Será verdade que esta foi a primeira vez que foi apanhada uma cobra na Madeira?
Na passada segunda-feira, foi encontrada uma cobra no leito da Ribeira de São João, no Funchal. O réptil foi recolhido pela equipa de resgate em montanha dos Bombeiros Voluntários Madeirenses. O Instituto das Florestas e Conservação da Natureza deixou o animal exótico, que é de uma espécie inofensiva, à guarda da empresa TFalcon. O achado surpreendeu muita gente e motivou centenas de comentários no Facebook, sendo que algumas pessoas deram a entender que se tratava de algo inédito, porque sempre lhes disseram “que não havia cobras na Madeira”. Será que estamos na presença de um fenómeno que acontece pela primeira vez?
Na Madeira não há este tipo de répteis a viver e a se reproduzir na Natureza, ao contrário do que se passa no espaço continental. No entanto, nas últimas três décadas, foram registadas várias situações isoladas de avistamento e recolha de cobras de diversas espécies em diferentes pontos da ilha. Alguns casos tiveram contornos algo bizarros.
Por exemplo, no início do ano de 1999, os serviços da Alfândega do Aeroporto da Madeira encontraram uma pequena cobra que acompanhava um emigrante oriundo da África do Sul.
Por sua vez, na noite de 14 de Junho de 1999, uma cobra foi atropelada por um carro na zona do Canto do Muro. Quem deu pela presença do réptil na estrada foi o próprio automobilista interveniente, que depois de lhe passar com um pneu por cima, achando estranho o ressalto do automóvel, procedeu à inversão de marcha, vindo então a constatar que tinha atropelado uma cobra. O animal foi transportado ainda com vida para a Sociedade Protectora dos Animais Domésticos (SPAD), mas acabou por não sobreviver aos ferimentos. Tinha metro e meio de comprimento e foi identificado como uma espécie inofensiva - ‘Lampropeltis Triangum’ (cobra de leite).
Em Setembro de 2001, um indivíduo foi detido na Ribeira Brava por tentar realizar um roubo ameaçando a vítima… com uma cobra com metro e meio de comprimento. O meliante encostou o animal à cara da vítima, exigindo que ela lhe entregasse os bens de valor. A PSP veio depois a identificar o suspeito, que vivia no sítio da Boa Morte e era figura conhecida por habitualmente fazer-se passear com a cobra enrolada ao pescoço. O espécimen, que não era venenoso, foi encontrado escondido numa caixa, numa zona de canavial, e foi posteriormente depositado numa loja de animais.
Em Agosto de 2005, trabalhadores de uma serralharia no concelho da Calheta descobriram uma pequena cobra num carregamento de madeira proveniente de África. O exemplar, ainda muito jovem e com apenas 60 centímetros, que normalmente vive nas árvores e se alimenta de insectos, foi entregue ao Parque Natural da Madeira. Acabaria por não sobreviver.
Em meados de Março de 2006, o Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da GNR anunciou a apreensão de três cobras, que se encontravam ilegalmente na posse de dois particulares residentes no Funchal. Os três répteis eram uma pitão, uma cobra ‘rateira’ e uma cobra do milho ‘Elaphe gutatta’.
No final de Janeiro de 2010, uma cobra pitão real, com mais de dois metros de comprimento, foi encontrada morta na estrada junto ao Miradouro do Pináculo, em São Gonçalo, com ferimentos que indiciavam ter sido atropelada por um automóvel. Na altura, o então director do Parque Natural da Madeira, Paulo Oliveira, assinalava que não sendo aquela uma espécie venenosa, era perigosa, pois provoca a morte da vítima por esmagamento e asfixia.
Em Maio de 2016, um popular localizou uma cobra do milho nas proximidades das Piscinas Olímpicas da Penteada, que foi depois recolhida por técnicos do Parque Natural da Madeira.
Em meados de Novembro de 2016, a Polícia Judiciária apreendeu outra cobra do milho, com 1,20 metros de comprimento, a um cidadão madeirense. A apreensão da serpente foi efectuada com o apoio técnico da GNR, tendo sido entregue posteriormente ao Parque Natural da Madeira. Entretanto, ficou à guarda da empresa TFalcon Madeira, que dispõe de instalações próprias e com condições apropriadas para acolher e manter em cativeiro animais que não pertencem à fauna regional.
Como se pode ver por esta amostra, a situação ocorrida na última segunda-feira na Ribeira de São João está longe de ser caso único.
Animais exóticos como as cobras podem constituir uma ameaça ao equilíbrio do ecossistema da Madeira. Por isso mesmo, em 1999 o Governo Regional fez aprovar no parlamento madeirense um decreto legislativo que interdita a importação dessas espécies, exceptuando apenas situações especiais devidamente regulamentadas e objecto de adequado estudo.