejo a Região Autónoma da Madeira enredada numa prosperidade ambivalente", declarou, acrescentando que "se por um lado é evidente o dinamismo gerado pelas atividades turísticas e imobiliárias, por outro lado são notórios os problemas que se podem relacionar com esses mesmos dinamismos".
No seu entender, apesar de estes setores terem "impactos positivos na situação social da Madeira, gerando empregos e riqueza em termos gerais, simultaneamente, revelam desequilíbrios demográficos e habitacionais muito sérios".
"A vitalidade do fenómeno turístico e imobiliário não pode tornar-se incompreensível ou insuportável para o quotidiano dos residentes", sublinhou.
O turismo é um dos principais setores da Região Autónoma da Madeira, tendo gerado proveitos na ordem dos 528,8 milhões de euros em 2022, um valor recorde, num ano que fechou com um total de 9,6 milhões de dormidas, o maior de sempre.
O arquipélago mantém-se -- a par do Algarve e das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto -- entre as zonas com os mais elevados preços de casas no país, com um valor mediano da habitação de 1.571 euros/metro quadrado no ano passado (acima do preço mediano de 1.484 euros/metro quadrado no país), segundo o Instituto Nacional de Estatística.
Se a legislatura que agora termina ficou marcada pela superação da pandemia de covid-19, pelo aumento da atratividade do arquipélago no exterior e ainda pelo impacto da guerra na Ucrânia, Ricardo Fabrício Rodrigues crê que, em relação ao futuro, as expectativas estão focadas na melhoria dos empregos e dos rendimentos, sem os quais se corre o risco de acentuar as assimetrias internas.
"Até pode parecer que estes são acontecimentos já distantes no tempo, mas a verdade é que o segundo trimestre de 2020 ficará para a História como um período absolutamente delicado e com consequências (aumento das taxas de juro, por exemplo) que resvalam para tudo o que aconteceu depois", referiu.
A guerra na Ucrânia foi um acelerador para os fluxos turísticos das ilhas do Atlântico -- quando há conflitos e tensões no Norte de África e no Leste, indicou o sociólogo, a Madeira sai beneficiada neste setor, um padrão verificado desde as guerras do Iraque.
Para o docente, o maior desafio que se coloca à Madeira é "garantir sustentabilidade para quando este padrão se alterar, porque ele vai alterar-se".
"Obviamente que qualquer alteração na forma de conduzir o destino da região dependerá dos próximos resultados eleitorais, se haverá ou não uma maioria, mas é-me difícil vislumbrar a descontinuidade da prosperidade ambivalente que para já está em curso", observou.
Sobre os desafios para os governantes após as eleições regionais, o sociólogo enfatizou que devem ser apostas prioritárias "a melhoria e o reforço das competências do capital humano da Região Autónoma da Madeira, num cenário de forte compromisso com a sustentabilidade dos recursos e das atividades" do arquipélago.
Neste contexto, insistiu, os aumentos dos fluxos turísticos "não podem tornar a vida dos locais num inferno" e "a Madeira não pode tornar-se numa Riviera, destinada apenas para endinheirados provenientes do exterior".
O arquipélago, disse Ricardo Fabrício Rodrigues, tem de saber cativar e reter as diferentes gerações, em particular para as mais novas: "Sem vitalidade geracional dificilmente haverá pela frente um grande futuro."
Treze candidaturas, correspondentes a duas coligações e outros 11 partidos, foram validadas para as regionais do dia 24, na qual serão disputados, num círculo único, os 47 lugares do parlamento madeirense.
Em 2019, o PSD perdeu pela primeira vez a maioria absoluta, que detinha desde 1976, e elegeu 21 deputados, formando um governo de coligação com o CDS-PP (três deputados). O PS elegeu 19 deputados, o JPP três e o PCP um.