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Novo patriarca de Lisboa diz que "na Igreja todos têm lugar" e assume compromisso com paz

Foto Rita Chantre/Global Imagens
Foto Rita Chantre/Global Imagens

O novo patriarca de Lisboa defendeu hoje que "na Igreja todos têm lugar", disse querer ver os frutos da Jornada Mundial da Juventude em "ação" e falou do "compromisso sério" da Igreja na busca da paz, nomeadamente na Ucrânia.

Estes foram alguns dos pontos da homilia do novo patriarca Rui Valério, na entrada solene no Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, cerimónia que contou com a presença do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, do presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, do antigo presidente da República, Cavaco Silva, bem como de altos representantes do governo, da Assembleia da República, das Forças Armadas e da sociedade civil e religiosa.

Reconhecendo iniciar uma "nova etapa" da Igreja e sublinhando a importância e o significado da realização da última Jornada Mundial da Juventude (JMJ) em Lisboa, que ficou como um "marco" da fé, da esperança e do entusiasmo dos jovens, o patriarca pediu uma igreja de "proximidade" e de relação com o próximo. Citou a propósito Fernando Pessoa, ao dizer "Viver é ser o outro" (Livro do Desassossego por Bernardo Soares).

Nesta entrada solene do 18º patriarca de Lisboa, Rui Valério aludiu ainda à questão dos abusos sexuais e à guerra da Ucrânia, lembrando sobre este último assunto que o papa Francisco já comparou o conflito à III Guerra Mundial, sendo preciso procurar a paz.

"A Igreja de Lisboa tem tido um compromisso sério com a paz", acentuou o patriarca, apelando à colaboração entre a Igreja, o Estado, as Forças Armadas e de toda a sociedade no sentido de implementar o convívio entre as instituições e a procura da paz.

Dirigindo-se aos jovens, e tendo presente as últimas JMJ, Rui Valério referiu que a Igreja "necessita da autenticidade dos jovens" e de garantir a "proximidade" aos "pobres, aos sem voz e aos excluídos", bem como a "todos os imigrantes, aos sem tecto e aos vulneráveis".

A cerimónia no Mosteiro dos Jerónimos, que durou cerca de duas horas, juntou no seu interior muitos acólitos, bispos e outras figuras próximas da Igreja, enquanto no exterior também se juntaram muitas pessoas, incluindo turistas que se quiseram inteirar do que estava a acontecer dentro da obra-prima da arquitectura portuguesa do século XVI que é o Mosteiro dos Jerónimos.

No final, o patriarca, que na segunda-feira é recebido em Belém por Marcelo Rebelo de Sousa, cumpriu a tradicional cerimónia de cumprimentos aos presentes, fazendo transmitir aos jornalistas que não ia prestar declarações.

Isto depois de, na véspera, Rui Valério ter saudado as vítimas "de todo o tipo de abusos", a quem transmitiu solidariedade ao discursar na cerimónia da sua posse.

"Saúdo todas as vítimas de todos os tipos de abuso. Não repito palavras já esmorecidas pelo uso, mas dou-vos e darei sempre solidariedade, a minha presença constante de proximidade. Convosco carregarei o fardo do vosso sofrimento, acreditando na cura e na redenção", disse então o prelado após tomar posse hoje na Sé Patriarcal de Lisboa, perante o Cabido da Sé, ou colégio dos consultores.

Rui Valério, que trabalhou durante vários anos como padre no Patriarcado, sucedeu a Manuel Clemente, a quem agradeceu "a dádiva da sua amizade e o marco evangelizador que imprimiu na diocese".

O Vaticano anunciou, em 10 de agosto, a nomeação do bispo das Forças Armadas e das Forças de Segurança como novo patriarca de Lisboa.

A posse de Rui Valério acontece no ano em que a Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais Contra as Crianças na Igreja Católica Portuguesa validou 512 dos 564 testemunhos recebidos, apontando, por extrapolação, para um número mínimo de vítimas da ordem das 4.815.

Estes testemunhos referem-se a casos ocorridos entre 1950 e 2022, período abrangido pelo trabalho da comissão, cujos dados foram divulgados em fevereiro.

No próprio dia do anúncio da sua nomeação, Rui Valério deixou uma palavra às vítimas de abusos por membros da Igreja, assegurando que partilha da sua dor e está apostado na "tolerância zero" preconizada pelo Papa Francisco para estes casos.

Na primeira mensagem que dirigiu aos fiéis do Patriarcado de Lisboa, o então bispo das Forças Armadas e das Forças de Segurança deixou vincada a sua preocupação com os casos de abuso na Igreja, que, na missa crismal deste ano, perante os capelães militares, qualificou como "um autêntico murro no estômago" perpetrado por "indignos membros da Igreja".

O novo patriarca tem 58 anos e é natural de Urqueira, no concelho de Ourém. Foi ordenado padre em 1991, em Fátima, e tornou-se no 18.º patriarca de Lisboa.

Pertencente aos Missionários Monfortinos, foi o primeiro padre português daquela congregação a ser ordenado bispo.

Manuel Clemente, que esteve à frente do Patriarcado de Lisboa nos últimos 10 anos, completou 75 anos no dia 16 de julho, idade prevista para a apresentação da renúncia ao lugar de titular da diocese.