A nova realidade: ouvir, perceber, agir
A realidade regional do uso e abuso de substâncias psicoativas exige um novo olhar sobre os factos e o planeamento de estratégias adequadas que facilitem uma intervenção precoce, com o mínimo de sequelas para os jovens e adultos em situação de dependência.
As “novas” substâncias cada vez mais disseminadas tornam os consumidores muito vulneráveis, expostos a uma degradação física e neurológica que afeta precocemente o seu desenvolvimento cognitivo, psicoemocional e social. Perdem competências de gestão da vida pessoal, familiar e comunitárias. Tornam-se pessoas doentes crónicas, totalmente dependentes do sistema de saúde e sistema social, exigindo respostas permanentes com custos significativos para a Região. Por isto é tão importante a prevenção geral que tem sido alvo de grande investimento e, neste momento de crise, a intervenção precoce e incisiva, focada nas necessidades imediatas.
As respostas atuais não respondem no seu todo às necessidades. É urgente uma reformulação dos sistemas de tratamento, redução de riscos e minimização de danos e reinserção.
Os serviços existentes foram pensados e criados para uma realidade que não corresponde à atual. As substâncias, os consumidores e a relação entre ambos é muito diferente, estamos perante outra realidade.
Os consumidores jovens andam perdidos com comportamentos de grande desequilíbrio e risco pessoal e social. As famílias estão assustadas, zangadas, revoltadas. As respostas são insuficientes e tardam a aparecer. Os tratamentos não resultam, não resolvem. Os adultos consumidores, com histórico de dependências de outras substâncias, encontram-se muito mais degradados com sequelas físicas e neurológicas de enorme gravidade.
Sem tratamento atualizado, a autonomia vai fracassar e a dependência da família e do sistema de saúde e social vão-se tornando impraticáveis. Sem mudança o futuro será muito difícil de gerir.
É preciso ler a realidade, ouvir a comunidade, os consumidores. Perceber as necessidades e as especificidades. Criar um plano de ação e recomeçar. Pensar com as respostas existentes e integrar novos modelos de intervenção ajustando práticas. Voltar a formar os técnicos e revitalizar os momentos de supervisão. Articular com os serviços a nível nacional que também se encontram em fase de restruturação a debater-se com realidades similares.
Há uma mudança estrutural que tem de começar. Como bem sabemos atuar com remendos em áreas tão sensíveis como esta é um enorme de risco de atrair novos problemas, cada vez de maior intensidade e com custos significativos para o desenvolvimento da Região.
Apesar das questões relacionadas com a toxicodependência serem habitualmente uma área da saúde que vive encolhida e escondida pelo estigma, pela vergonha e um certo “sentimento de culpa”, é preciso retorná-la ao discurso com maturidade e conhecimento.
A Região Autónoma da Madeira pode vir a ser, de novo, um exemplo, como se apresenta em tantas outras áreas da saúde e sociais. O meu histórico na região associado a esta área deixa-me triste ao observar o presente, e com sentido de corresponsabilidade de alertar para a urgência de recomeçar a agir com a convicção de que os ganhos vão superar as dificuldades iniciais.