Acendam a luz
O meu pai contava que, na Camacha, por volta da década de 30 do século passado, as crianças pobres, quando avistavam, à noite, ao longe, na rocha de Gaula, luzes que se moviam, ficavam assustadas, pois achavam que eram “almas do outro mundo”. Não havia a cobertura elétrica pública que atualmente assegura iluminação em todos os cantos. A verdade é que aquela gente não tinha sequer eletricidade em casa, apenas os candeeiros a petróleo, e quase tudo era escuro e, naturalmente, desconhecido. E as crianças humildes daquele mundo rural encontravam no transcendente as explicações imediatas para as suas dúvidas puras que alimentavam os seus medos. O meu pai trazia-me esta lembrança real para mostrar que o desconhecimento leva a respostas precipitadas e a medos infundados, mas aquele era um desconhecimento legítimo de criança, num contexto rural específico, que recordávamos com um certo carinho.