Será que a abstenção na Madeira está inflacionada como afirmam Albuquerque e Ireneu Barreto?
Na ressaca dos resultados eleitorais, várias personalidades, ao abordarem os valores da abstenção, disseram que os mesmos estão inflacionados e que as percentagens reais são bem abaixo das oficiais. Miguel Albuquerque, presidente do PSD e do Governo Regional, e Ireneu Barreto, Representante da República para a Madeira, foram duas delas. Mas estarão os números da abstenção tão inflacionados como nos querem fazer crer?
Vejamos o que afirmou Ireneu Barreto à Antena1 Madeira. “O número que aparece (da abstenção) é 46,7%. Esse número não é real, no sentido de que nossas listas de eleitores são quase iguais às listas dos residentes, o que é manifestamente impossível, porque há, pelo menos, uma quantidade de população que não vota. (São) todos aqueles que têm menos de 18 anos”.
O Representante da República para a Madeira estimava haver uma inflação de “pelo menos” 20% face à realidade.
Também Miguel Albuquerque, no dia das eleições, por mais do que uma vez, considerou haver uma boa afluência às urnas, porque os números da abstenção seriam um “falso indicador”, devido à “população flutuante”.
Será que o presidente do Governo Regional e o Representante da República têm razão ao considerarem que a inflação real é bem menor do que a oficial?
Comecemos por ver qual é a população residente na Madeira. De acordo com os dados da DREM – Direcção Regional de Estatística da Madeira, em 2022, residiam na Região 253.259 pessoas. Destas, 215.505 são residentes com mais de 18 anos, idade mínima para ter direito a voto.
Por outro lado, os cadernos eleitorais, nas eleições de domingo, tiveram, 253.865 eleitores.
Há, desde logo, duas impossibilidades estatísticas: o número de eleitores não pode ser maior do que o número de residentes, pois ser residente é condição para se ter direito a voto; e, segundo, também não pode ser maior do que o número de cidadãos com mais de 18 anos.
Ora, o número de inscritos nos cadernos eleitorais supera o de residentes em seis centenas e o número de pessoas com direito a voto em 38.360. Este pode ser considerado o número de eleitores-fantasma.
Assim, o apuramento da abstenção real deve de ser feito verificando as percentagens de residentes com mais de 18 anos, que exerceu ou não o direito de voto. Na verdade, os 135.413 votantes representam 62,84% os residentes no arquipélago com direito de voto. Os restantes 37,16% compõem a percentagem real de abstenção.
Assim, a abstenção real é 9,5 pontos percentuais mais baixa do que a oficial (37,16% - 46,66%). Isto significa que a abstenção é 20,4% inferior à oficialmente referida.
Estas discrepâncias de números devem-se ao facto de o recenseamento eleitoral ser automático. Quando uma pessoa tem Cartão de Cidadão, em que a residência referida é na Região Autónoma da Madeira, passa a cidadão eleitor activo e passivo, no dia em que faz 18 anos, esteja ou não a residir de facto no arquipélago.
Pelo exposto, verifica-se que tanto Miguel Albuquerque, de forma mais vaga, como Ireneu Barreto, com conteúdo mais fundamentado, têm razão no que afirmaram sobre a abstenção nas eleições legislativas para a Região Autónoma da Madeira, do último domingo.