O bom, o mau e os xerifes
Uma ilha com a dimensão do Porto Santo tem duas forças de segurança, uma policial e outra militar
Fiéis à sua legítima agenda política, PAN e Bloco de Esquerda apresentaram propostas para a inclusão de quotas para mulheres na escolha de juízes do Tribunal Constitucional. As propostas encerram questões complexas. A definição de quotas de género será apenas no Tribunal Constitucional? Será possível a introdução de quotas no Tribunal sem a revisão prévia da Constituição? Perguntas pertinentes, sem respostas unânimes e que legitimam a aceitação ou recusa das propostas do PAN e do BE. O Partido Socialista, auto-intitulado campeão da paridade, decidiu votar contra. Melindrado com a situação, o PS refugiou-se no argumento ridículo de que a norma constitucional refere “juízes” no masculino e, por isso, impede a inclusão de quotas. Nem sei como é que há juízes mulheres em Portugal. Aparentemente, a Constituição não o permite.
O bom: Reforma fiscal do PSD
O principal desafio de qualquer partido da oposição é distinguir-se de quem governa. A necessidade será ainda maior, se o partido almejar a governação. A razão é simples. Se a alternativa for semelhante ao incumbente, não há motivo para a mudança. Tem sido esse o caso, e também o insucesso, do PSD. Incapaz de marcar a diferença à sua esquerda, ausente na demonstração do que seria uma governação alternativa e pouco esclarecido na sua relação com a direita dos extremos. Foi este o legado de Rio a Montenegro. É certo que o novo líder conseguiu traçar uma (clarificadora) linha vermelha à direita do PSD, mas faltava-lhe descolar-se do PS na política e nas sondagens. Com a reforma fiscal agora apresentada, julgo que está dado o mote não só para essa destrinça mas, principalmente, para que se volte a falar de escolhas políticas. Ao contrário de Rio, que focou a redução de impostos nas empresas e no IRC, Montenegro joga tudo nos impostos sobre o trabalho. Redução das taxas de IRS em todos os escalões, regime mais favorável de IRS para os jovens até aos 35 anos, valorização fiscal da produtividade e a regulação do que o Estado pode fazer com a receita fiscal cobrada em excesso. A proposta merece aprofundamento, até pode ser alvo de crítica, mas teve o condão de marcar a agenda política. O PS reagiu cauteloso e a vários tempos, o Bloco tentou ressuscitar a troika e o PCP escondeu-se nas suas propostas fiscais. Diga-se o que se disser, o regresso da política fez-se ao ritmo da redução de impostos e no confronto entre quem defende um Estado cada vez maior e quem acha que os contribuintes merecem ter palavra sobre o uso do seu dinheiro.
O mau: Marina Gonçalves
Quem herda, não escolhe. Para além da desculpa de ser herdeira involuntária, mas convicta, da política de habitação de Pedro Nuno Santos, pouco mais corre a favor de Marina Gonçalves. A ministra a quem António Costa confiou a implementação do programa “Mais Habitação”, tem-se multiplicado em esclarecimentos públicos sobre o alcance do programa, mas a receita socialista para a falta de habitação ainda nem entrou em vigor e já agravou o problema que pretendia resolver. Aumentaram as licenças de alojamento local, numa clara tentativa de antecipação à entrada em vigor da lei que fere de morte essa atividade económica. Há cada vez menos casas no mercado de arrendamento e o preço das rendas tem vindo a aumentar. O pedido de licenças para construção caiu mais de 10% face ao ano passado. Eis a tempestade perfeita criada pelo “Mais Habitação”. O receio pelo fim do alojamento local gerou uma corrida às novas licenças e retirou ainda mais imóveis do mercado de arrendamento clássico. A rigidez do novo regime de arrendamento, e o desprezo pelos senhorios, leva ao crescimento do mercado paralelo e ao aumento das rendas iniciais. A constante intervenção do Estado no mercado imobiliário, e a incerteza que isso gera, afasta investidores para outras áreas de investimento. Entretanto, o País aguarda pela decisão de Marcelo que, no uniforme presidencial de Verão com pólo azul e calções, lá nos vai alertando que a sua avaliação do diploma será, essencialmente, política. Tem toda a razão. Enquanto a política de habitação estiver centrada em proibir, restringir e limitar, ignorando o desfasamento entre oferta e procura, não há ministra que nos salve.
Os xerifes: GNR no Porto Santo
Deve ser caso único no mundo. Uma ilha com a dimensão do Porto Santo tem duas forças de segurança, uma policial e outra militar, empenhadas na fiscalização do trânsito. A razão para tão apertada malha fiscalizadora permanece um mistério. No entanto, se no caso da Polícia de Segurança Pública essa fiscalização está dentro das suas competências e, por isso, está justificada, no caso da Guarda Nacional Republicana o mistério do sobressalto fiscalizador adensa-se. Especialmente quando a ânsia (pouco) republicana de fiscalizar leva à montagem de uma operação, em jeito de cilada, às portas do Lobo Marinho. De tal forma que, durante duas horas, o porto do Porto Santo parecia um perigoso entreposto criminal, a fazer lembrar as antigas rotas de contrabando entre Portugal e Espanha ou o concorrido posto fronteiriço entre o México e os Estados Unidos. No checkpoint Charlie, comandado pelos xerifes da República, não consta que tenham sido apreendidos materiais contrafeitos, praticado qualquer ilícito fiscal ou consumado qualquer atentado à orla costeira. Afinal, eram só turistas a prepararem a perigosa atividade da ida a banhos na praia do Porto Santo.