Gostar da Madeira
O que têm em comum um sócio do Marítimo, um adepto do CAB e um militante do PS? É que todos gostam da Madeira e vivem momentos de preocupação relativamente ao futuro das suas instituições e da Região.
Os sócios e adeptos do Marítimo e do CAB viram as suas principais equipas masculinas descerem de divisão, como consequência de condicionamentos técnicos, directivos e orçamentais que se foram adensando ao longo dos anos, com as consequências que hoje conhecemos. Não duvido da paixão que todos nutrem pelas instituições às quais pertencem e, mais ainda, da importância que reconhecem nesses projectos para o futuro da Madeira, que encontrou no desporto uma importante forma de afirmação da sua identidade no todo nacional. É por isso que, olhando em frente e apesar de não duvidar da boa vontade de todos, é preciso que sejamos capazes de encontrar os melhores para implementarem soluções, ao invés dos que adicionam mais problemas ainda às dificuldades que já existem.
Na política não é diferente. Aparentemente, causou grande estranheza a declaração de António Costa, Secretário-Geral do PS, de que “nem sempre a Madeira gosta do PS, mas o PS gosta sempre da Madeira”. Não compreendo a origem da dúvida: à primeira parte responde o histórico eleitoral; à segunda as acções concretas de sucessivas governações que procuraram soluções para problemas complexos. Problemas que os condicionamentos da Região - geográficos, sociais, económicos e políticos - não permitem que, em vários momentos, sejamos capazes de resolver sozinhos e que estão na origem da justa reivindicação de que devemos continuar a caminhar para um tempo em que, com mais Autonomia, tenhamos também mais condições para os resolvermos sem dependermos de terceiros. Uma reacção que não respeita uma doutrina básica de Alberto João Jardim, num célebre discurso no Porto Santo, em que afirmou que “é madeirense quem tem a Madeira no coração”. É isso, aliás, que torna possível ser madeirense sem ser da Madeira e sair da ilha sem sair da Região, como milhares de madeirenses provam diariamente no Continente e nas nossas Comunidades - e não é por defendermos opções diferentes que gostamos menos da Madeira que nos une.
Em 2019, o PS Madeira corporizou a esperança numa Madeira melhor, em que muitos madeirenses acreditaram. Fez-se um caminho para lá chegarmos: com o Paulo Cafôfo e todos os que o acompanharam na governação da Câmara do Funchal, entre 2013 e 2019; com o Emanuel Câmara na liderança do PS, a partir de 2018. Pelo meio, no Porto Moniz, em Machico, na Ponta do Sol e em toda a Região, com os nossos autarcas, deputados e militantes, o PS fez o seu trajecto, reunindo à sua volta cada vez mais gente. As dificuldades, objectivas, que enfrentamos desde as últimas eleições, também têm rostos e decisões – e têm sobretudo uma causa: quando o PS devia ter optado por afirmar que, depois de retirar pela primeira vez a maioria absoluta ao PSD, conseguiria certamente governar a Região a partir das eleições seguintes, um conjunto de opções, que o tempo demonstrou erradas, levou a que chegássemos às próximas eleições correndo o risco de andar para trás - no resultado eleitoral, no número de deputados eleitos, nas condições que temos para fazer oposição e nas possibilidades de governar. Os riscos são evidentes nos dados que as sucessivas sondagens confirmam - e de todos os que corremos, o maior é mesmo o da Madeira andar para trás, porque uma Região com menos possibilidade de alternativa será uma terra novamente menos livre.
Quando dei os primeiros passos na vida política, acreditava que seria possível melhorar a vida da minha geração: alargar a igualdade de oportunidades no acesso ao Ensino Superior, que devia ser para todos, independentemente das condições económicas de cada um; ter acesso a um emprego digno, com menos precariedade e salários mais justos; ser capaz de adquirir habitação, constituir família e ter acesso à saúde. Passados quatro anos, a minha esperança diminuiu: não foi possível impedir que a minha geração passasse pelo mesmo fenómeno de todas as outras da nossa Região, a emigração; há poucos empregos com salários justos; e não existem quaisquer condições para uma família de classe média adquirir habitação. É, por isso, difícil compreender os sucessivos insucessos da oposição, que não são uma fatalidade, mas o resultado de escolhas erradas. Para as próximas eleições, bastaria, porventura ainda bastará, explicar aos madeirenses que há outra Madeira possível, no todo da Região e em cada um dos sítios onde vivem. Para os que estão satisfeitos, uma Madeira ainda melhor, que provavelmente já não vai a tempo de ser erguida para que a igualdade e a liberdade sejam totais para as nossas gerações, mas que poderá ser para a dos nossos filhos. É essa ambição que não podemos perder.
O sucesso ou insucesso da oposição nas próximas eleições está dependente de escolhas que foram tomadas ao longo destes quatro anos, mas também de algumas que ainda se farão. O PS não tem outra alternativa que não seja a de mobilizar os madeirenses em torno de um projecto que sempre foi, é e será maior do que a sua própria liderança – sempre circunstancial. É esse um dos erros de diagnóstico de alguns socialistas: onde alguns viram, em 2019, o sucesso de apenas um rosto, outros viram o de uma construção colectiva que importava preservar. Perante as dificuldades evidentes, ou bem que o PS insiste na construção de um projecto em torno de um rosto só, com as virtudes e limitações naturais de cada um, ou bem que ergue um projecto que conte com o melhor que tem para oferecer à Madeira - de que muito gostamos e que precisamos que volte a gostar de nós.