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Notas acerca da Nova Lei da Droga

A 1 de outubro entrará em vigor a nova lei da droga (Lei n.º 55/2023), a qual inclui a proposta do PSD, que equipara as novas substâncias psicoativas (NSP) às drogas clássicas - possibilitando a distinção entre consumidor e traficante e o tratamento mais célere a quem dele necessite - e que procede à alteração do artigo 40.º, relativo ao consumo e tratamento, proposta pelo PS e votada favoravelmente pela bancada da esquerda e IL.

Na lei anterior, o artigo 40.º previa a criminalização da detenção ou aquisição de substâncias em quantidade superior à necessária para consumo médio individual, durante o período de 10 dias e que o cultivo, aquisição ou detenção de quantidade inferior constituiria contraordenação.

Delimitava, dependendo da quantidade de droga apreendida, se a posse poderia ser considerada crime ou mera contraordenação, e a rápida triagem e encaminhamento do indivíduo para o sistema judicial, ou para as Comissões de Dissuasão de Toxicodependência (CDT), e posterior tratamento.

A alteração agora aprovada fará vigorar que as quantidades apreendidas que excedam o consumo médio individual para o período de 10 dias constitui INDÍCIO de que o propósito pode não ser o consumo e que, desde que fique demonstrado que tal aquisição ou detenção se destina exclusivamente ao consumo próprio, as autoridades competentes determinarão o encaminhamento para o CDT, arquivamento, não pronúncia ou absolvição.

O que significa tudo isto? Que a aquisição ou detenção de droga, independentemente da quantidade, deixa de ser crime no nosso país, apenas indiciando que o propósito pode não ser o consumo, se exceder 10 doses diárias.

Um dos argumentos centrais do PS, citando a intervenção da deputada Cláudia Santos no parlamento, é que “alguém que é encontrado com 15 doses, e vive no interior do país, e veio a um centro urbano comprar mais barato droga para o seu próprio consumo, não pode ser automaticamente condenado como um criminoso e condenado a uma pena”.

Este argumento, dotado de alguma surrealidade, tem leviana ou imaturamente o propósito de facilitar a vida ao consumidor que pretenda adquirir doses mais baratas e por atacado, e de não enquadrar ALGUNS consumidores como criminosos. Mas é perverso pois, doravante, TODO o traficante com mais de 10 doses terá sempre a possibilidade de demonstrar que a droga não se destina ao tráfico, o que os fará “esfregar as mãos de contentamento” pela criação desta zona cinzenta, especialmente os que utilizam consumidores como vendedores, e criará “uma zona de penumbra” que, segundo o coordenador nacional para os problemas da droga, João Goulão, “vem complicar o entendimento que tem sido feito”.

O parecer da PJ ao parlamento afirma-se “frontalmente contra” as alterações, devido à maior incerteza jurídica. “O agente policial não tem as ferramentas ao seu dispor para contrariar a versão do indivíduo que diz que «agora prove que esta droga não é para meu consumo” - João Melo, diretor nacional adjunto.

Numa época em que há cada vez mais substâncias lícitas e ilícitas usadas (Relatório Europeu Sobre Drogas 2023), e que 60% das NSP detetadas em Portugal estão nas ilhas, com impactos sociais e na saúde mental, parece inevitável que esta alteração permita um mais fácil acesso e disponibilidade no circuito de venda, através do aumento do leque de estratégias de quem trafica para escapar à punição, dificultando a atuação e corrompendo a clareza quanto ao procedimento das autoridades competentes.