Fact Check Madeira

É possível aterrar no Aeroporto da Madeira ultrapassando o limite dos 15 nós?

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Foto Arquivo/DN

Os limites de vento definidos para a operação aérea no Aeroporto Internacional da Madeira – Cristiano Ronaldo é um assunto que preocupa a Região.

ANAC diz que só poderá proceder a uma alteração com estudos científicos, que podem demorar mais três anos. Mas há quem defenda que a decisão deveria ser dos pilotos, que têm experiência e conhecimento para aterrar com 16, 17 ou 18 nós, evitando grande parte das não aterragens que se verificam.

Tendo em conta os recorrentes constrangimentos que ocorrem no aeroporto, impedindo aterragens, originando atrasos e cancelamentos de voos, que complicam a vida dos passageiros, o presidente do Governo Regional informou que já foi enviado “o pedido para o Ministério “solicitando revisão dos limites dos ventos”.

Miguel Albuquerque continua a fazer pressão política para que Lisboa decida pela aplicabilidade do diferencial de 5 nós [passando de 15 para 20].

O presidente lembrou que a Região investiu 550 milhões de euros no novo aeroporto, “uma obra fundamental para o crescimento do seu turismo" e que, actualmente, há condições para aumentar os limites que "foram fixados em 1964" e medidos "com um avião" datado da II Guerra Mundial.

Em primeiro lugar a pista hoje está posicionada de uma maneira completamente diferente daquilo que acontecia em 1964 e tem mais do dobro do tamanho. Segundo lugar, a tecnologia de 1964 quer da torre de controlo, quer dos elementos adjuvantes para aterragem, quer a aparelhagem dos aviões teve uma evolução exponencial, ou seja gigantesca. E em terceiro lugar, é evidente se conseguirmos conclusões do ponto de vista científico e da segurança que deem mais margem para a aterragem é muito importante para a Madeira e para todos nós.  Miguel Albuquerque, presidente do Governo da Madeira (11 de Julho 2023)

Timóteo Costa, piloto que já fez 9.300 aterragens no Aeroporto Internacional da Madeira também salienta que “os tempos são outros” e defende que a decisão de aterrar deveria ser dos pilotos.

“A realidade mudou e até há vários dados mais recentes, baseados em vários estudos válidos que têm sido feitos. Todo esse conhecimento tem sido ignorado, bem como a experiência dos pilotos. Eles é que deviam de decidir se têm condições para aterrar ou não”, afiançou.

O comandante garante que não faz sentido a obrigatoriedade imposta na Madeira, quando outros locais seguem apenas recomendações. E que a mudança de “obrigatório para recomendado” já colocaria a decisão nas mãos dos pilotos.

Há outros aeroportos, como por exemplo nos Açores, que têm ventos iguais ou muito parecidos aos nossos e só têm recomendações. A Madeira tem de seguir uma obrigatoriedade e é caso único no Mundo. Isto não faz sentido, sobretudo quando se sabe que a maior parte das não aterragens acontecem entre os 15 e os 18 nós. Com a experiência que tenho de já ter feito 9.300 aterragens na Madeira digo que três nós não representa absolutamente nada. Timóteo Costa, piloto

Limites operacionais "não devem ser alterados até que exista prova científica em contrário"

Resposta da presidente da ANAC a Lopes da Fonseca que defende decisão também politica

Na semana passada decorreu uma audição parlamentar na Assembleia Legislativa da Madeira, com os deputados do PSD, PS e CDS, e a Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC).

Questionámos se não havia forma de, pelo menos, que a questão do limite dos ventos deixasse de ser mandatório e passasse a ser apenas recomendado. Muitos pilotos dizem que se os ventos não fossem mandatórios, grande parte dos aviões aterrava, porque o piloto é que consideraria se estava em condições para aterrar, sem arriscar. Mas o facto de serem mandatórios impedem que os aviões possam aterrar. Lopes da Fonseca, deputado CDS
A decisão a ser tomada deve ter como base a ciência. Neste aspecto uma ciência do século XXI e não de há 60 anos, uma ciência que utilize as aeronaves de agora, a experiência e a competência dos pilotos da actualidade e que considere a pista de 2700 metros e não a de 1600 metros e que recorra à tecnologia dos nossos dias e não dos dias dos nossos avós. Estamos perante um processo que tem sido adiado porque aqueles que são os únicos a poder decidir sobre este dossier têm medo de o fazer, um dos maiores exemplos de hesitação e temor. Carlos Rodrigues, deputado do PSD-M
Urge uma solução para fazer face aos constrangimentos do aeroporto no imediato, a qual terá de passar, obrigatoriamente, pela implementação de um plano de contingência integrado que inclua o Aeroporto do Porto Santo como alternativa. Mesmo que os limites de vento sejam revistos, o plano de contingência tem de ser uma realidade e não pode continuar a ser preterido pelo Governo Regional. Por um lado, porque não podemos continuar à espera, enquanto mais pessoas e a nossa economia são constantemente afetadas. Por outro, porque, mesmo com a revisão dos limites, haverá sempre dias em que os condicionalismos continuarão a ocorrer. Sérgio Gonçalves, deputado do PS

Todos concordam que os dados técnicos e científicos são bem-vindos para suportar as decisões e melhorar a situação. Na referida audição parlamentar, a ANAC informou que só com esses dados poderá tomar uma decisão de rever os limites dos ventos.

Esses dados poderão ser recolhidos por futuros equipamentos a instalar na pista de Santa Cruz, nomeadamente o Radar de Banda X e LIDAR, equipamentos meteorológicos complementares de apoio à navegação aérea, que servem para recolher informação mais completa, melhorando o conhecimento dos padrões atmosféricos que afectam o aeroporto.

Ou seja, na melhor das hipóteses, só será possível avaliar a partir de 2026, conforme concluiu Tânia Cardoso Simões, presidente da ANAC.

A gestora lembrou que os pilotos também são humanos e por isso "também sofrem pressões", rejeitando a ideia que bastaria aumentar um, dois ou três nós nos limites do vento para resolver significativamente o problema dos constrangimentos na operacionalidade do Aeroporto Internacional da Madeira.

Juntam-se, assim, argumentos prós e contra que não permitem, para já, comprovar se é ou não possível aterrar na Madeira acima dos 15 nós, com pilotos experientes a garantirem que sim, mas a ANAC a assegurar que só apenas dados científicos rigorosos poderão ditar esse cenário.