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Madeira, o aeroporto kamikase?

Neste país centralista e macrocéfalo, as periferias nada riscam

Ninguém dá valor como um ilhéu, à importância que têm as nossas estruturas de mobilidade, quer aérea, quer marítima. Como a Madeira não dispõe de uma ligação marítima regular de passageiros ao continente, pois o nosso mar resume-se à aquacultura, cruzeiros, regatas, banhos e porta-contentores, estamos exclusivamente dependentes do transporte aéreo.

A Madeira dispõe de uma estrutura aeroportuária apoiada pelo Fundo de Coesão, REGIS, e financiada pela ANAM junto do Banco Europeu de Investimentos e banca comercial, com garantia do Estado, tendo sido um premiado projeto iniciado pelo eng. Edgar Cardoso e continuado pelo eng. Segadães Tavares que visou colmatar as limitações impostas pela anterior pista.

Contudo, os constrangimentos de operacionalidade devido ao vento, impostos por um regulamento de segurança com quase 60 anos, têm-se feito sentir com mais frequência e inquietação, à medida que o aeroporto vai acumulando cada vez mais passageiros, rotas e operadores aéreos.

Aos poucos parece que se instala na nossa psique, o sentimento que apesar dos 550 milhões investidos no aeroporto, mantemo-nos presos pela excecionalidade especial dos ventos e de um sacro regulamento de 1964, sem que haja a vontade política de o questionar tecnicamente e cientificamente com efetivas ações técnicas/académicas que possam sustentar a sua manutenção ou alterá-lo.

Um cientista de bancada como eu, que tenha apenas uma quantidade homeopática de senso comum, chega facilmente à tresloucada conclusão, de que um regulamento técnico obrigatório determinado há 59 anos, face ao desenvolvimento tecnológico dos equipamentos e estruturas em questão ocorrido até aos nossos dias, pode e deve ser questionado, reestudado, naturalmente sob a batuta da segurança.

Ao longo destes anos os burocratas nacionais que têm poder para desbloquear o processo técnico de decisão, já arrolaram a Boeing e a Airbus para se pronunciarem, mas de forma esperada, estes basicamente rechaçaram o estorvo alheio, pois, não assumirão a falta de coragem de quem mantém o velhinho regulamento como relíquia da cristandade.

Se as contingências que se verificam no aeroporto da Madeira, ocorressem em Lisboa ou no Porto, certamente já teríamos toda uma bateria de estudos que sustentassem uma decisão, fosse qual fosse. Mas neste país centralista e macrocéfalo, as periferias nada riscam, por mais confrangimentos que tenham.

O Comandante Timóteo Costa, o experimentado piloto madeirense que mais aterragens efetuou na Madeira, tem a sua conhecida opinião face ao atual regulamento, e está longe de ser um daqueles pilotos kamikase da IIª Guerra Mundial na campanha do Pacífico.