Venezuela acusa CIDH de servir interesses contrários ao país
O Governo venezuelano acusou hoje o Tribunal Interamericano de Direitos Humanos (CIDH, na sigla em espanhol) de estar ao serviço de interesses imperiais, contrários à Venezuela e ao seu povo.
A acusação tem lugar depois de a CIDH condenar duas recentes decisões do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) venezuelano, que ordenou uma intervenção administrativa na Cruz Vermelha Venezuelana e no Partido Comunista da Venezuela, tendo nomeado uma junta re-estruturadora e nova direção, respetivamente.
"A Venezuela denuncia, mais uma vez, o acionar obediente e mercenário da CIDH na nossa região, comportando-se como porta-voz do Departamento de Estado dos Estados Unidos (...). Esta posição só ratifica a acertada decisão do Governo Bolivariano de se distanciar da chantagem contínua de uma organização que só está concebida como um braço auxiliar dos interesses imperiais", explica-se num comunicado.
No documento, divulgado em Caracas pelo ministro de Relações Exteriores da Venezuela, Yván Gil, o Governo venezuelano diz condenar "de maneira contundente o infeliz e desventurado comunicado" que "pretende questionar o limpo acionar dos poderes públicos" locais "em um novo ataque ao nosso país, reeditando as andanças servis de interesses contrários à nossa região, que motivaram a retirada da Venezuela dessa degenerada organização".
"A funesta e desacreditada CIDH carece da mínima autoridade moral para questionar a nossa Constituição e o Estado de direito nela consagrado. A soberba com que pretende ignorar as decisões legais tomadas pelos tribunais e órgãos competentes é mais um exemplo da sua desproporcionada subordinação a elementos hostis que se lançam contra o povo venezuelano", lê-se no documento.
Na segunda-feira, a CIDH e o Relator Especial para a Liberdade de Expressão (RELE), divulgaram um comunicado condenando as decisões do STJ por "atentar contra a liberdade de associação" e fizeram um apelo para se "proteger o espaço cívico e garantir a participação em assuntos de interesse público sem nenhum tipo de discriminação".
Segundo a CIDH, a decisão do STJ de destituir, em 04 agosto, a direção da Cruz Vermelha Venezuela e nomear uma junta para a reorganizar "é contrária ao estabelecido nos estatutos internos da organização no que diz respeito à sua governação e outorgaria competências contrárias ao pacto da Constituição".
"Do mesmo modo, em 11 de agosto, o STJ emitiu o acórdão n.º 1.160, através do qual nomeou arbitrariamente um conselho de administração ad hoc para a organização política Partido Comunista da Venezuela (PCV), dissidente da coligação governamental e opositora de várias iniciativas legislativas", sublinha-se.
Segundo a CIDH, "as direções de ambas as associações têm poder de decisão sobre o funcionamento e a direção das respetivas entidades". "É, pois, vital que os processos internos de nomeação dos seus dirigentes sejam autónomos e independentes", acrescenta-se.
"É particularmente preocupante que o STJ tenha emitido decisões que influenciam um partido político dissidente da coligação governamental e uma organização da sociedade civil cuja missão é reforçar a ajuda humanitária", conclui-se.
No documento salienta-se que a CIDH e a RELE "observam que este tipo de decisões contrárias à liberdade de associação não são novas no país" e lembra-se que "em junho de 2020, o mesmo tribunal nomeou arbitrariamente os conselhos de administração dos partidos políticos opositores Ação Democrática e Movimento Primeiro Justiça".
"Estas decisões judiciais, de caráter arbitrário, não afetam apenas a liberdade de associação e a participação política livre de discriminação, como também aprofundam a desconfiança no sistema eleitoral e, mais preocupante ainda, criam novos obstáculos à superação da crise institucional num país caracterizado pela ausência do Estado de direito", afirma-se.
A CIDH é um órgão principal e autónomo da Organização de Estados Americanos (OEA), organização da qual a Venezuela anunciou a sua retirada em abril de 2017.