Beloved Pablo
O meu filho kodé (Pablo Fontes Correia e Silva) completa o curso das Relações Internacionais aos 20 anos, bifurcando-lhe, doravante, novas rotas e decisões (seguimentos académicos e saídas profissionais, senão pés nas duas canoas) que o céu é grande e o mundo largo. Credito parte da sua conquista, a par do mérito próprio, não à espantosa sorte, mas à coerente rede de educação, acompanhamento, diálogo e afeto com que “qualquer aprendiz de Albatroz ganha a consciência de voo livre”. Haja vida, saúde, estudo, trabalho, alegria e amor. Da minha parte, o meu amor incondicional.
Assisti, pela televisão, parte do debate sobre o Estado da Nação. Escuso-me a adjetivar esse bocado contemplativo, tal era o nível de hostilidade entre os sujeitos parlamentares. Um amigo comentava, ao desamparinho enternecedor da Baía do Porto Grande, que o erro primário e geral vem sendo esta recusa de vincular ao exercício da política o dom da comunhão. Aqui chegado, deito a mão ao meu surrado e sussurrado latim (guardado para momentos de grande escabeche) este não menos bíblico apelo: Creaturae, sursum corda!
Agora este pensamento obstinado que me remete ao “Congresso dos Ventos”, lapidar o poema de Joaquim Cardozo. A extrapolação para a enegrecida e basáltica várzea da Baía de São Pedro, tão apartada da verdejante e extensa várzea do Capibaribe, lugar de encanto para um congresso dos ilustres ventos da Terra. Adequados anfitriões seriam estes Ventos Alísios que, movimentado-se, de boca concêntrica do norte e do sul, clamam a todos ao Equador. Sabei que (cultura, política, estratégia) a alma profunda das nossas ilhas está tomada de vento. O resto, algo que também não está na dinâmica política do rancor, da intolerância, da maledicência e da paranóia, é o vigoroso canto da vida, seu vendaval sem freio, seus rodopios, volteios, caprichos, remoinhos, piões e parafusos.
Falava assim, há dias, António Guterres, Secretário-Geral da ONU: “A era do aquecimento global acabou. Começou a era da ebulição global”. Ter-me-á roubado a chave do sossego assaz alerta. A Terra a ferver e a lógica do expediente terminal. Neste inferno climático a instalar-se, viveremos o paradoxo dos vazios abertos a tudo.
Todavia, ambiguidades à parte, precisaremos de coragem ética mais radical, de insubmissão nitidamente progressista e de inequívoco amor-ternura para com a Vida. O que faz falta, minha gente?
Não me lembro se num poema de Pablo Neruda o alterar da aurora ou se, no de Manoel de Barros, o cogito de que “o esplendor da manhã não se abre com faca.”
Agora, no parapeito de mim mesmo, mais nada - nem espavento da angústia, nem estranho nimbo na aura das coisas. Fiem-se os meus amigos que nenhuma inquietação é sem propósito. Agora, baixinho, feliz pelo nosso Pablo!