No ‘Melhor Destino Insular da Europa’ cai a nódoa. E do nada emerge o improviso, o mesmo que garante lugares e favores, acordos e horrores, mas que mancha a credibilidade política, a democracia genuína e a vontade da maioria do eleitorado. Tudo está a ser feito de forma atabalhoada para que, no essencial, pouco mude. Vale quase tudo nesta era dos ‘nove fora nada’. Muito daquele que será o futuro colectivo na Região tem vindo a ser tratado ‘às três pancadas’, ora ditado de forma presencial pelos excursionistas das centrais políticas nacionais que, na ânsia de ensaiar vitórias que lhes faltam, se prestam à humilhação sem escrúpulos da Autonomia; ora patrocinado pelos apetites vorazes de influenciadores cujo único compromisso de serviço com a população assenta na satisfação da rede clientelar habitual e na garantira de tachos a quem lhes alimenta sonhos e outros voos; ora tolerado por quem faz tábua rasa de propósitos, que mesmo inábeis e chantagistas, apontavam para um desfecho bem diferente da “fossadinha” em curso. Num processo assombrado pelo palavreado fútil, pelo insulto às tradições e bons costumes e pela estabilidade precária, não faltam elogios ao duvidoso mérito das partes, algumas sem provas dadas; raros reparos ao facilitismo na hora de não honrar a palavra dada; e até execráveis manobras de depuração partidária.

Neste cenário improvável nasce, de barriga aberta e sem choro, um entendimento indolor de incidência parlamentar, que abriga nas mesmas hostes PSD, CDS e PAN, que sendo necessário para que haja governo, assenta numa base frágil e imatura. É certo que em teoria o acordo tem a virtude de recentrar a vida política regional na outrora ‘casa de loucos’. E na prática? Saberão todos os eleitos negociar as derivações das grandes causas e actuar de olhos postos naqueles que os elegeram? Estarão conscientes que as traições de qualquer espécie têm custos no quotidiano de cada eleitor e também já no próximo sufrágio? Escrutinarão de forma contínua e pedagógica a governação de modo a que o que foi prometido tendo em vista a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos não seja uma miragem? Saberão intervir sem medos, nem bajulações, trazendo para cada problema, soluções viáveis em tempo útil?

Os primeiros sinais do evento alusivo à manobra de desenrasque democrático que levou Miguel Albuquerque a dar o dito pelo não dito aconselham a prudência redobrada. O acordo foi despachado sem ter todas as nuances contempladas, ficando por isso a dever à transparência, sem que se conheçam as eventuais benesses deste decorrentes e, pasme-se, sem estar legitimado pelos partidos envolvidos, como mandam os estatutos de cada uma das partes desta inédita trilogia. O governo anunciado nos meios de comunicação social não tem até hoje qualquer suporte básico oficial, nem muito menos a assinatura de quem manda. A presidência da Assembleia é dada como certa a José Manuel Rodrigues mesmo antes dos 47 deputados manifestarem, por voto secreto, o seu veredicto.

A pressa tem dispensado de forma leviana a reflexão séria que se impõe. Na maioria e também em alguma oposição, mas sobretudo no seio dos partidos que têm mais responsabilidades no xadrez político regional. Urge que alguém trave a alucinação instalada e o embevecimento resultantes do plano de boas intenções do PAN, assente em princípios óbvios, mas pouco fracturantes. Isto de modo a que o PSD perceba que a arrogância de alguns dos seus dirigentes não inverte a tendência de descida; que a determinação interiorizada de dividir para reinar já não colhe; que campanhas com comunicação rudimentar são ineficazes; que não havendo um alvo predilecto a dispersão de votos é inevitável; que os 15 mil jovens recenseados desde 2019 ou não foram votar ou optaram por outras opções à direita, já que, mesmo sendo competentes, não se sentem convocados para o banquete regional e são obrigados a emigrar. E já constataram que os resultados nos bastiões social-democratas confirmam a sondagem de Novembro que dava conta que o PSD valia mais sozinho do que acompanhado do CDS? Acham que o eleitorado, mesmo o mais dependente, se contenta com migalhas? E os centristas já deram conta que nas Europeias do próximo ano vão confrontar-se com a dura realidade de saber quanto valem realmente nas urnas? Venham daí comissões políticas, conselhos regionais e congressos.